São Paulo, domingo, 27 de fevereiro de 2011

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

ONDA DE REVOLTAS

Advogado líder de rebelião diz que ditador "já acabou"

Defensor das famílias de vítimas de massacre ordenado por ditador é um dos chefes do comitê que controla Benghazi

"Eu contava com uma revolução, mas não tão rápida", diz Fathi Terbil; ex-ministro da Justiça assume governo rebelde

MARCELO NINIO
ENVIADO ESPECIAL A BENGHAZI (LÍBIA)

Com um boné do time de beisebol americano Yankees e um lenço árabe enrolado no pescoço, Fathi Terbil parece mais cantor de rap do que líder revolucionário.
Mas o advogado de 39 anos, fã dos argentinos Lionel Messi e Diego Maradona, é um dos cabeças do comitê popular que controla Benghazi desde que a segunda cidade do país foi tomada pelos rebelados.
Ontem, segundo a rede Al Jazeera, o ex-ministro da Justiça líbio Mohamed Ajleil assumiu a chefia do governo interino baseado na cidade.
Em entrevista à Folha numa carona de caminhonete, Terbil estimou que o ditador líbio, Muammar Gaddafi, perdeu 85% do país. "Gaddafi está acabado", disse Terbil, enquanto a caminhonete deixava o Tribunal de Justiça de Benghazi e avançava lentamente no mar de gente que celebrava a revolução.
A sede do Judiciário local transformou-se no QG da oposição, onde o governo provisório coordena os próximos passos do levante com outras partes do país.
Benghazi parou para se jogar na revolução contra Gaddafi desde o dia 15, início dos protestos. Foi quando as forças do ditador invadiram a casa de Terbil e prenderam o advogado, tentando sufocar as manifestações marcadas para dois dias depois. O efeito, como se viu, foi o oposto.
Após quatro dias e sangrentos conflitos com centenas de mortos, Benghazi passou ao controle da oposição.
"Contava com uma revolução, mas não que ela seria tão rápida", admite Terbil, conhecido como defensor das famílias das vítimas do massacre de prisioneiros em Abu Salim, Trípoli, em 1996.
Para o advogado, ainda é cedo para pensar na Líbia pós-Gaddafi. A prioridade, diz ele, é concentrar esforços na intifada (revolta) para destruir "totalmente" o regime e manter a administração das áreas libertadas.
Segundo Terbil, o comitê inclui empresários, advogados, jornalistas, ativistas de direitos humanos e militares, escolhidos com base em três critérios: lealdade à pátria, credibilidade e qualificação.
Organizados num banco de dados, centenas de voluntários assumiram as funções antes desempenhadas pelo regime. O comprometimento se une ao improviso: há enfermeiros que viraram seguranças, engenheiros que orientam o trânsito e empresários que tiram dinheiro do bolso para que nada falte.
Escolas, repartições e a maior parte do comércio continuam fechados, e a vida em Benghazi está suspensa, à espera da queda de Gaddafi.
Ali Sham, 44, dono de escola primária, largou tudo e passa os dias no tribunal, ajudando a organizar o comitê. Ele levou mulher e três filhos pequenos (11, 6 e 5) para os protestos desde o primeiro dia. Foi atacado com ácido por mercenários, pôs em risco a vida da família, mas diz que não se arrepende.
O fim de 42 anos da ditadura de Gaddafi justifica qualquer sacrifício, diz ele: "Sentimos o gosto da liberdade, é impossível voltar atrás".
Os muros de Benghazi estão cheios de pichações contra o ditador, muitas pedindo sua execução. Mas Terbil é contra. "Quero ver Gaddafi julgado diante do mundo pelos crimes que cometeu".


Texto Anterior: Onda de revoltas: Navio com brasileiros deixa a Líbia rumo à Grécia
Próximo Texto: Empresário monta "bunker" cibernético
Índice | Comunicar Erros



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.