São Paulo, sábado, 28 de junho de 1997.



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TROCA DE LÍNGUA
Dialeto oficial da China, passa a ser usado também em Hong Kong a partir de segunda-feira
Funcionários públicos tentam aprender mandarim, o chinês do novo governo

STEVE CRAWSHAW
do "The Independent", em Hong Kong

Um grupo de 15 funcionários públicos ocupa uma sala de aula no 17º andar de um edifício de escritórios em Hong Kong, em um dos muitos cursos de chinês mandarim que estão sendo organizados por toda parte em Hong Kong. Eles riem da dificuldade que encontram para ler as frases em voz alta.
Praticamente todas as empresas montaram cursos para seus funcionários. A partir da meia-noite da segunda-feira, Hong Kong fará parte da China, e os chineses esperam que seus habitantes saibam falar a língua do governo. Qualquer funcionário público que só conheça o cantonês, o chinês falado em Hong Kong, corre o risco de não ser promovido nos próximos anos, ou até de perder o emprego.
Nas palavras de um estudante de mandarim em Hong Kong, "as pessoas que vêm de Pequim não querem aprender cantonês. Então, são as pessoas daqui que têm de aprender o 'putonghoa' (mandarim)". Existem precedentes, é claro. Como observou um funcionário: "Antes, falávamos inglês. É normal que agora esperem que falemos mandarim".
Os chineses de Pequim querem que os cidadãos de Hong Kong falem a língua dos novos governantes. O conceito de "putonghua" (língua comum) foi introduzido neste século, com o fim de criar uma unidade linguística na China. Pequim já deixou claro seu desagrado com o fato de que o nível de conhecimento de mandarim é baixo em Hong Kong.
Resultado: um aumento inusitado no número de cursos de mandarim. Há dez anos, apenas algumas centenas de funcionários públicos estudavam. Em 1992 esse número já havia triplicado, chegando a mil. Hoje, são mais de 7.000.
O cantonês às vezes é descrito como um dialeto chinês. Na realidade, embora os caracteres escritos em Hong Kong e na China continental sejam aproximadamente idênticos, a diferença entre as duas línguas faladas é mais do que uma simples questão de pronúncia. Os funcionários afirmam que existem bons motivos para se falar mandarim, mas reconhecem que o principal é a necessidade de se comunicar com os representantes da China continental.
Apesar dos problemas políticos, muitos nativos de Hong Kong estão felizes em aprender a nova língua. Sim Kam-wah, um policial que estuda mandarim, explica que aprender o "putonghua" não é como aprender uma língua estrangeira: "Hong Kong faz parte da China, e a língua nacional é o 'putonghua'. É natural que tenhamos que aprendê-la".
Steven Shum, do Departamento de Engenharia Civil, está feliz em saber que poderá se comunicar com seus compatriotas. "Tenho vergonha do fato de que os chineses não possam se comunicar entre si. Antes, nós não falávamos o 'putonghua', e Hong Kong era excluída."
A idéia generalizada em Hong Kong é que, apesar da promessa chinesa de respeitar o preceito de "um país, dois sistemas", Hong Kong irá pouco a pouco ser moldada no formato da China continental. Mas esse processo pode se dar nos dois sentidos. Um funcionário público observou que os chineses do continente enviados a seu departamento raramente são autorizados a permanecer em Hong Kong por muito tempo. "Pequim não quer que sejam contaminados pelo vírus da democracia", disse ele. Se isso acontecer, as autoridades comunistas de Pequim talvez sintam saudades da barreira linguística que hoje procuram derrubar.


Tradução de Clara Allain




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