São Paulo, sábado, 26 de novembro de 2005

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EUROPA

Brecha fiscal que permite que estrangeiros paguem menos impostos no Reino Unido do que em outros países atrai bilionários

Oligarcas russos gastam bilhões em Londres

MAXINE FRITH
DO "INDEPENDENT"

Eles não pensam duas vezes antes de gastar 40 milhões de libras (R$ 154,5 milhões) numa casa ou 250 mil libras num fim de semana -e o Reino Unido é onde querem fazê-lo.
A Rússia tem estimados 33 bilionários e 88 mil milionários (em dólares). Muitos vêem Londres como sua cidade tanto que, no grupinho seleto, a capital britânica é conhecida como Moscou 2.
Atraídos pela distância pequena (apenas três horas de vôo entre Londres e Moscou), pelas normas tributárias relativamente tolerantes e pelas lojas caras, oligarcas e suas famílias andam seguindo o exemplo do dono do clube de futebol Chelsea, Roman Abramovich, e mudando para Londres.
Por causa da crescente população russa de Londres, a revista "Forbes" apelidou a capital britânica de "Londongrado".
São estimados em 300 mil os russos que vivem no Reino Unido, e, embora nem todos possuam a fortuna de Abramovich, uma parte substancial tem dinheiro para ostentar livremente.
A influência dos oligarcas russos é tão grande no país que a criadora de jóias Theo Fennell atribuiu a alta em seus lucros ao aumento de sua base de clientes russos. As vendas subiram 4,5% nos últimos seis meses, numa época em que outras lojas passam por dificuldades. Os clientes competem para comprar crucifixos grandes, pendentes em forma de coração e objetos de prata que, segundo uma representante da casa, variam de preço "entre mil libras e quantos mais zeros você quiser acrescentar".
A diretora de produtos da Theo Fennell, Justine Carmody, explicou: "Nossa ênfase é no design, mais do que simplesmente em produzir anéis de diamantes em grande quantidade, e os russos têm muito discernimento no que diz respeito ao design".
Em razão do número cada vez maior de oligarcas que a visitam e gastam muito em seus vários andares, a loja de departamentos de luxo Harvey Nichols passou a empregar balconistas que falam russo. O gerente de marketing da empresa, Richard Gray, ponderou: "Os russos são para esta década o que os japoneses foram para os anos 1990 e os árabes para a década anterior. Eles têm muito dinheiro e estão dispostos a gastá-lo, mas têm muito bom gosto e costumam explicar especificamente o que querem".
Não são apenas os andares de moda da loja que se beneficiaram. O quinto andar, dedicado à alimentação, teve de dobrar seus pedidos de caviar beluga do mar Cáspio (o mais caro do mundo: 50 gramas custam 146 libras) para satisfazer a demanda de clientes.
O mercado imobiliário britânico também anda recebendo uma injeção de ânimo em razão das vendas a clientes russos. Abramovich, em junho, comprou uma mansão de cinco andares, em estilo georgiano, no bairro de Belgravia, por 11 milhões de libras. O também oligarca Leonard Blavatnik abocanhou uma residência em Kensington Palace Gardens por 41 milhões de libras.
Corretores imobiliários estimam que os russos componham um terço dos compradores dos imóveis de milhões de libras na região londrina. Jonathan Hewlett, diretor de vendas da filial da imobiliária Savills comentou: "De início, Hampstead era uma região muito procurada, mas, recentemente, os russos vêm se mudando para partes mais centrais de Londres. Eles gostam de cômodos grandes e espaços grandiosos, além de estilos contemporâneos".
A empresa Red Square Projects foi aberta em Londres dois anos atrás para atender aos caprichos de russos abastados. Após uma conferência de empresários russos em Londres, em abril, um grupo de delegados pagou por um jantar suntuoso acompanhado de champanhe envelhecido Dom Perignon e garrafas de conhaque de 300 libras cada. Além disso, pagou para Liza Minnelli vir cantar para eles durante uma hora. O custo do jantar e do entretenimento não foi divulgado, mas, segundo fontes informadas, a conta final deve ter chegado a algo em torno de 500 mil libras esterlinas.
Uma representante da Red Square Projects comentou: "A imigração vinda da Rússia se deu em três ondas".
"No início do século 20, as pessoas fugiram da revolução e foram a Paris, que se tornou o destino mais comum dos russos que deixavam seu país por razões políticas. Na década de 1970, um número enorme de russos emigrou para Israel e os Estados Unidos para escapar do comunismo. Agora o Reino Unido é o lugar favorito. Os russos gostam das lojas, da cultura, das escolas particulares e das residências britânicas."
Ela acrescentou: "Além disso, Londres fica a apenas três horas de distância de Moscou de avião. As pessoas podem morar aqui, mas voltar à Rússia para ir a festas e ver seus familiares e amigos".
A proximidade entre Londres e Moscou propiciou o surgimento dos chamados "voskresnuy muzh", ou "maridos de domingo". São homens que trabalham em Moscou, mas, às sextas-feiras, pegam um avião para Londres, onde estão sua casa e sua família, voltando a Moscou no domingo à noite para poder estar no escritório na manhã de segunda-feira.
Outra razão do caso de amor recente da Rússia com o Reino Unido é que este pode funcionar como paraíso fiscal bastante eficaz. Enquanto outros países europeus exigem que seus residentes estrangeiros paguem impostos com base em sua renda e seus ganhos de capital em todo o mundo, no Reino Unido existe uma brecha que permite que as pessoas criem contas no exterior de maneira a evitar a obrigação de pagar esses impostos. Isso significa que os oligarcas podem vender suas ações valiosas em indústrias russas e usar o dinheiro para comprar uma casa no Reino Unido sem pagar impostos sobre o lucro.
Entre 1998 e 2004, mais de US$ 100 bilhões saíram da Rússia, de acordo com a revista "Forbes". Uma parte substancial desse dinheiro agora está sendo gasto nas butiques e nas imobiliárias do Reino Unido.


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