São Paulo, quarta-feira, 29 de novembro de 2000

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IMPASSE NO IMPÉRIO
Democrata volta à TV, propõe que todos os votos da Flórida sejam recontados até o dia 6 e diz não ligar para pesquisas
Gore pede recontagem em uma semana

MARCIO AITH
DE WASHINGTON

O candidato democrata à Presidência dos EUA, Al Gore, disse ontem que propôs à Justiça da Flórida uma recontagem total dos votos da Flórida, no prazo de uma semana, a contar de hoje.
"Deixem-me repetir o essencial de nossa proposta: sete dias, a partir de amanhã (hoje), para realizar uma contagem completa e exata de todos os votos", disse o vice-presidente.
Em seu segundo pronunciamento em dois dias, Gore reiterou que "todos os votos devem ser levados em conta", o que já se tornou o slogan democrata na batalha legal para saber quem será o sucessor de Bill Clinton.
Ao ir novamente à TV, Gore tentou convencer uma opinião pública cada vez mais impaciente com sua insistência em brigar pela vitória nas eleições realizadas em 7 de novembro.
Segundo Gore, recontar manualmente todos os votos na Flórida "é necessário para que não existam dúvidas sobre a legitimidade de quem ganhou as eleições." Ele mesmo emendou que os republicanos já haviam recusado sua proposta.
Anteontem, Gore disse que concluir as eleições sem recontar os votos duvidosos traria grande risco ao novo presidente, já que "algum professor, usando lei que garante livre acesso à informação, poderia descobrir, três ou quatro meses depois da posse, que o resultado real não foi o oficial".
Com a disputa pós-eleitoral entrando em sua quarta semana, os advogados de Gore pediram à Justiça da Flórida ontem que ordene uma retomada imediata da contagem manual de votos nos condados de Miami-Dade e Palm Beach e que as ações sobre a eleição sejam julgadas com urgência.
Gore disse ontem que não se importa com as pesquisas de opinião indicando que cerca de 60% dos norte-americanos querem que ele desista e reconheça a vitória de seu adversário republicano, George W. Bush, declarado, no último domingo, o vencedor oficial das eleições na Flórida com uma vantagem de 537 votos num universo de quase 6 milhões.
"Já dizia antes das eleições que as pesquisas não importam. Contrariamente ao que elas diziam, ganhamos no voto popular no país por uma diferença de 300 mil votos. Agora, novamente, pesquisas não importam. É uma questão legal", disse ele em Washington.
O resultado na Flórida definirá o próximo presidente dos EUA. Os dois candidatos precisam dos 25 delegados do Estado para atingir a maioria de 270 necessária para vencer no Colégio Eleitoral. Se a vitória de Bush no Estado for mantida pela Justiça, o republicano teria 271 votos. Gore teria 267.
A decisão do democrata de falar à nação pelo segundo dia seguido foi vista por analistas como um sintoma de nervosismo do candidato, que estaria vendo suas chances reduzidas a cada dia.
Gore moveu na segunda-feira uma ação numa corte na Flórida para contestar o resultado das eleições no Estado sob o argumento de que mais milhares de cédulas nunca foram contadas porque as máquinas de apuração não teriam sido capazes de identificar a intenção do eleitor.
Gore pede ainda que sejam computados, no resultado oficial da Flórida, os votos recontados manualmente nos condados de Palm Beach e Miami-Dade, desprezados pela secretária de Estado da Flórida, a republicana Katherine Harris. O candidato também contesta a decisão do condado de Nassau de desprezar uma segunda contagem mecânica, o que lhe tirou 52 votos.
Mas o espaço de manobra de Gore diminui a cada dia. Seu problema é que ninguém acredita ser possível que todos os pedidos de Gore sejam debatidos, aprovados e executados até o dia 12 de dezembro, prazo que a Flórida tem para indicar seus 25 delegados ao Colégio Eleitoral, que escolherá o presidente no dia 18. O eleito toma posse em 20 de janeiro.
Além dos candidatos democrata e republicano, a ação movida por Gore tem outras seis partes envolvidas (incluindo o governo da Flórida, os condados e eleitores), peritos e testemunhas.
O juiz, ligado a republicanos, aceitou incluir no processo como partes interessadas grupos de eleitores que, segundo os democratas, tornarão o processo ainda mais demorado.
Para complicar, o Legislativo (de maioria republicana) e o governador da Flórida, Jeb Bush (irmão do candidato republicano), estudam aprovar lei decretando a vitória de Bush. Isso causaria novo impasse, com o Estado enviando dois grupos de delegados ao Colégio Eleitoral. Um saído de ação legal vitoriosa de Gore e outro apontado pelo governo e pelo Legislativo da Flórida. Caberia então ao Congresso, muito dividido, decidir quais delegados aceitar.
O caso também pode passar à esfera federal. A Suprema Corte dos EUA ouve argumentos dos dois lados na sexta para decidir se aceita julgar ação republicana contra a recontagem manual.
Apesar de ter se declarado eleito no domingo, Bush ainda não nomeou seu gabinete, apenas o chefe de Gabinete. E anunciou ontem que está aumentando a sua equipe de advogados.


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