São Paulo, domingo, 28 de outubro de 2007

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Mães se unem na dor por filhos mortos ou presos ao optar "pela montanha"

DO ENVIADO A DIYARBAKIR

Mães pela Paz. Para muitos turcos, o nome dessa organização de mães de guerrilheiros do PKK (Partido dos Trabalhadores Curdos) é uma cínica contradição. Como podem ser pela paz se representam membros de um grupo terrorista que já causou tantas mortes no país?
Para as 35 mulheres que se reúnem diariamente em um apartamento de dois quartos transformado em sede da organização, num bairro de classe média da região central de Diyarbakir, esse pensamento reflete a intolerância que ajuda a perpetuar o sangrento conflito entre curdos e turcos.
"Todas aqui perderam um, dois, até três filhos em confrontos com as forças de segurança turcas, ou esperam há anos que sejam libertados da prisão. Mas continuam a acreditar na paz", diz Sultan Hamoula, 60, uma das mais jovens do grupo.
Seu filho tinha 14 anos ao ser preso quando lutava nas fileiras do PKK. "Foi torturado, apanhou, foi mantido isolado. Hoje tem 39 e ninguém sabe direito se um dia será libertado. Mas eu espero."
A trágica história de Sultan é uma das mais amenas entre os relatos ouvidos no escritório da organização. Criada há sete anos em Istambul, dois anos depois estendeu suas atividades a Diyarbakir. O objetivo era buscar o consenso através da dor. Não funcionou.
"Em cinco anos estiveram aqui dezenas de jornalistas estrangeiros, mas apenas um turco. E o que ele fez? Em vez de ouvir nossas histórias, tentou nos convencer de que nossos filhos eram terroristas", diz Dilsah, 68, que prefere não dizer o sobrenome.
Em seguida ela conta a sua história. Um ano antes de se formar na universidade, o filho mais novo, com pouco mais de 20 anos, concluiu que não adiantava estudar e que a única maneira de conquistar direitos iguais aos dos turcos, sendo curdo, era "ir para as montanhas" -expressão usada para alguém que entrou para o PKK.
"Logo começou o assédio do Exército. Vinham quase diariamente e perguntavam onde estava meu filho, mas nós não sabíamos de nada. Depois passaram a jogar cartas mandando que deixássemos a região. Como não obedecemos, incendiaram nossa casa", conta Dilsah. "Mas não parou por aí. Foram atrás de um outro filho meu e o espancaram até a morte em Istambul. Depois também mataram meu marido. Agora só me resta um filho, que saiu há pouco da prisão."
Enquanto descrições de abusos cometidos pelo Exército prosseguem, um após o outro, um choro irrompe no quarto ao lado. Uma das mães acabou de saber pela internet que seu filho foi morto em um incidente com o Exército.
Hanim, 65, também perdeu três filhos "nas montanhas", um de 16, um de 17 e outro de 20. Ela não guarda ressentimento contra o grupo que seus filhos morreram defendendo. "O PKK é a única esperança de justiça para os curdos", diz ela, que não vê contradição em apoiar a guerrilha e lutar pela paz . "Procuramos mães turcas que perderam soldados, mas não fomos recebidas. Só queríamos dizer: sua dor também é a nossa." (MN)

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