São Paulo, quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

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Peritos em armas e vítimas civis apontam uso de fósforo branco contra palestinos

Ben Curtis - 19.jan.09/Associated Press
Fatma El-Banneh, 8, vai à escola da ONU; mãe diz que a menina foi queimada por fósforo branco

RAPHAEL GOMIDE
ENVIADO ESPECIAL À FAIXA DE GAZA

Quando o enfermeiro Ahmad Al Hendi trocou o curativo da extensa queimadura no braço da camponesa Sabah Abu Halima, horas após o primeiro atendimento, levou um susto. De dentro do ferimento, saía fumaça. Sabah foi provavelmente queimada por fósforo branco, material altamente inflamável que reacende imediatamente em contato com o oxigênio.
O perito em armamentos e consultor da Anistia Internacional na faixa de Gaza Chris Cobbsmith afirmou ontem à Folha que "há provas cabais de que Israel usou artefatos de fósforo em quantidade significativa, em todos os lugares e em áreas residenciais, de alta densidade populacional".
O governo israelense inicialmente negou o uso de qualquer tipo de armamento que viole a legislação internacional durante a ofensiva de 22 dias contra o grupo extremista islâmico Hamas que deixou mais de 1.300 mortos e 5.000 feridos. Mais tarde, Israel informou ter iniciado investigação interna para apurar suspeitas do tipo.
A legislação internacional permite o uso de fósforo branco em zonas de guerra para iluminar e camuflar em manobras diversionistas, mas não como arma -e não em áreas civis.
A camponesa Sabah, que perdeu marido e quatro filhos no episódio, foi um dos poucos pacientes com queimaduras do tipo a não ser transferida do Hospital Shifa, o maior em Gaza, para tratamento no exterior.

Tratamento desconhecido
"É a primeira vez que vemos fósforo, não temos experiência nem sabemos tratar corretamente", disse o enfermeiro Ahmad Al Hendi. Se o fósforo estiver no ferimento, pode continuar a queimar sob os curativos. O uso de água agrava o quadro e produz um tipo de ácido.
Segundo Cobbsmith -major de Artilharia da reserva do Exército Britânico, instrutor e inspetor de armas de destruição em massa no Iraque- "não há nenhuma dúvida" do uso do artefato em Gaza ilegalmente.
Ele aponta como agravante o fato de o material ter sido disparado por artilharia, com alcance de até 25 km, em cápsulas de 155 milímetros, provavelmente de dentro de Israel para Gaza. "A artilharia não é feita para ter precisão, mas para neutralizar grandes áreas. O uso de fósforo por artilharia sobre uma área urbana é ainda mais grave e irresponsável, pois pode cair em qualquer lugar."
Uma das duas escolas da UNRWA (agência humanitária da ONU para refugiados palestinos) atingidas pelos bombardeios, em Beit Lahyia, teve uma sala queimada por fósforo, segundo os funcionários. A reportagem também viu uma casa incendiada em Twam.
O projétil não explode com o impacto, mas o "timer" detona um incêndio, alimentado pelo oxigênio. A maneira de apagar o fogo, ao menos provisoriamente, é cobrir de areia o material. O que sobra forma uma massa negra, esponjosa e oleosa.
Ontem, o Ministério da Saúde de Gaza, território governado pelo Hamas, montava uma tenda no pátio do Hospital Shifa, expondo fotos de feridos e pedaços de morteiros e bombas detonados. Sob o título de "Crimes evidentes de Israel contra nossos civis", uma parte era destinada a "fósforo incendiário", com peças detonadas.
O projétil se distingue dos demais pela cor verde clara e por ser oco. Pesa cerca de 30 kg, e com a velocidade do lançamento é capaz de atravessar o telhado e perfurar dois andares de uma casa. Diferentemente de outras peças de artilharia, não se fragmenta muito.


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