São Paulo, quarta-feira, 29 de maio de 2002

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DIPLOMACIA

Inimigos da Guerra Fria se reúnem na Itália para selar participação de Moscou em órgão criado para conter soviéticos

Rússia entra na Otan, mas sem direito a voto

DAVID E. SANGER
DO ""THE NEW YORK TIMES"

A Otan deu as boas-vindas formais à Rússia ontem, aceitando-a como participante, mas não membro votante da organização criada 53 anos atrás para conter o poder e a expansão soviéticos.
Pelo acordo assinado ontem em base militar perto de Roma -num encontro extraordinário dos líderes dos países-membros da Otan organizado para coroar a viagem de seis dias do presidente dos EUA, George W. Bush, pela Europa-, Moscou terá um papel consultivo no traçado da estratégia da aliança militar ocidental com relação à não proliferação nuclear, a administração de crises, a defesa antimísseis e o contraterrorismo.
No entanto, num sinal de que os membros da Otan ainda não estão completamente convencidos do caráter irreversível da experiência russa com a democracia e o capitalismo, Moscou não poderá participar da aliança militar central da Otan, na qual todos os membros juram proteger todos os outros contra ataques. E a Rússia tampouco terá o direito de veto sobre as decisões da Otan, nem de voto na questão da ampliação de seus membros, incluindo os planos da Otan de convidar novos países para juntar-se a ela, convite que deve ser formulado num encontro na República Tcheca, em novembro.
Bush disse ontem que ""dois antigos inimigos agora se unem como parceiros, superando 50 anos de divisões e uma década de incertezas". Segundo ele, o acordo formal selado ontem para criar o Conselho Otan-Rússia reflete o cálculo de que a cooperação com a segunda maior potência nuclear do mundo ""poderá ser mais fácil se recebermos a Rússia no Ocidente de braços abertos".
O presidente da Rússia, Vladimir Putin, que acaba de receber seu colega americano numa visita de três dias a Moscou e São Petersburgo, não ocultou o prazer que lhe proporciona a rapidez com a qual tem podido negociar tanto as reduções nucleares quanto uma posição de respeito, mesmo que não de poder, nos conselhos da Otan. ""Seria difícil superestimar o significado desse encontro", disse Putin, observando que, há alguns anos, ""teria sido simplesmente impensável" a Rússia ganhar tal papel na Otan.
Mas Putin -que, em seu primeiro encontro com Bush, há um ano, mencionou publicamente a possibilidade de a Rússia tornar-se membro pleno da Otan- também se mostrou cauteloso. ""Sendo realistas, devemos recordar que, historicamente, as relações entre a Rússia e a Aliança do Tratado do Atlântico Norte nunca foram simples e diretas", disse ele. Em seguida, destacou que, embora a Rússia não tenha sido admitida como membro pleno e que, possivelmente, nunca o seja, ""devemos manter em mente que a Declaração de Roma [assinada ontem" é só um começo".
O novo acordo entre a Rússia e a aliança toma o lugar de um acordo negociado cinco anos atrás, durante o governo Clinton, pelo qual a Rússia podia tomar parte em discussões com a Otan apenas depois que todos os seus membros tivessem chegado a um acordo sobre uma posição unificada.
Com isso, restava à Rússia apenas reagir às ações da Otan. Moscou queixou-se de que o arranjo era uma farsa e disse que os outros 19 membros da organização reconheciam que ele fazia muito pouco para refletir as preocupações e a influência russas.
Sob o novo arranjo, a Rússia participará das discussões desde o início, mas não terá direito a voto.
O secretário de Estado norte-americano, Colin L. Powell, concordou que, embora Rússia e EUA estejam reduzindo seus arsenais nucleares de maneira dramática e cooperando no quadro da Otan, cada país vai manter armas e distância suficiente para garantir sua proteção: ""Sempre teremos uma proteção contra incertezas no futuro, em nossas forças militares e nas armas nucleares."



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