São Paulo, sábado, 28 de julho de 2007

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Aliado americano se vê acuado às vésperas de eleições

CLARA FAGUNDES
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Principal aliado dos Estados Unidos no Sudeste Asiático em sua guerra contra o terrorismo, o ditador do Paquistão, Pervez Musharraf, encontrou-se ontem com o líder do oposicionista PPP (Partido do Povo Paquistanês), numa tentativa de romper o isolamento do governo. Enfrentando oposição dos partidos laicos e da aliança de islâmicos moderados Muttehida Majlis-e-Amal, o general atravessa a pior crise de seus oito anos de governo.
Para o cientista político Rasul Rais, chefe do departamento de Ciências Sociais da Universidade de Lahore, a aproximação com o PPP, acusado de corrupção pelo governo, é um desgaste político para Musharraf. A tentativa de estabelecer uma base de apoio pode, porém, ser fundamental para que ele chegue até o fim do mandato, em dezembro.
A reeleição parece menos provável do que nunca. Caso consiga vencer obstáculos legais à sua candidatura, objeto de análise na Suprema Corte, o ditador terá dificuldades no pleito, previsto para outubro. "Musharraf fez muito inimigos. Perdeu apoio de sua base, moderada, e quebrou acordos de paz com os líderes tribais do norte", diz Rais.
Com o retorno do presidente da Suprema Corte, Iftikhar Chaudhry, ganha novo fôlego a ação do juiz questionando a legitimidade de acumular a chefia militar e civil do país, proibida pela constituição antes do golpe. Ainda que seja candidato, Musharraf provavelmente terá que deixar o uniforme.

Sangue
A perda de popularidade entre os moderados se soma ao recrudescimento dos atentados terroristas no país. Insurgentes iniciaram uma série de ataques em resposta ao massacre de radicais islâmicos entrincheirados na Mesquita Vermelha de Islamabad, no início do mês. Muitos dos mortos eram jovens estudantes de madrassas (escolas islâmicas).
Se, antes da tomada da mesquita, Musharraf sofria críticas pela incapacidade de controlar os rebeldes, o derramamento de sangue no local foi criticado no país mesmo pelos moderados. Mais de 96% dos paquistaneses são muçulmanos e, desde sua criação, com a separação da Índia, em 1947, a República Islâmica do Paquistão busca a unidade por meio da religião.
"É inegável que temos mais em comum com a Índia que com a Arábia Saudita. Nem precisávamos ser outro país", diz o engenheiro Umayr Hassan, 23, muçulmano não-praticante.
A opinião de Hassan é rara entre seus compatriotas. A situação entre Índia e Paquistão é tensa, com conflitos freqüentes ao longo do século 20.
O cientista político Rasul Rais diz que uma transição democrática no governo pode acelerar um pouco o estreitamento das relações Índia-Paquistão, sobretudo em caso de um governo de maioria laica. Tendo a ascensão política baseada em sua atuação no conflito da Caxemira, o general Musharraf sempre sofreu restrições entre os indianos.
Rais acredita que uma eventual mudança de governo pode trazer impactos internos, mas não representará mudanças significativas na política externa do país.
"Nas circunstâncias atuais, nenhum partido tem condições de obter maioria e a base do próximo governo deve ser compostas por alianças", diz. Nem o Muttehida Majlis-e-Amal nem os partidos laicos demonstram intensão de romper relações com os norte-americanos, afirma o professor.
O apoio ostensivo aos Estados Unidos tem sido, porém, um problema doméstico para o ditador. Ontem, Musharraf afirmou que não permitirá nenhuma operação militar estrangeira no país, em um esforço para afastar a imagem de subserviência aos EUA tão criticada pela população local.
Washington, por sua vez, disse não descartar a hipótese de uso da força contra a Al Qaeda no norte do Paquistão.


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