São Paulo, sexta-feira, 28 de setembro de 2007

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Soldados matam opositores em Mianmar

Ditadura militar intensifica a repressão; oito manifestantes pró-democracia e um fotógrafo japonês são mortos a tiros

Violência esvazia protestos e governo inicia bloqueio de celulares e internet no país; atos contra budistas podem minar movimento popular

Reuters
Soldados lançam bombas de gás depois de atirarem contra multidão durante manifestação pró-democracia em Yangun; ao menos nove civis foram mortos ontem

DA REDAÇÃO

O aumento da violência na repressão aos atos pró-democracia em Mianmar resultou na morte de ao menos nove pessoas ontem em Yangun, segundo dados do próprio governo militar. Soldados atiraram contra manifestantes depois que eles se recusaram a deixar as ruas apesar dos alertas de que poderiam ser baleados. Outras 11 pessoas ficaram feridas.
Um dos mortos é o fotógrafo japonês Kenji Nagai, 50, que foi baleado no peito quando capturava imagens do protesto em Sule Pagoda. Segundo a TV estatal, os cerca de mil manifestantes na área lançaram pedras e garrafas de água contra os soldados e deixaram 31 feridos.
O Exército atirou contra multidões em pelo menos quatro pontos de Yangun, que recebeu ontem cerca de 70 mil manifestantes nas ruas no décimo dia das maiores marchas em 20 anos contra o regime militar, vigente no país desde 1962. Em Mandalay e Sitwe, ao menos 10 mil protestaram.
Além dos ataques a tiros, o Exército também invadiu monastérios durante a madrugada, espancando e prendendo mais de cem monges. "Soldados derrubaram os portões e quebraram janelas e móveis. Quando os monges resistiram, lançaram bombas de gás lacrimogêneo, os espancaram e arrastaram vários para caminhões que esperavam na rua", afirmou um religioso à agência Associated Press.
O derramamento de sangue começou na última quarta-feira, quando mais de três pessoas foram mortas durante atos similares em Yangun.

Entre os mais pobres
Os protestos começaram em 19 de agosto, devido a um aumento de 500% no preço dos combustíveis. O aumento veio agravar a situação da população de um dos países mais pobres da Ásia, com renda per capita estimada de apenas US$ 1.600 e o crescimento mais baixo (2,9% anuais) da região do delta do rio Mekong, que inclui ainda Tailândia, Vietnã, Camboja e Laos.
O isolamento internacional imposto ao regime e privilégios concedidos a uma casta empresarial ligada aos militares contribuíram para a deterioração econômica, apesar de Mianmar ter gás, petróleo e pedras preciosas. Investimentos chineses e indianos não são suficientes para compensar boicotes dos EUA, do Canadá e da União Européia. Oposicionistas relataram ao jornal britânico "The Guardian" que, nos últimos meses, cortes de energia elétrica duravam de cinco a sete horas por dia.
Com o aumento dos combustíveis como estopim, o movimento oposicionista tomou as ruas e nas últimas semanas ganhou um caráter pró-democracia. Os protestos lembram os de 1988 -que terminaram com a morte de cerca de 3.000 pessoas, baleadas por soldados durante manifestações nas ruas.
Com a violência de ontem, porém, a participação dos monges budistas nos atos caiu enormemente. Sem os religiosos, não se sabe o quanto o movimento oposicionista resistirá.
Segundo dissidentes locais, o governo também iniciou esforços para restringir o uso de telefones celulares e internet, em uma tentativa de impedir que imagens e informações sobre a violência cheguem ao mundo.

Pressão externa
O ataque contra a população ocorreu apesar dos apelos internacionais para a contenção da violência. Os EUA especificaram as novas sanções anunciadas anteontem contra Mianmar. Elas incluem punições econômicas contra 14 altos dirigentes do governo, inclusive o líder da junta militar, general Than Shwe. Cidadãos americanos estão proibidos de fazer negócios com os 14 citados, que terão bens congelados em bancos e instituições financeiras sob jurisdição dos EUA.
Membros da Associação das Nações do Sudeste Asiático (Asean) se disseram "chocados pelos relatos de que armas automáticas foram usadas" e exigiram que o governo de Mianmar "desista imediatamente de usar violência contra civis".


Com agências internacionais


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