São Paulo, domingo, 29 de julho de 2007

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Baixas no ministério de Abe incluem suicídios

DA REPORTAGEM LOCAL

O governo de Shinzo Abe, embora ainda tenha pouco tempo de existência, já foi marcado por baixas no alto escalão. Algumas traumáticas.
Devido a gafes e escândalos de corrupção, dois ministros se demitiram, um terceiro se suicidou e há ainda um outro na corda bamba.
Renunciaram Genichiro Sata, da Administração, por receber doações ilegais, e Fumio Kyma, da pasta da Defesa, por declarar que as bombas atômicas que os EUA lançaram sobre o Japão em 1945 foram um evento inevitável.
Também renunciou Masaari Homma, chefe da Receita Federal, que morava com a amante num apartamento funcional.
O suicida foi o ministro da Agricultura, Toshikatsu Matsuoka. Ele se matou em razão da descoberta de caixa dois em sua vida parlamentar. Seu sucessor, Norihiko Akagi, sempre apresenta duas notas fiscais com a mesma despesa, uma original e outra xerografada, segundo reportagem de anteontem no "Asahi Shimbun".
A reputação pessoal de Abe não foi atingida por nenhum desses casos. Ele foi criticado, no entanto, por não usar uma peneira ética para a seleção de seus auxiliares e por reagir invariavelmente depois de muita hesitação. Cada um desses episódios se traduziu em queda de popularidade. Só com o escândalo na Seguridade Social, ele perdeu 12 pontos.
Paradoxalmente, Shinzo Abe não teve sua imagem sensivelmente afetada por questões controversas para o público externo. Por exemplo, os primeiros passos para reformar o artigo 9 da Constituição, promulgada em novembro de 1946, ainda sob a ocupação americana, pela qual o Japão renuncia às guerras e se conforma em não constituir Forças Armadas -o país tem uma simples agência de defesa.
Para os nacionalistas, a iniciativa faz sentido, em razão do crescente rearmamento da China e das ameaças da Coréia do Norte -com a qual o Japão tem como grande litígio o seqüestro de 13 supostos "espiões japoneses", há três décadas, ainda hoje desaparecidos.
O projeto chamado de "O Belo País" procura, controvertidamente, eliminar a baixa auto-estima nacional, provocada pela consciência sobre as atrocidades cometidas durante a expansão territorial na Ásia e a Segunda Guerra Mundial.

Exército e prostituição
Shinzo Abe levou adiante uma reforma dos livros didáticos, com a supressão ou uma versão revisionista de fatos como o massacre de chineses em Nanquim (1937) ou o suicídio forçado de civis em Okinawa (1945). Entrou em atrito com o sindicato dos professores, cujos contratos passaram a ser renovados a cada dez anos.
Nada tão chocante, no entanto, quanto a visão do premiê sobre as 50 mil ou 200 mil mulheres -o número exato jamais será conhecido- que os soldados japoneses seqüestraram na China e na Coréia, durante a Segunda Guerra, para as escravizarem como prostitutas.
Abe afirmou não estar historicamente comprovado que o Exército imperial estivesse por detrás disso, maneira de dizer que as vítimas podem ter prestado seus serviços sexuais por voluntarismo desinteressado ou patriotismo pró-nipônico. Uma comissão do Congresso americano pediu que Abe se retratasse. Ele não o fez.
O premiê foi nessa questão truculento. Agiu por convicção -faz parte de seu histórico parlamentar-, mas também para agradar uma parcela da população japonesa que passou a se encantar com filmes de guerra em que os soldados locais são heróis e a sentir uma nostalgia difusa dos tempos em que a Ásia tremia ao pensar nos generais de Hiroito.
(JOÃO BATISTA NATALI)


Texto Anterior: Governo japonês deve perder eleição hoje
Próximo Texto: Biografia ácida expõe Diana dez anos após sua morte
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.