São Paulo, quarta-feira, 30 de janeiro de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Ex-líder, Giuliani colhe raspas de estratégia arriscada

SÉRGIO DÁVILA
ENVIADO ESPECIAL A POMPANO BEACH (FLÓRIDA)

Cabeça baixa, calva brilhante, calça de terno escura, camisa azul clara e gravata vermelha riscada, Rudolph Giuliani entra na suíte 430 do escritório de sua campanha em Pompano Beach, um reduto de imigrantes latinos (muitos brasileiros) 66 km ao norte de Miami, na Flórida. Nas mesas, oito voluntários usam telefones para pedir votos de última hora para o ex-prefeito de Nova York.
Antes de notar a presença do pré-candidato, um deles fala em espanhol para um eleitor registrado escolhido de uma lista de números de republicanos hispânicos: "Buenos dias, señor! Rudolph Giuliani vai falar. Gracias!" E solta a gravação em que o republicano vende seu peixe conservador.
Nas paredes, estão pregados cartazes com frases do pré-candidato de 65 anos, como "Em 2000, você nos livrou de Al Gore. Em 2004, de John Kerry. Por favor, Flórida, livre-nos de Hillary Clinton em 2008" e "Líderes devem ser otimistas."A julgar pelos resultados de ontem e pela aparência desanimada do republicano antes mesmo de ele sair, o pedido e o conselho foram ignorados.
Apuradas 81% das seções eleitorais até o fechamento desta edição, Giuliani tinha 15% dos votos -depois de passar os últimos cinco meses com média de 15 pontos percentuais acima do segundo colocado nas pesquisas entre eleitores republicanos na Flórida-, um amargo terceiro lugar.

Riso forçado
Nacionalmente, sua situação era ainda pior, atrás não só do senador John McCain e do ex-governador Mitt Romney como do ex-pastor sulista Mike Huckabee, segundo as pesquisas. "Estou entusiasmado", disse o político aos repórteres que o acompanhavam no périplo de ontem, que começou às 8h numa lanchonete em Miami, a risada forçada denunciando o contrário. "Não me influencio por pesquisas."
Segundo o ex-prefeito, "elas erraram feio em New Hampshire, quando diziam que Hillary perderia de Obama por nove pontos". No final, a democrata ganhou por 2,6 pontos percentuais as primárias daquele Estado, no dia 8. "Estamos confiantes nos votos antecipados." O mantra era repetido pelos assessores que acompanhavam o político.
Ontem, o "Rudy Bus" cruzava as ruas do sul da Flórida sem chamar a atenção dos locais, apesar do gigante slogan gravado nas laterais e atrás: "Flórida é território de Giuliani. Testado. Pronto. Agora". Segundo os cálculos dos assessores de Giuliani, aposentados e veteranos militares, ambos eleitores que teriam afinidade com Giuliani, costumam votar antes, o que é permitido pela lei local.
A tese é parcialmente correta. Realmente, 17% dos eleitores daqui são aposentados, ante 12% da média nacional. Em 2006, 90 mil nova-iorquinos se mudaram para a Flórida. Mas pesquisa da semana passada do instituto SurveyUSA deu a John McCain 38% dos votos desse universo.

11 de Setembro
O resultado pode levar Giuliani a desistir da candidatura já na manhã de hoje, como chegou a sugerir na segunda-feira, embora ontem tenha voltado atrás. Nesse caso, entrará para a história como o autor de uma das piores estratégias políticas da memória recente dos EUA.
Nos dias que se seguiram o ataque de 11 de Setembro, em 2001, o então prefeito de Nova York estava com a popularidade no teto. O então presidente francês Jacques Chirac chamou-o de "prefeito do mundo".
Nos anos seguintes, depois de deixar a contragosto o comando de Nova York (chegou a articular uma mudança na lei para ser eleito para o terceiro mandato), Giuliani aposentou a peruca que cobria parte do cocuruto e passou a ganhar dinheiro com palestras. Quando lançou a pré-candidatura à Presidência, passou a liderar a corrida republicana quase imediatamente.
Ele decidiu concentrar seus esforços e o dinheiro arrecadado em grandes Estados, a começar pela Flórida. Passou aqui 40 dias e visitou 92 destinos, ante 17 dias e 34 destinos de John McCain. Com isso, ignorou virtualmente o começo da corrida eleitoral em Iowa, New Hampshire, Michigan, Nevada e Carolina do Sul.
"Foi um erro", disse Lance de Haven-Smith, professor de política da Universidade Estadual da Flórida, para quem o político poderia ser vítima do comportamento de manada de eleitores que preferem votar sempre no vencedor. "Somos um Estado muito influenciado pela mídia, e os eleitores só ouvem ultimamente como Giuliani perdeu em todos os lugares."
Para o brasileiro Wilson Roberto Alves, analista legal do Brazilian Help Center, em Pompano Beach, o problema de Giuliani é outro. "Nessas eleições, os imigrantes e suas famílias não votarão em republicanos, independentemente de quem sejam", disse à Folha. "Com suas leis antiimigração, eles são os responsáveis pelo atual êxodo brasileiro."
De volta à sala da campanha, Javier Manjares acaba de entregar seu celular para Giuliani, depois de dizer à namorada, Lisa, do outro lado da linha: "Você não vai acreditar quem está aqui comigo!" "Lisa, eu preciso de seu voto", diz o ex-prefeito, automaticamente.


Texto Anterior: McCain vence disputa acirrada na Flórida
Próximo Texto: Pai de Angelina Jolie pede voto para ex-prefeito
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.