São Paulo, domingo, 26 de maio de 2002

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ELEIÇÃO NA COLÔMBIA

Acusação de elo com paramilitares e narcotráfico permeia biografia que o candidato rejeita com veemência

Passado incomoda o favorito Alvaro Uribe

DO ENVIADO ESPECIAL À COLÔMBIA

A comparação é inevitável. Os dois se projetaram em um curto espaço de tempo à margem dos partidos políticos tradicionais. Os dois venderam ao eleitorado uma imagem de bom moço ao mesmo tempo em que prometiam a recomposição da autoridade perdida pela Presidência. Apregoaram a modernização do Estado e o combate frontal à corrupção. Confrontados com denúncias sobre passagens mal explicadas em seu passado, deixam a calma serena e perdem a compostura.
Mas só o tempo dirá se o franco favorito a vencer a eleição presidencial colombiana já no primeiro turno, hoje, o direitista Alvaro Uribe Vélez, terá o mesmo futuro do ex-presidente brasileiro Fernando Collor de Mello (1990-92), que renunciou ao cargo para escapar de um processo de impeachment por corrupção.
Uribe, 49, chega à eleição como favorito, apesar das denúncias contra ele por supostos vínculos com grupos paramilitares de direita -responsáveis por inúmeros casos de desrespeito aos direitos humanos- e com narcotraficantes, que ele nega.
Prefeito indicado de Medellín em 1982, senador de 1986 a 1994, governador de Antioquia de 1995 a 1997, Uribe desenvolveu sua carreira política vendendo a idéia de eficiência administrativa e combate à corrupção.
Pelo seu desempenho no Senado, ganhou os títulos de "senador estrela", "senador das melhores iniciativas" e "melhor senador". À frente do governo de Antioquia, promoveu uma redução de 65% na burocracia estatal e ampliou a infra-estrutura local, com a construção de estradas e o aumento das linhas de transmissão de energia e telefone.
Promoveu uma polêmica ampliação das vagas nas escolas, por meio da concessão do ensino público a empresas privadas. O número de vagas cresceu de 50 mil para 150 mil em três anos, mas os críticos dizem que a qualidade do ensino piorou substancialmente após a privatização encoberta.
Outra de suas iniciativas polêmicas foi a redução do quadro de funcionários públicos de 15 mil para 5.000 pessoas. Vários dos serviços antes prestados pelos funcionários demitidos passaram a ser realizados por cooperativas de trabalhadores -muitas delas formadas pelos próprios ex-funcionários. O que os simpatizantes chamam de eficiência administrativa os críticos dizem que é uma forma de economizar cortando os direitos trabalhistas.
A principal bandeira de Uribe como governador, porém, e que ajudou a impulsioná-lo no imaginário popular como o candidato que pode vencer a guerrilha, foi a chamada "pacificação do Urabá [região oeste do Departamento]".
A região sofria desde os anos 80 com um índice de violência altíssimo, com disputas constantes entre produtores rurais e sindicatos de trabalhadores e com a interferência de narcotraficantes, vários grupos guerrilheiros e de paramilitares.
Uma das ações tomadas por Uribe e que teria ajudado a reduzir significativamente os conflitos na região foi a conformação de cooperativas privadas de segurança, chamadas Convivir, mais tarde acusadas de serem embriões de grupos paramilitares.
Uribe alega que apenas duas das cerca de 70 cooperativas estabelecidas tiveram denúncias de envolvimento com paramilitares e foram sancionadas, perdendo seu status de pessoa jurídica.
Mas isso não evitou que os adversários o classificassem como "candidato paramilitar". Entre suas propostas para a Presidência está a conformação de uma "grande Convivir", com 1 milhão de membros. Uribe garante que sua proposta não é armar os cidadãos para que estes se defendam dos ataques guerrilheiros, mas sim formar uma rede de informação para ajudar o trabalho das forças de segurança.

Biografia não autorizada
As denúncias contra Uribe ganharam corpo com o lançamento, na semana passada, do livro "El Señor de las Sombras", biografia não autorizada do candidato de autoria do jornalista americano Joseph Contreras, chefe do escritório de Miami da revista "Newsweek", na qual ele faz um apanhado geral sobre antigas histórias acerca de Uribe publicadas na imprensa e em outros livros.
Em março, Uribe expulsou Contreras de sua sala durante uma entrevista, após ser questionado sobre parte das denúncias, dizendo que não aceitava que correspondentes estrangeiros viessem à Colômbia para lhe fazer "esse tipo de perguntas e repetir mentiras" sobre ele.
Entre as histórias relatadas por Contreras em seu livro está um suposto acordo de Uribe, então prefeito de Medellín, com o chefão do narcotráfico Pablo Escobar para capitalizar, como se fosse um projeto da prefeitura, a construção de casas populares promovida pelo narcotraficante, então em campanha para o Congresso.
Contreras também questiona a versão dada pelo candidato para a morte de seu pai, que Uribe diz ter sido assassinado pelas Farc, na década de 80. O jornalista levanta suspeitas de que ele teria sido na verdade morto por conta de desavenças com os narcotraficantes do clã Ochoa, com os quais dividia a paixão por cavalos.
Uribe nega todas as acusações e acusa o jornalista de ter lançado o livro às pressas, com motivações eleitorais. Com a grande polarização do eleitorado colombiano, muitas livrarias declararam seu apoio ao candidato e se negaram a vender o livro.
(ROGERIO WASSERMANN)


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