São Paulo, sábado, 29 de março de 2008

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Campo aceita trégua de Cristina

Entidades agrárias suspendem locaute para reabrir diálogo com o governo, como presidente pedira

Paralização na Argentina durou 16 dias e levou a falta de alimentos e panelaços nas ruas de Buenos Aires; negociação começou ontem

ADRIANA KÜCHLER
DE BUENOS AIRES

Os produtores agropecuários argentinos decidiram ontem interromper temporariamente o locaute que já durava 16 dias para iniciar as negociações com o governo. Logo após o anúncio, à noite, dirigentes rurais se reuniram com representantes do governo para negociar soluções para o setor -até o fechamento desta edição, eles ainda estavam reunidos.
"O diálogo exige esforços", anunciou comunicado das quatro principais entidades agropecuárias, que suspendeu os bloqueios de diferentes estradas do país. A ação impedia a passagem de caminhões com alimentos, promovendo o desabastecimento nas cidades.
Os produtores, que decretaram o locaute como reação ao aumento de impostos sobre a exportação de grãos pelo governo, avisaram que manteriam "o estado de alerta e mobilização à beira das estradas".
A decisão ocorreu um dia após a presidente da Argentina, Cristina Fernández de Kirchner, ter pedido em discurso aos produtores que interrompessem o locaute para que o diálogo pudesse ser retomado.
O efeito foi o contrário do que teve o discurso anterior de Cristina, na terça, quando ela acusou os agropecuaristas de fazerem "piquetes da abundância". A declaração levou a panelaços da classe média, que tomaram as ruas de Buenos Aires durante três noites. Houve conflitos entre os manifestantes e piqueteiros da base de apoio ao governo.

Negociação
Ontem à noite, os dirigentes das quatro principais entidades agropecuárias da Argentina reuniram-se com o chefe-de-gabinete de Cristina, Alberto Fernández, o ministro da Economia, Martín Lousteau, e o secretário da Agricultura, Javier de Urquiza, na Casa Rosada, sede do governo. Cristina manteve os compromissos que já tinha em sua agenda.
Na reunião, o governo ofereceria propostas como compensações de 1,5 bilhão de pesos (R$ 820 milhões) para os pequenos produtores, um teto para as chamadas retenções móveis (nas quais o imposto aumenta quando preço do produto no mercado externo sobe) e a criação de um organismo estatal voltado para os pequenos e médios produtores.
Na manhã de ontem, o vice-presidente, Julio Cobos, fez a primeira autocrítica do governo diante da crise. "Talvez tenha faltado uma melhor explicação do porquê, dos benefícios", disse Cobos em relação à divulgação do aumento de impostos que provocou o locaute.
Ainda ontem, o ministro do Interior, Florencio Randazzo, afirmou que o aumento de impostos deveria ser seguido pelo anúncio de outro pacote de medidas que "não teve tempo de ser anunciado".
Ontem, apesar da liberação de parte dos caminhões que estavam presos nas estradas e levavam alimentos, o desabastecimento nas cidades se intensificou. Além de carne, frango e leite, que sumiram dos mercados nos últimos dias, começaram a faltar também verduras, azeite, açúcar e polenta.
Segundo o vice-presidente, após a liberação das estradas, a situação do abastecimento deveria se normalizar em 48 horas. Enquanto isso, sugeriu à população encontrar "substitutos" para os produtos faltantes.
Após a liberação de parte das estradas, o mercado central de Buenos Aires, que abastece estabelecimentos de toda a cidade, anunciou que abriria excepcionalmente hoje para garantir a distribuição de alimentos.
Apesar das restrições, que já atingiam o setor agropecuário desde o governo de Néstor Kirchner, o valor das exportações argentinas cresceu em fevereiro 45% em relação ao mesmo mês de 2007. O aumento se deve, principalmente, à subida do preço no mercado internacional de produtos que a Argentina exporta, como soja.


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