São Paulo, quarta-feira, 27 de junho de 2007

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Agência detalha recurso à Máfia para envenenar Fidel

DE WASHINGTON

Agosto de 1960. O ex-agente da CIA Robert Maheu é contatado pela agência para realizar uma "ação do tipo de gângsteres": coordenar o assassinato de Fidel Castro. Ele sugere para a missão um mafioso, John "Handsome Johnny" Roselli, que se recusa mas sugere outros dois mafiosos, Salvatore "Momo" Giancana, considerado o sucessor de Al Capone, e Santos Trafficante, chefe da Máfia na Flórida.
Eles fariam, claro, e nem precisariam dos US$ 150 mil de que a agência dispunha para a operação, mas afirmam que "um tipo de pílula potente" é melhor que armas de fogo.
A agência fornece seis pílulas de "alto poder letal". Durante a operação, Giancana pergunta se a CIA não pode colocar uma escuta no quarto de sua namorada: o mafioso suspeitava que ela o traísse. Quando tenta instalar a escuta, o técnico é preso, e o então secretário da Justiça, Robert Kennedy, irmão do presidente JFK, intervém para que as acusações sejam retiradas.
Um primeiro cubano é contatado para o assassinato, mas desiste. Um segundo reinicia a ação, suspensa com a invasão da Baía dos Porcos, em 1961.
O então diretor da CIA, Allen Dulles, está sabendo de tudo.
Que a agência planejou o assassinato do ditador cubano é fato conhecido já há alguns anos. Que seu diretor não só sabia dos detalhes rocambolescos da operação como a aprovou foi confirmado pela primeira vez ontem, pela própria CIA, ao liberar ao público 700 páginas de documentos dos arquivos chamados "Jóias da Família".
O apelido designa todas as operações conduzidas pelo órgão que são ou foram ilegais ou possam causar constrangimento ao governo. Parte delas, referente aos anos 50 e 70, veio ao público ontem, iniciativa do atual diretor, general Michael Hayden. Entre as revelações, que foram parcialmente adiantadas na sexta passada, estão episódios de escuta e vigilância ilegais de estrangeiros, cidadãos norte-americanos e jornalistas críticos e tratamento desumano de um desertor russo.

Lumumba e Allende
Um dos memorandos, de 14 de fevereiro de 1971, é direto:
"Em novembro de 1962, o sr. [nome oculto] disse ao sr. Lyman Kirkpatrick [então inspetor-geral da CIA] que em certa ocasião o sr. Richard Bissell [agente da CIA] pediu que ele assumisse a responsabilidade de um projeto envolvendo o assassinato de Patrice Lumumba, então premiê da República do Congo. De acordo com [nome oculto], veneno seria o instrumento, pois ele mencionou ter sido instruído a procurar o sr. Sidney Gottlieb [psiquiatra militar da CIA] como procedimento para obter tal veiculo".
Uma reprodução de reportagem do jornal "Baltimore News American" de 12 de abril de 1973 que fala sobre plano da CIA para assassinar o presidente socialista Salvador Allende, do Chile, traz um trecho sublinhado ("A CIA, usando uma empresa de fachada, mandou para Santo Domingo armas usadas para matar o brutal ditador Trujillo), com as palavras escritas à mão: "Colby! Verdade?" William Colby foi o diretor da agência sob o presidente Richard Nixon; o envelope vem com as siglas "WH", de "White House" (Casa Branca).
Há ainda a Operação Mockingbird, que em 1962 e 1963 espionou dois jornalistas de Washington para descobrir suas fontes no governo, autorizada por Robert Kennedy e Robert McNamara, então secretário da Defesa de JFK. E o relatório do então diretor de segurança dando conta que, de abril de 1964 a agosto de 1967, o russo Yuriy Ivanovich Nosenko foi mantido numa cela improvisada "pouco maior do que um dedal" e interrogado repetidamente e de forma hostil para saber se era um agente duplo.
Sobre os planos de assassinato de líderes como Fidel e Lumumba, em carta de fevereiro de 1972, o então diretor da agência responderia assim ao editor de uma revista: "Posso dizer, sob juramento se for preciso, que a CIA nunca conduziu um assassinato político nem induziu, empregou ou sugeriu que alguém o fizesse".


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