São Paulo, domingo, 29 de março de 1998

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

The Independent

de Londres Pobreza atinge branco sul-africano

MARY BRAID
da Cidade do Cabo

Kitty van Zyl joga mais um punhado de salsichas caseiras na frigideira. Perto do final de mais uma noite cozinhando para centenas de crianças e adultos do bairro, ela reclama amargamente em seu africâner nativo da indiferença diante da miséria humana.
"Eu pedi os restos de comida ao Kentucky Fried Chicken", diz Van Zyl, 42, voluntária de Sandrift East, um conjunto habitacional decadente da Cidade do Cabo. "Mas o gerente disse que prefere dar os restos aos favelados negros do bairro."
Na nova África do Sul, poucos foram tão afetados pelas mudanças quanto o crescente contingente de brancos pobres.
Nos velhos tempos do apartheid (regime de segregação racial), os brancos menos favorecidos e menos educados eram apadrinhados pelo Partido Nacional.
Empresas estatais, como as ferrovias e os serviços postais, operavam como criadoras de empregos. Hoje, embora os brancos ricos reclamem das transformações, suas vidas mudaram muito pouco.
Mas os que estavam nas últimas camadas da outrora privilegiada minoria branca agora sofrem por causa da escassez de empregos e dos programas de ação afirmativa criados para contrabalançar décadas de racismo.
Nas ruas, pobres brancos lutam com os negros por espaço para mendigar nos cruzamentos. E em lugares como Sandrift East, um dos últimos conjuntos habitacionais construídos exclusivamente para brancos pelo Partido Nacional, todo dia é uma batalha pela sobrevivência.
Para muitos, a refeição comunitária gratuita é a única do dia. Alguns se sentem resignados com a nova África do Sul, mas outros estão revoltados e ansiosos para apontar bodes expiatórios: "Ninguém quer empregar um homem branco hoje em dia", diz Ian Reid, 32, pai de dois filhos.
Reid afirma que nunca apoiou o regime racista, mas argumenta que o novo governo discrimina os brancos em favor dos negros.
Estatísticas sobre a pobreza branca são escassas, mas todos que trabalham com os pobres admitem que ela está crescendo. A Arca, projeto assistencial ligado a instituições religiosas, dá abrigo a cerca de mil pobres sem-teto.
Há dois anos, 40% das pessoas atendidas eram brancas. Hoje, o número dobrou. Yolande Blom, da organização de assistência Communicare, diz que os pobres brancos atraem pouca simpatia, mas vê pelo menos um sinal positivo em sua pobreza: "Alguns brancos e negros pobres se uniram na luta pela sobrevivência".


Tradução de Sérgio Malbergier


Texto Anterior | Próximo Texto | Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.