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Em encontro presenciado pela Folha, Arafat estava entusiasmado
FABIO ZANINI
FREE LANCE PARA A FOLHA
Em 6 de agosto, menos de três
meses antes de sua crise de saúde,
Iasser Arafat recebeu um grupo
de cerca de 70 visitantes, metade
estrangeiros e metade palestinos,
para uma conversa de uma hora e
meia no que ele descreveu como
sua "prisão", em Ramallah.
Bem-humorado e bem disposto, contou piadas, distribuiu fotos
e autógrafos. Mas também falou
em tom solene sobre a própria
morte. "Sinto uma certa culpa,
uma certa vergonha por estar vivo, quando tantos companheiros
perderam a vida ao longo dos
anos e tantos palestinos continuam a ser assassinados diariamente", afirmou na reunião, presenciada pelo repórter da Folha,
que acompanhava uma ONG britânica que agendou o encontro.
Nada na aparência de Arafat sugeria que menos de três meses depois ele estaria à beira da morte.
Ao entrar na sala lotada, cumprimentou um a um os visitantes: os
homens com um aperto de mão,
as mulheres com um beijo na
mão. O ritual demorou 15 minutos. Arafat mostrava um leve tremor no lábio inferior, mas seu
aperto de mão era firme.
O encontro deveria durar 30 minutos. Durou o triplo disso, avançando ate perto das 21h30, em
grande parte por causa do líder
palestino, entusiasmado.
Após as formalidades, Arafat
iniciou um verborrágico discurso
contra a ocupação israelense, falando sem parar por mais de meia
hora. Atacou o "genocídio" contra o povo palestino. Falou da
"humilhação" durante décadas.
Defendeu-se da acusação de ter
rejeitado uma generosa proposta
israelense em 2001, dizendo que
tal oferta nunca foi feita.
E disse ter certeza de que voltaria a rezar no Domo da Rocha, local sagrado para os muçulmanos
em Jerusalém, que seria capital de
um futuro Estado palestino.
Arafat falava em inglês fluente,
mas às vezes pedia ajuda a dois assessores sentados a seu lado com
alguma palavra mais difícil. Policiais palestinos guardavam a sala
e a entrada do prédio, semidestruído por bombardeios israelenses em 2002. Na parede, havia
uma enorme foto de Jerusalém
oriental. O líder havia completado
75 anos dois dias antes.
Mostrou um cartão de parabéns
que recebeu de simpatizantes europeus. Nele, uma charge mostrava a imagem bíblica dos três reis
magos perseguindo a estrela de
Belém, mas, com o caminho bloqueado pelo muro que os israelenses constroem junto aos territórios palestinos (Belém, local onde, segundo a tradição, nasceu Jesus, fica na Cisjordânia). Arafat
fez o cartão rodar entre os visitantes e caiu na gargalhada.
No final, teve ânimo para tirar
fotos individualmente com cada
um. Mas antes respondeu à última pergunta: até quando ele pretendia liderar os palestinos? Não
seria hora de nomear um sucessor? Na reposta, nova referência à
sua morte: "Serei presidente até o
dia que Deus me chamar".
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