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Disputa envolverá peronistas com propostas distintas de governo
MARCELO BILLI
DE BUENOS AIRES
As eleições presidenciais argentinas serão decididas, pela primeira vez na história do país, no segundo turno. Disputarão a Presidência Carlos Menem, 72, e Néstor Kirchner, 53, ambos peronistas -membros do PJ (Partido
Justicialista).
O segundo turno ocorre em 18
de maio. Os argentinos deverão
escolher entre dois modelos econômicos praticamente opostos.
Menem é o candidato preferido
do mercado financeiro, das empresas estrangeiras que participaram das privatizações e dos economistas liberais que, em maior
ou menor grau, ditaram a política
econômica adotada pelo país durante toda a década de 90. "Temos
a missão de tirar a Argentina do
desastre. E vamos conseguir, como conseguimos em 1989", disse
Menem.
O ex-presidente propõe uma
plataforma de governo não muito
distinta da que seguiu quando foi
presidente, entre os anos de 1989 e
1999. Seu único erro, admitiu faz
poucas semanas, teria sido o descontrole do gasto público. Seu
programa prevê abertura econômica, continuidade das privatizações, negociação da dívida sem
abatimento do valor dos títulos e
um estreitamento das relações do
país com os EUA.
Kirchner é o candidato dos chamados desenvolvimentistas. Seu
ministro da Economia será, caso
eleito, Roberto Lavagna, que dirige o ministério desde abril do ano
passado e, para os liberais, foi demasiadamente intransigente nas
negociações com o FMI (Fundo
Monetário Internacional) e com
as empresas de serviços públicos.
"Os argentinos votaram pela mudança. A Argentina quer voltar a
sonhar e a ter esperança", disse o
candidato.
Proteção à indústria nacional,
incentivos para as exportações,
subsídios para pequenas e médias
empresas, abatimento do valor
principal e dos juros da dívida externa são a base do programa econômico do candidato. A diplomacia do presidente Kirchner tenderia ao alinhamento ao Brasil e ao
fortalecimento do Mercosul.
O resultado não mostra exatamente uma completa renovação
política no país, como pedia a população quando saiu às ruas e
obrigou o ex-presidente Fernando de la Rúa a renunciar em dezembro de 2001. Tanto Kirchner
quanto Menem são peronistas,
ainda que representem tendências opostas dentro do PJ. Kirchner é o candidato de centro-esquerda do peronismo. Menem, de
centro-direita.
O peronismo continuará sendo
o principal partido político argentinos nos próximos anos, mas os
resultados de ontem mostram
que pelo menos duas novas forças
políticas emergiram da crise política e econômica na qual o país está imerso desde 2001. Tanto Elisa
Carrió, 47, quanto Ricardo López
Murphy, 52, obtiveram boas votações. Ambos eram políticos da
UCR (União Cívica Radical), partido de De la Rúa, e a abandonaram para fundar suas próprias
agrupações.
Carrió fez a campanha mais barata destas eleições -se estima
que gastou R$ 0,06 por voto, enquanto Menem gastou mais de R$
1,50. Diz que não apoiará nenhum
candidato no segundo turno mas
que "é claro que não votaremos
no Menem". Seu partido, o ARI
(Argentina por uma República de
Iguais) deverá se transformar na
principal força política de centro-esquerda na Argentina.
À direita, a novidade é López
Murphy, economista ortodoxo
que, depois de amargar uma
quinta colocação nas pesquisas
durante muitos meses, conquistou parte do eleitorado conservador e independente e o apoio de
parte do establishment financeiro
argentino.
Calma
A calma e a apatia dos eleitores
só foi interrompida em poucos e
isolados momentos. O ex-presidente Fernando de la Rúa (1999-2001) teve que esperar que agentes de segurança abrissem caminho para que ele pudesse passar
por um grupo de pouco mais de
20 manifestantes. Aos gritos, eles
o acusavam de trair a população.
López Murphy também teve
que enfrentar um pequeno grupo
de manifestantes que, entre outros insultos, o chamavam de "entrega pátria".
Um último pequeno protesto
ocorreu quando Daniel Scioli,
candidato a vice de Kirchner saiu
da escola onde havia votado. Um
grupo de pouco mais de cinco
pessoas protestava contra o candidato que, sem seguranças, voltou para casa caminhando.
Foram todos pequenos incidentes. O presidente Eduardo Duhalde declarou que os repudiava
mas, no final do dia, Alfredo Atanasof, chefe do gabinete de Ministros, sequer os comentou quando
disse que "o governo está mais que
satisfeito pela demonstração de
vocação democrática" da população argentina.
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