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Grupo por trás da crise no Líbano se inspira na Al Qaeda
Em entrevista ao "Times" em março, líder do Fatah al Islam prometeu visar alvos dos EUA
Procurado por terrorismo, palestino Abssi achou em campo de refugiados em Trípoli recrutas e santuário para treinar organização
Mohamed Azakir - 23.mai.2007/Reuters
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Militante do Fatah al Islam patrulha o campo de Nahr al Bared |
SOUAD MEKHENNET
MICHAEL MOSS
DO "NEW YORK TIMES", EM TRÍPOLI
Numa favela violenta e sem
lei ao norte de Trípoli, na costa
do Líbano, 12 homens com rostos escondidos por lenços treinam com fuzis Kalashnikov.
Movimentando-se juntos, dão
um bote numa direção e depois,
viram-se. "Allah-u akbar", gritam, louvando Deus, enquanto
disparam contra um muro.
Os homens pertencem a uma
nova milícia islâmica chamada
Fatah al Islam, cujo líder, o fugitivo palestino Shakir al Abssi,
montou operações num campo
de refugiados, onde treina combatentes e difunde a ideologia
da Al Qaeda. É este o grupo que
detonou, na última semana, a
mais recente crise a ameaçar o
já frágil equilíbrio libanês.
Abssi tem sólidas credenciais
terroristas. Ex-associado de
Abu Musab al Zarqawi, o líder
da Al Qaeda no Iraque morto
em 2006, foi condenado à morte à revelia, com Zarqawi, pelo
assassinato do diplomata americano Laurence Foley na Jordânia, em 2002. Apenas quatro
meses depois de chegar ao Líbano, vindo da Síria, ele já formou uma milícia estimada por
agentes de inteligência em 150
homens, além de reunir um arsenal que inclui explosivos, foguetes e um canhão antiaéreo.
Em entrevista concedida em
março último ao "New York Times", Abssi exibiu seu campo
de treinamento improvisado e
sua mensagem estridente de
que os EUA precisam ser punidos por sua presença no mundo
islâmico. "A única forma de
conquistar nossos direitos é pela força", disse. "É assim que os
EUA nos tratam. Portanto,
quando os americanos sentirem que suas vidas e sua economia estão ameaçadas, saberão
que devem partir."
Ressurgimento
A organização de Abssi é a
imagem do que fontes da inteligência vêem como o ressurgimento da Al Qaeda. Esmagada
após 2001, a organização fundada por Osama bin Laden está
se reerguendo sob a forma de
uma aliança de grupos pequenos, dispersos, que compartilham uma interpretação fundamentalista do islã mas que desenvolveram capacidades terroristas independentes, segundo os agentes de inteligência.
Abssi, segundo essas fontes, é
visto como militante perigoso,
capaz de formar equipes pequenas com grande habilidade
militar. "Homens como Abssi
possuem a capacidade em campo que a Al Qaeda perdeu e da
qual ela quer se reabastecer",
disse um funcionário da inteligência americana.
Abssi já mostrou astúcia.
Apesar de seu nome constar de
listas de suspeitos de terrorismo em todo o mundo, ele se fixou num campo de refugiados
palestinos onde, em função da
política libanesa, pode atuar
praticamente protegido do governo. O campo também lhe
oferece acesso a um grupo de
recrutas, jovens palestinos cuja
visão militante evoluiu, passando da luta contra Israel para
a causa islâmica mais ampla.
Agentes de inteligência no
Líbano dizem que Abssi também explora outra fonte de
mão-de-obra: estimam que ele
conte com 50 militantes da
Arábia Saudita e outros países,
vindos dos combates com a insurgência iraquiana. Os agentes afirmam temer que Abssi
busque se consolidar como líder terrorista na escala de Zarqawi. "Ele está tentando preencher o vazio de uma maneira a
atrair a atenção de seguidores"
disse o agente americano.
Recentemente Abssi recrutou um assessor de comunicações, Abu al Hassan, 24, estudante de jornalismo que deixou
a faculdade para unir-se ao Fatah al Islam. Seu projeto é criar
uma revista de recrutamento.
Síria
A história de Abssi ilustra a
atração da Al Qaeda sobre militantes árabes. Nascido na Palestina, de onde ele e sua família foram expulsos por Israel,
Abssi, 51, parou de estudar medicina para pilotar aviões para
Iasser Arafat, morto em 2004.
Em seguida, lançou ataques
contra Israel a partir de sua base própria na Síria. Depois de
passar três anos preso na Síria
por acusações de terrorismo,
ampliou seus alvos para incluir
americanos na Jordânia.
O "Times" conseguiu um encontro com Abssi por meio de
intermediários, que ajudaram a
organizar reuniões em sua sede
no campo de refugiados de
Nahr al Bared. Grisalho e de fala macia, Abssi foi entrevistado
em uma pequena casa junto a
um campo de treinamento.
Cerca de 80 homens estavam
no local, fazendo várias tarefas.
Um deles cuidava de um canhão antiaéreo. Enquanto Abssi falava, dois assessores faziam
anotações e um terceiro mexia
com uma submetralhadora.
Uma bazuca estava recostada
contra a parede atrás dele.
Numa entrevista de 90 minutos, sua primeira a jornalistas ocidentais, Abssi declarou
compartilhar a interpretação
fundamentalista da Al Qaeda e
endossar a criação de uma nação islâmica global. Disse que
matar soldados dos EUA no
Iraque já não é suficiente para
convencer o público americano
de que seu governo deve parar o
que muitos muçulmanos vêem
como uma guerra contra o islã.
"Temos o direito legítimo de
empreender tais atos -pois
não é a América que vem para
nossa região e mata inocentes e
crianças?" diz Abssi. "É direito
nosso atingi-los em suas casas,
da mesma maneira como eles
nos atingem nas nossas."
"Não temos medo de sermos
rotulados de terroristas",
acrescenta. "Mas quero perguntar: quem detona um quilo
é terrorista, enquanto alguém
que detona toneladas em cidades árabes e islâmicas não é?"
Indagado sobre seus alvos, Abssi se nega a dizer quais seriam.
No interior do campo palestino, Abssi parece estar montando sua operação com pouca interferência. O general Achraf
Rifi, diretor das Forças de Segurança Internas do Líbano,
diz que o governo não possui
autoridades para entrar num
campo palestino -para fazê-lo,
afirma, precisaria da anuência
de outros países árabes.
Abssi diz que boa parte de sua
orientação espiritual vem de
Abu Abdullah Muhammad al
Bukhari, estudioso islâmico do
século 9 apontado pelo Pentágono entre os 20 de influência
atualmente maior que a de Bin
Laden sobre militantes árabes.
"Originalmente, matar inocentes e crianças era proibido",
afirma. "Entretanto há situações em que essas mortes são
permitidas. Uma dessas exceções são aqueles que matam
nossas mulheres e crianças."
"Bin Laden emite as fatwas",
diz Abssi, usando a palavra árabe que significa os pronunciamentos legais islâmicos. "Se
suas fatwas seguem a sunna [lei
islâmica], nós as cumprimos."
No fim de novembro, Abssi se
mudou para o campo de Nahr al
Bared, tomou três complexos
sob o controle de um grupo secular, o Fatah al Intifada, hasteou a bandeira negra de seu
grupo e lançou uma declaração
dizendo que estava levando a
religião à causa palestina.
A aparente incapacidade de
prender Abssi provoca fúria entre os homens que o caçam. Um
agente de segurança em um dos
países em que Abssi é procurado mostrou raiva quando indagado por que Abssi está operando livremente. "Posso ir a muitos lugares para prender pessoas, mas Abssi eu não posso
prender", respondeu.
Na entrevista que concedeu
ao "New York Times", Abssi
contou que, de modo geral, teve
uma recepção calorosa no campo palestino e que vê sua causa
com otimismo. "Uma das razões que nos levou a escolher
este campo é que acreditamos
que as pessoas daqui estão próximas a Deus, já que padecem o
mesmo sofrimento que nossos
irmãos na Palestina", explica.
"Quando os jovens de hoje
vêem o que está acontecendo
na Palestina e no Iraque, isso
lhes dá entusiasmo para juntar-se ao caminho dos justos e da jihad. Essas pessoas começaram
a seguir o caminho justo."
Tradução de CLARA ALLAIN
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