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São Paulo, quinta-feira, 27 de março de 2003

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VIDA DE REPÓRTER

Falta de banho, de bebidas quentes e de sono forma a rotina de quem acompanha as tropas

"Viver em trincheira é a parte fácil"

Chuck Liddy/Associated Press
Jornalistas de veículos norte-americanos que acompanham as tropas da coalizão testam máscaras contra ataques químicos


MATTHEW GREEN
DA REUTERS

O rifle do soldado americano estava apontado bem para o meu peito. "Estava pronto para atirar em você", sussurrou o sujeito, ao perceber que eu era um repórter e não um soldado iraquiano.
Para nós dois foi um momento de muita tensão. Uma nova geração de soldados norte-americanos e britânicos -e de repórteres cobrindo as operações- está tendo a primeira experiência numa zona de guerra.
Centenas de jornalistas acompanham as tropas americanas que entraram no Iraque. Como muitos soldados, alguns repórteres nunca participaram de um conflito em tão larga escala.
Na noite em que a invasão começou, eu me entrincheirei ao lado de um soldado de 19 anos enquanto soava a artilharia e as sirenes tocavam ao longe. Ele acabou dormindo com sua máscara de gás, com receio de que, durante o sono, sofresse um ataque com armas químicas.
Mas se esconder em trincheiras é a parte mais fácil da vida de quem acompanha as tropas. Nada de bebidas quentes, muito menos de banhos. Uma dolorosa falta de sono, roupas manchadas de suor e as eternas refeições de "pratos feitos", rações que marcam o caminho até Bagdá. E não faltam soldados que amaldiçoam a ração número oito -o hambúrguer.
Independentemente das rações, no entanto, a vida dos civis e das tropas iraquianas tende a ser bem mais dura do que a da maioria dos soldados e repórteres que acompanham as tropas de coalizão.
De qualquer forma, a unidade em que fui encaixado é parte de um pelotão de caminhões que transportam comida, combustível e munição para os soldados na linha de frente.
Algumas vezes dá para ter umas poucas horas de sono -às vezes na areia mesmo. As botas continuam nos pés, mesmo quando conseguimos dormir, e a vestimenta contra armas químicas também. Ninguém se lavou desde que a guerra começou e, para "ir ao banheiro", o jeito é cavar um buraco no chão ou colocar "de cabeça para cima" as caixas de munição e usá-las como "penico".
Trabalhar em caminhão tem seus próprios problemas. À noite, o repórter deve usar o computador com um cobertor em sua cabeça e encobrindo o próprio aparelho -escondido, enfim, como uma criança que quer ler "revistas proibidas". Assim dá para evitar que a luz da tela do computador deixe o veículo iluminado e o torne um alvo mais fácil para as tropas iraquianas.
E para se dar bem com os soldados, é só se lembrar da máxima que eles têm: "Seja profissional, seja educado, mas tenha um plano para matar todo mundo que você encontrar pela frente."


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