São Paulo, sexta-feira, 29 de julho de 2011

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

ANÁLISE

Impasse é alimentado por limites do bipartidarismo dos EUA

FILIPE CAMPANTE
ESPECIAL PARA A FOLHA

A explicação mais imediata para a crise política manufaturada em torno da dívida pública dos EUA passa pelo alto grau de polarização hoje existente no sistema político americano.
Os dois principais partidos tornaram-se cada vez mais bem definidos do ponto de vista ideológico, após o sucesso da revolução dos direitos civis da metade do século 20 e a consequente redução da proeminência da questão racial.
Desde 2006, e pela primeira vez na história recente, a posição do mais conservador dos democratas no Congresso tem sido medida claramente à esquerda daquela do menos conservador dos republicanos.
Assim sendo, não espanta que seja mais difícil obter consenso bipartidário. O problema é, contudo, mais profundo. Tal polarização não seria tão danosa não fosse a inadequação das bicentenárias instituições políticas do país em lidar com ela.
A separação e grande autonomia entre os Poderes Executivo e Legislativo -base essencial do sistema de freios e contrapesos que fundamenta a democracia americana- têm nesse contexto efeito colateral de paralisia. Atualmente, o Partido Republicano tem poder suficiente para bloquear a agenda do presidente Obama, refém da necessidade de aprovação de quaisquer medidas no Congresso. O partido ainda se beneficia eleitoralmente da percepção de insucesso que isso gera para o governo democrata.
Com tal influência, e sem a contra partida em responsabilidade, o incentivo da oposição é o de fazer uso de sua capacidade de provocar o fracasso do governo.
Trata-se de óbvia receita para radicalização e crises. Em contraste, se o que um partido propõe pode ser de fato implementado caso ele conquiste o poder, impõe-se pela via eleitoral um incentivo à moderação.
As reformas ocorrem via alternância de poder, em torno de políticas relativamente consensuais. Não há sistema político perfeito, claro, e o sucesso da democracia americana ao longo dos séculos é evidente.
Porém tempos distintos trazem problemas distintos, e as respostas que cada sistema oferece podem ser mais adequadas ou menos. Dado o apego visceral dos EUA à herança dos "pais fundadores", é de se esperar que crises como a atual tornem-se cada vez mais comuns, até que o cenário mude ou reformas façam-se inevitáveis.

FILIPE CAMPANTE é professor-assistente de políticas públicas da Universidade Harvard


Texto Anterior: Mercado e governo se preparam para calote americano
Próximo Texto: Bancos franceses aderem ao pacote grego
Índice | Comunicar Erros



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.