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Senado dá a Bush poder de definir tortura
Após promover nova lei, Bush promete sancioná-la hoje; emenda que garantia habeas corpus a detidos foi derrubada
SÉRGIO DÁVILA
DE WASHINGTON
Às 19h04 locais de ontem
(20h04 de Brasília), o Senado
americano concedeu ao presidente o poder de mandar prender quem ele definir que é um
"combatente inimigo", por
quanto tempo julgar necessário
e sem que a pessoa tenha sido
acusada formalmente ou possa
contestar a prisão no tribunal.
Desde ontem, cabe ao líder
do Executivo definir, secretamente se quiser, quais procedimentos poderão ser usados no
interrogatório de presos militares, desde que aqueles não causem danos físicos "sérios" ou
problemas psicológicos "permanentes" nos interrogados.
Esse é o teor do Ato das Comissões Militares de 2006
-também conhecido como Lei
3.930 ou Lei dos Detentos e
apelidado de "lei da tortura"
por parte da oposição democrata e por grupos de defesa de direitos civis-, que concede ao
presidente americano poderes
inéditos na história do país (veja quadro ao lado).
A lei, virtualmente idêntica à
aprovada anteontem pela Câmara dos Representantes (deputados federais) por 253 a 168,
deve passar por votação simbólica naquela Casa hoje e chegar
à mesa do republicano George
W. Bush, que promete assiná-la
no final do dia. Depois disso, estará vulnerável apenas a decisões da Suprema Corte.
Pelo ato, aprovado por 65 votos a 34, são criados tribunais
militares de exceção, nos quais
suspeitos de terrorismo serão
processados segundo legislação
própria, e não de acordo com a
Constituição americana, com
provas às quais nem sempre terão acesso e com confissões que
podem ter sido obtidas sem que
as Convenções de Genebra sobre os direitos dos prisioneiros
tenham sido seguidas.
"Essa lei é um drástico passo
atrás para os direitos humanos", escreveu à Folha por e-mail Caroline Fredrickson, diretora da American Civil Liberties Union (ACLU), uma das
principais entidades de direitos civis dos EUA. "Uma mudança tão dramática, que rompe com uma longa tradição de
valores americanos, merecia
mais do que duas tardes seguidas de debate apressado no
chão da Câmara e do Senado."
Importantes senadores democratas votaram a favor da
lei. "Americanos no futuro não
se lembrarão dos argumentos
pragmáticos para ceder ao governo", escreveu o "New York
Times" em editorial. "Eles saberão que, em 2006, o Congresso passou uma lei tirânica."
"O objetivo é levar justiça aos
terroristas, mesmo que eles
não sejam justos conosco", disse o senador Lindsey Graham
(Carolina do Sul). Para o republicano, o ato cria um sistema
de tratar os detentos do qual os
EUA "podem se orgulhar".
Sem habeas corpus
Antes da aprovação na noite
de ontem, o Senado americano
havia rejeitado pela manhã, em
votação apertada (51 a 48), uma
emenda que dava aos detentos
militares o direito de habeas
corpus, ou seja, de contestar
sua prisão no tribunal.
A aprovação rápida se deve às
eleições de 7 de novembro, que
renovarão parte do Legislativo
dos EUA. A partir dessa data, só
questões de menor importância deverão ser tratadas pelo
109º Congresso, que se retira
em 31 de dezembro. O esforço
dos republicanos para que a lei
passasse antes disso e o fato de
parte dos democratas terem
dado o quórum necessário se
devem igualmente às urnas.
Há semanas, candidatos do
partido do governo vêm acusando em anúncios eleitorais
os democratas de serem "fracos" na chamada "guerra ao
terror". O próprio presidente
Bush visitou algumas vezes o
Senado para fazer pressão pela
aprovação da lei. Uma rebelião
da oposição, que é minoria, para reverter a votação de ontem
poderia custar vagas preciosas
na disputa de novembro, que
poderá dar o comando do Congresso aos democratas pela primeira vez desde 1992.
Mas a preocupação da Casa
Branca também se deve às cortes. Em junho, decisão da Suprema Corte considerou ilegais
os tribunais militares de exceção e decidiu que mesmo os
suspeitos de terem praticado
atos de terrorismo detidos pelos EUA devem ser tratados segundo as Convenções de Genebra. A decisão levou Bush e seu
staff a prepararem uma lei que
tornasse tais práticas legais. Essa foi a lei aprovada ontem.
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