São Paulo, sábado, 26 de setembro de 2009

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"Não cogitamos tocar na embaixada"

Presidente golpista nega ataque com gás à missão brasileira e diz que os próprios zelaystas cortaram a luz

Em entrevista à Folha, Roberto Micheletti diz ter fé de que, após as eleições, países mudarão de ideia e reconhecerão novo governo


DO ENVIADO A TEGUCIGALPA

O presidente golpista de Honduras, Roberto Micheletti, disse que as eleições presidencias de novembro serão a solução da crise e pediu ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva que proíba Manuel Zelaya de "incitar atos de vandalismo" a partir da embaixada brasileira. Leia, a seguir, a entrevista exclusiva concedida à Folha: (FM)

 

FOLHA - O seu governo divulgou um comunicado muito duro contra o governo brasileiro, afirmando que tinha conhecimento prévio da entrada de Zelaya à embaixada. O sr. acha realmente que o Brasil teve participação na volta de Zelaya?
ROBERTO MICHELETTI
- Eu quero crer no presidente Lula, porque ele disse que não havia nada preparado. No entanto, o sr. Zelaya, em declarações públicas, disse que tinha a aprovação de Lula para entrar na embaixada.

FOLHA - O comunicado era muito duro.
MICHELETTI
- É que ele [Lula] começou a insistir em que nós estávamos procurando entrar na embaixada. Começou a exigir o direito internacional, as convenções. Mas nós, em nenhum momento, pretendemos tocar na embaixada brasileira. Somos respeitosos, o Brasil tem sido um país amigo. Até com países que não têm sido [amigos]. A Venezuela tem sido agressiva, nos tem agredido verbalmente, mas não chegamos a fechar as portas ou tentar obrigar os representantes da Venezuela a deixar o país. Mas temos sido respeitosos e continuaremos sendo. Não tenho a menor dúvida de que a polícia e o Exército escutarão das ordens da Chancelaria de não se atrever a infringir a lei.

FOLHA - Houve um incidente hoje [ontem]. Zelaya acusou o senhor de atacar a embaixada com gás, e um funcionário brasileiro teve mal-estares. Houve algum tipo de ação?
MICHELETTI
- Não. Nós, quando desalojamos essas pessoas que estavam lá, atiraramos bombas lacrimogêneas. O que fizemos depois foi resguardar, proteger a embaixada e a vida dos cidadãos que estão lá dentro. O governo não tem a menor intenção [de fazer essas ações]. Fomos acusados de cortar a luz. A luz foi cortada pelos próprios manifestantes, e a água se foi precisamente porque, ao não haver luz, as cisternas não funcionam. Mas nós ordenamos de imediato à empresa elétrica que reinstalasse a luz. Outra coisa que disse a Lula: que, da mesma forma que nos pedia para assegurar os bens da embaixada, que ele ordenasse seu hóspede a não incitar, dos balcões da embaixada, o povo a movimentos grosseiros. Porque disso decorreu todo tipo de vandalismo. Todo mundo o viu no balcão da embaixada exortando as pessoas a cometer atos de vandalismo.

FOLHA - Mas o telefone da embaixada continua cortado.
MICHELETTI
- Eu não tenho como explicar, mas não acredito que esteja cortado. Todos os celulares estão funcionando. Zelaya disse ontem [anteontem] que todos os celulares estavam cortados, e [Hugo] Chávez está dizendo que falou por três horas com ele. Todos os que estão dentro da embaixada recebem e fazem chamadas telefônicas. É inaudito que estejam acusando o governo desse tipo de coisa. O que temos entendido é que Zelaya está planejando sair da embaixada para um hospital para depois tentar tomar a Casa Presidencial.

FOLHA - O sr. enviou o dirigente político Arturo Corrales para falar com Zelaya. Qual foi a mensagem, do que se tratou a conversar?
MICHELETTI
- Iniciar as conversas, escutar o que eles estavam pretendendo, buscar uma fórmula para que o diálogo resulte em algo positivo. Eles o trataram bem, mas não houve nenhum resultado. Não tivemos uma resposta que realmente nos tenha agradado. Quero dizer aos irmãos do Brasil que há um interesse absoluto de Honduras, ter eleições em 29 de novembro, eleições programadas em 2008.

FOLHA - É possível fazer uma campanha eleitoral com Zelaya na embaixada brasileira?
MICHELETTI
- A campanha eleitoral não parou, isso depende dos partidos políticos, da ação que tomem os candidatos para a propaganda. Nenhum candidato parou. Em novembro, teremos um novo presidente eleito. Estou convencido de que, passadas as eleições, os países amigos, com quem temos sido irmãos, reverão a decisão [de não reconhecer as eleições] porque vão negociar com um homem eleito pela maioria do povo. Temos muita fé de que os outros governos entendam que não fizemos um golpe de Estado, não fizemos nada ilegal, estamos atuando dentro da Constituição.

FOLHA - O presidente da Costa Rica, Óscar Arias, disse que as eleições de novembro podem dar fim à crise política. Como poderia ser a solução neste ambiente tumultuado, sem reconhecimento de organismos como ONU e OEA?
MICHELETTI
- Acreditamos que a eleição seja a via para conseguir a tranquilidade. A pergunta que faço é: e o Brasil não veio de um governo militar a um governo democrático? O Chile, a Argentina e a Guatemala, da mesma forma. Neste caso, não cometemos um golpe de Estado, porque os militares tomam o poder. Aqui, os militares estão apoiando a democracia.


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