São Paulo, terça, 28 de abril de 1998

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SEGUNDA GUERRA
Justiça condena governo a apagar US$ 2.272 a mulheres que foram estupradas por soldados japoneses
Japão deve indenizar coreanas escravas

Associated Press
Sul-coreana chora deitada no chão após a sentença que a beneficiou


MARCIO AITH
de Tóquio

Uma corte de Yamaguchi, ao sul do Japão, mandou o governo japonês indenizar três cidadãs coreanas transformadas em escravas sexuais de soldados japoneses durante a Segunda Guerra Mundial.
É a primeira decisão do gênero desde 1992, quando o Japão reconheceu oficialmente que seu Exército teve participação no rapto de cerca de 200 mil coreanas e chinesas, enviadas para satisfazer sexualmente soldados japoneses nas linhas de batalha chinesas.
As mulheres, que ficaram eufemisticamente conhecidas como "comfort women" (mulheres que provêem conforto), foram repetidamente estupradas por militares japoneses durante anos.
Apesar do reconhecimento e de um pedido de desculpas do governo japonês em 1993, o Japão se recusa a conceder indenizações individuais às ex-escravas, dizendo que o caso teria sido resolvido e sepultado pelos acordos de paz que puseram fim à guerra.
Em 1995, o Japão criou um fundo financeiro para dar assistência e enviou uma carta de desculpas às ex-escravas. Quase todas as cartas foram devolvidas.
A decisão de ontem tende a influenciar outros cinco processos similares em andamento na Justiça de Tóquio.
Segundo o juiz Hideaki Chikashita, que presidiu o julgamento, o governo do Japão deve compensar individualmente as ex-escravas "pelos seus sofrimentos e pela violação de seus direitos mais fundamentais".

Valos baixo
Apesar da decisão, o juiz estipulou indenização de US$ 2.272 para cada uma das três coreanas, um valor considerado baixo.
O caso julgado ontem faz parte de um processo mais amplo, movido pelas três ex-escravas sexuais e por outras sete coreanas obrigadas a trabalhar em fábricas de munição no Japão. O pedido das outras sete mulheres foi rejeitado. O valor total pedido pelas dez mulheres juntas é de 564 milhões de ienes, ou US$ 4,2 milhões.
A TV estatal japonesa mostrou algumas das mulheres entrando de mãos dadas na sala de julgamento, algumas vestindo roupas típicas da Coréia.
Uma das três ex-escravas, Lee Sun Dok, 79, compareceu ao julgamento. Ela tinha 20 anos quando foi levada da Coréia por soldados japoneses.

Humilhação
A corte reconheceu ainda que as três mulheres foram especialmente humilhadas por uma declaração de 1994 do então ministro da Justiça japonês, Shigeto Nagano, sugerindo que as "comfort women" eram na verdade prostitutas voluntariamente trabalhando para o Exército japonês.
A negativa do governo japonês em indenizar as ex-escravas sempre foi um assunto polêmico nas relações diplomáticas entre o Japão e os países de onde as mulheres foram raptadas -Coréia, China e Taiwan.
A decisão de ontem veio dez dias depois que o novo governo da Coréia do Sul, do presidente Kim Dae Jung, decidiu pagar uma compensação às ex-escravas. Jung foi motivado pela negativa do governo japonês em conceder indenizações às coreanas.
"Nós reiteramos que uma relação mutuamente benéfica e orientada para o futuro só pode ser obtida quando o Japão reconhecer os erros de seu passado e refletir sobre seus atos com remorso", disse um porta-voz do governo coreano há dez dias. Os dois governos não se manifestaram sobre a decisão.
Taiwan já havia pago, no ano passado, compensações às mulheres feitas escravas pelo governo japonês.



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