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Sérvia poderia ter evitado genocídio, diz Haia
Corte da ONU exime Belgrado de ordenar massacre de 8.000 muçulmanos em 1995, na Bósnia, mas aponta crime de omissão
Tribunal afirma que comando sérvio sabia que genocídio era iminente; decisão causa revolta entre sobreviventes da carnificina
Damir Sagolj/Reuters
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Diante de painel com fotos de vítimas, sobreviventes do massacre de Srebenica lamentam o veredicto na cidade bósnia de Tulza |
DA REDAÇÃO
No primeiro julgamento de
um país por genocídio desde
1948, quando a Assembléia Geral da ONU criou uma convenção sobre o crime, a Corte Internacional de Justiça de Haia
eximiu a Sérvia da acusação de
ter ordenado o massacre de
muçulmanos bósnios cometido
em 1995, durante o sangrento
conflito que se seguiu ao colapso da antiga Iugoslávia.
Entretanto, embora não tenha encontrado indícios de que
o comando sérvio planejou a
perseguição sistemática do
grupo inimigo, a corte reconheceu como genocídio o massacre
de quase 8.000 pessoas ocorrido na região bósnia de Srebenica, em julho de 1995. Ademais,
a corte concluiu que as autoridades iugoslavas dispunham de
indícios suficientes de que um
genocídio era iminente.
"A corte observa que a República Federal da Iugoslávia [da
qual a Sérvia é sucessora legal]
estava em posição de influenciar os sérvios bósnios que planejaram e implementaram o
genocídio em Srebrenica", concluiu o tribunal.
"A corte lembra que, embora
não tenha concluído que a informação disponível às autoridades de Belgrado indicasse,
como fato certo, que o genocídio era iminente, elas dificilmente poderiam ter ignorado
os sérios riscos [de que ele
ocorresse]."
A decisão dos 15 juízes da
corte permanente da ONU afirma ainda que Belgrado deveria
ter feito esforços maiores para
evitar o que é considerado o
maior massacre em solo europeu desde a Segunda Guerra
Mundial. Sua conclusão é de
que o governo iugoslavo "não
tomou nenhuma iniciativa para evitar as atrocidades", conforme requer a Convenção para
a Prevenção e a Punição do Crime de Genocídio.
Foi a primeira vez que um
Estado foi levado a julgamento
nos termos da convenção desde
sua criação, em 1948. Indivíduos, contudo, já foram condenados por genocídio por massacres na Bósnia e em Ruanda.
A decisão da Corte de Haia provocou imensa revolta no governo da Bósnia, autor da acusação
de genocídio que originou o julgamento, e entre as dezenas de
sobreviventes do massacre de
Srebenica, muitos dos quais foram à Holanda para esperar o
veredicto na porta do tribunal.
Revolta
"Estou chocada. Isso é terrível", disse Hedija Krdzic, 34,
que perdeu o marido, o pai e o
avô em Srebrenica e estava ontem em Haia para protestar.
"Eu vi com meus próprios
olhos quem começou essa
guerra e continuou com a
agressão. Foram os sérvios."
Em um veredicto histórico,
de 171 páginas, o tribunal, também conhecido como Corte
Mundial, confirmou que o massacre cometido por forças servo-bósnias no encrave de Srebrenica, que matou quase 8 mil
homens e meninos muçulmanos, foi um ato de genocídio.
Embora admitindo não ter
como comprovar que Belgrado
ordenou a carnificina, a corte
afirma que o comando sérvio
permitiu que ela acontecesse.
Em seu veredicto, a corte ordena ainda que o Estado sérvio
entregue dois suspeitos de arquitetar o massacre, Radovan
Karadzic e Ratko Mladic, ambos foragidos.
"A corte concluiu que [a Sérvia] poderia e deveria ter agido
para evitar o genocídio, mas
não o fez", disse a britânica Rosalyn Higgins, presidente do
tribunal.
Uma decisão que acusasse
Belgrado de cometer genocídio
abriria caminho para pedidos
de indenização que poderiam
alcançar bilhões de dólares. No
plano político, poderia bloquear as negociações para a
adesão da Sérvia à União Européia. A entrega de acusados de
crimes de guerra foragidos à
Justiça continua sendo uma
das exigências da UE para que
as conversações progridam.
O presidente da Sérvia, Boris
Tadic, elogiou a decisão da corte e concordou que a cooperação com o tribunal da ONU é de
importância crucial para o futuro da Sérvia: "A menos que a
Sérvia finalmente coopere, o
país enfrentará conseqüências
políticas dramáticas". O chefe
da política externa da UE, Javier Solana, elogiou o veredicto:
"Saudamos o fato de não ter havido punição coletiva".
Com agências internacionais
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