|
Próximo Texto | Índice
SUCESSÃO NOS EUA / MAIS FEIJÃO, MENOS SONHO
Oito anos bastam, diz Obama a multidão
Em discurso de aceitação da candidatura, democrata ataca Bush e McCain, foca na economia e acena à classe média
Candidato reduz lirismo de sua oratória e detalha propostas ao prometer renovar "sonho americano" de ascensão pelo trabalho
SÉRGIO DÁVILA
ENVIADO ESPECIAL A DENVER
Quarenta e cinco anos depois
de Martin Luther King dizer
que tinha um sonho, o senador
Barack Obama, primeiro candidato negro à Presidência por
um partido majoritário na história dos EUA, arrancou o
aplauso de 80 mil pessoas ao
aceitar a indicação do Partido
Democrata falando duro e alto
sobre como realizar esse sonho,
que ele rebatizou de "Promessa
Americana".
No discurso, esse havaiano
de 47 anos, filho de um queniano criado na tradição muçulmana e uma branca do Kansas,
afirmou: "Nesta noite, digo ao
povo americano, aos democratas e republicanos e independentes por esta grande terra:
Chega! Este momento -esta
eleição-é nossa chance de
manter, no século 21, a promessa americana viva".
Por 45 minutos, interrompidos por gritos de "Sim, nós podemos!" e batidas de 160 mil
pés no chão -a maioria de
brancos-, Obama foi menos lírico e mais direto do que as falas que o projetaram: "Essa é a
mudança de que precisamos já.
Por isso, deixe-me explicar exatamente o que ela significará se
eu for o presidente".
E Obama explicou. Atacou
duramente os dois mandatos
de George W. Bush, e repisou a
ligação do presidente republicano impopular com o candidato do partido da situação, John
McCain: "América, nós somos
melhores do que estes últimos
oito anos. Nós somos um país
melhor do que isso".
Referiu-se à convenção republicana, que começa na segunda e sagrará McCain como candidato. "O mesmo partido que
deu a vocês dois mandatos de
George Bush e Dick Cheney pedirá a este país um terceiro. E
nós estamos aqui porque amamos este país demais para deixar que os próximos quatro
anos se pareçam com os últimos oito. Em 4 de novembro,
precisamos nos erguer e dizer:
"Oito anos bastam"."
Ataque a McCain
Obama elogiou o passado de
herói de guerra do oponente:
"Que não haja dúvida. John
McCain, usou o uniforme de
nosso país com coragem e distinção, e por isso nós lhe devemos gratidão e respeito".
Mas a ligação estava feita e
seria repetida. "John McCain
votou com George Bush 90%
das vezes. O senador McCain
gosta de falar sobre discernimento, mas na verdade o que
dizer sobre seu discernimento
quando você acha que George
Bush estava certo 90% das vezes? Eu não sei quanto a vocês,
mas eu não estou pronto para
aceitar uma chance de mudar
de apenas 10%", afirmou.
Reconheceu os problemas
econômicos por que passam os
EUA e ofereceu soluções explícitas para a classe média do país
-explícitas, embora de viabilidade duvidosa. "Cortarei os impostos de 95% das famílias. Numa economia como esta, a última coisa a fazer era elevar os
impostos da classe média."
Em resposta ao que tem sido
uma das peças fundamentais
da campanha de McCain, a suposta tibieza dos democratas
em assuntos de segurança nacional, afirmou: "Nós somos o
partido de [Franklin] Roosevelt, de [John] Kennedy, então
não me digam que os democratas não vão defender este país."
Respondeu às críticas de que
não estava pronto para liderar,
e criticou indiretamente a condução da Guerra do Iraque.
"Como comandante-em-chefe,
nunca hesitarei em defender
esta nação", afirmou.
Disse ainda que acabaria com
aquele conflito "responsavelmente" e terminaria a luta contra a Al Qaeda e o Taleban no
Afeganistão. "John McCain
gosta de dizer que vai seguir
Bin Laden aos portais do inferno, mas não foi nem à caverna
onde ele vive. Você não contém
o Irã e protege Israel só falando
duro em Washington."
Prometeu encerrar a dependência dos EUA do petróleo do
Oriente Médio "em dez anos".
Não é pouca coisa, quando menos porque a Constituição do
país permite a um presidente
dois mandatos de no total oito
anos -e Barack Obama ainda
nem foi eleito.
Citaria no final o discurso de
Martin Luther King, ao repetir:
"América, não podemos retroceder". Ainda assim, o que se
viu na noite de encerramento
da mais importante convenção
democrata dos últimos anos foi
um Obama mais assertivo e
menos generalista, mais crítico
e menos messiânico. Mais feijão e menos sonho, como havia
pedido seu partido.
NA INTERNET
www.folha.com.br/082416
Leia íntegra dos discursos
de Obama, Clinton e Biden
Próximo Texto: Frase Índice
|