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Reagan assombra republicanos
Fantasma do ex-presidente é evocado à exaustão na campanha nos EUA, mas ninguém consegue incorporá-lo
Candidatos atuais carecem da alquimia que fez do
ex-ator de filmes B, morto em 2004, ícone do partido e congregador de facções
JOHN M. BRODER
DO "NEW YORK TIMES"
Hoje, parte do catecismo republicano envolve evocar regularmente o nome de Ronald
Reagan [1981-1989] e procurar
proteção ritual sob seu manto
imaculado. Os candidatos republicanos deste ano (e até
mesmo um democrata, Barack
Obama) invocaram as bênçãos
do espírito de Santo Ronald de
Dillon, Illinois, para suas candidaturas.
Mas vai ser difícil que algum
deles supere a bajulação-mor a
Reagan, empreendida em 1995
pelo senador Bob Dole, que então iniciava sua batalha pela indicação presidencial republicana no ano seguinte."Eu desejo
ser um novo Ronald Reagan",
disse Dole a dirigentes do Partido Republicano na Filadélfia,
"se é isso que vocês querem".
Com todas as suas admiráveis qualidades, Bob Dole era
tão capaz de ser um novo Reagan quanto de se tornar uma
nova Eleanor Roosevelt. E o
mesmo se aplica à atual safra de
pré-candidatos republicanos,
por motivos tanto de política
quanto de atitude ou de personalidade.
As três primeiras grandes
disputas nas primárias republicanas foram vencidas diferentes candidatos; Mike Huckabee
levou Iowa; John McCain venceu em New Hampshire; e Mitt
Romney ganhou com folga no
Michigan, onde ele passou a infância e a adolescência.
Cada um dos três conquistou
o apoio de uma das porções da
coalizão tripartite que conduziu Reagan à Casa Branca em
1980: os conservadores sociais,
a linha dura quanto à segurança
nacional e os proponentes de
cortes nos impostos e de uma
política mais favorável aos empresários. Com a exceção de
McCain em New Hampshire,
nenhum atraiu grande número
de votos dos trabalhadores, conhecidos no passado como "os
democratas pró-Reagan".
Cenário adverso
Nenhum deles conseguiu
montar o pacote completo que
fez de Reagan um presidente
popular, e reeleito, depois de
dois mandatos como governador da Califórnia, e tampouco
há sinais de que outros candidatos, como Rudolph Giuliani,
sejam capazes de fazê-lo.
Pessoas que estudaram ou
trabalharam nas campanhas de
Reagan consideram improvável que qualquer dos atuais pré-candidatos republicanos o faça.
Até mesmo Reagan enfrentaria
dificuldades para repetir a façanha no ambiente atual, eles
afirmaram, dados os fardos de
uma guerra preocupante, de
uma proto-recessão e de um
presidente republicano impopular com que o partido tem de
arcar hoje em dia.
A despeito de seus esforços,
os candidatos não se provaram
capazes de recriar a alquimia
que transformou o ator de filmes B nos anos 40 em Ronald
Reagan, ícone do Partido Republicano. Não é apenas por que
lhes falte o charme que caracterizava Reagan. O fato é que nenhum deles se dedicou como
Reagan, de forma tão prolongada e assídua, a definir idéias e
desenvolver uma base política e
uma ideologia que tanto fomentava o movimento conservador que começava a crescer
quanto se alimentava dessa
tendência incipiente.
Entre os principais pré-candidatos republicanos, nenhum
construiu um movimento nacional. Apenas McCain disputou a Presidência anteriormente. Dois outros foram governadores de Estados pequenos, e
um foi prefeito de Nova York.
Fred Thompson, que retirou
sua candidatura na última terça-feira, só se assemelha a Reagan por ter sido ator, na série de
TV "Law and Order".
Eles chegaram relativamente
tarde às disputas, e se vêem forçados a tentar montar uma coalizão com base nos grupos desconexos que formam o eleitorado republicano das primárias; para isso, muitas vezes
tentam adoçar seus currículos,
alterando posições e reescrevendo históricos pessoais.
As idéias de Reagan sobre o
livre mercado foram formuladas quando ele foi porta-voz
publicitário da General Electric, nos anos 50 e no começo
dos anos 60; suas opiniões sobre o comunismo tinham por
base sua experiência como líder do Sindicato dos Atores de
Cinema, nos anos 40; e seu senso de ordem social cresceu com
base na desordem crescente
que ele testemunhou nas universidades e cidades da Califórnia nos anos 60.
Quando chegou a eleição de
1980, Reagan era um líder político experiente, e provavelmente o mais eficiente dos oradores do país, o que permitiu
que ele atraísse diferentes eleitorados, dos evangélicos aos
neoconservadores que começavam a emergir.
Ele iniciou a campanha com
um retrospecto conhecido e
exibindo opiniões consistentes
por mais de duas décadas. Seu
currículo incluía sucesso eleitoral no mais populoso Estado
do país e a experiência de duas
campanhas frustradas pela indicação presidencial republicana. Reagan também foi beneficiado por disputar a eleição
contra um oponente impopular, o presidente Jimmy Carter,
e em um período de crise.
Além disso, costumava ser
desconsiderado por seus oponentes e por muitos analistas,
que o rotulavam como ator decadente, ignorante e fantoche
da direita mais furibunda. Morton Kondracke, em artigo na
revista "New Republic" no começo da campanha de 1980, definiu Reagan como "aquele duplo perdedor enrugado, aquele
ex-ator visto como piada".
Talvez os especialistas atuais
também estejam subestimando os candidatos republicanos
deste ano. Quem quer que surja
vitorioso da disputa certamente terá de exibir em alguma medida a persistência que caracterizava Reagan, bem como a
aceitação junto a um eleitorado
primário muito diversificado
em termos geográficos, culturais e políticos.
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