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Ex-líder, Giuliani colhe raspas de estratégia arriscada
SÉRGIO DÁVILA
ENVIADO ESPECIAL A POMPANO BEACH
(FLÓRIDA)
Cabeça baixa, calva brilhante, calça de terno escura, camisa azul clara e gravata vermelha
riscada, Rudolph Giuliani entra
na suíte 430 do escritório de
sua campanha em Pompano
Beach, um reduto de imigrantes latinos (muitos brasileiros)
66 km ao norte de Miami, na
Flórida. Nas mesas, oito voluntários usam telefones para pedir votos de última hora para o
ex-prefeito de Nova York.
Antes de notar a presença do
pré-candidato, um deles fala
em espanhol para um eleitor
registrado escolhido de uma
lista de números de republicanos hispânicos: "Buenos dias,
señor! Rudolph Giuliani vai falar. Gracias!" E solta a gravação
em que o republicano vende
seu peixe conservador.
Nas paredes, estão pregados
cartazes com frases do pré-candidato de 65 anos, como "Em
2000, você nos livrou de Al Gore. Em 2004, de John Kerry.
Por favor, Flórida, livre-nos de
Hillary Clinton em 2008" e "Líderes devem ser otimistas."A
julgar pelos resultados de ontem e pela aparência desanimada do republicano antes mesmo de ele sair, o pedido e o conselho foram ignorados.
Apuradas 81% das seções
eleitorais até o fechamento
desta edição, Giuliani tinha
15% dos votos -depois de passar os últimos cinco meses com
média de 15 pontos percentuais
acima do segundo colocado nas
pesquisas entre eleitores republicanos na Flórida-, um
amargo terceiro lugar.
Riso forçado
Nacionalmente, sua situação
era ainda pior, atrás não só do
senador John McCain e do ex-governador Mitt Romney como do ex-pastor sulista Mike
Huckabee, segundo as pesquisas. "Estou entusiasmado", disse o político aos repórteres que
o acompanhavam no périplo de
ontem, que começou às 8h numa lanchonete em Miami, a risada forçada denunciando o
contrário. "Não me influencio
por pesquisas."
Segundo o ex-prefeito, "elas
erraram feio em New Hampshire, quando diziam que Hillary perderia de Obama por
nove pontos". No final, a democrata ganhou por 2,6 pontos
percentuais as primárias daquele Estado, no dia 8. "Estamos confiantes nos votos antecipados." O mantra era repetido pelos assessores que acompanhavam o político.
Ontem, o "Rudy Bus" cruzava as ruas do sul da Flórida sem
chamar a atenção dos locais,
apesar do gigante slogan gravado nas laterais e atrás: "Flórida
é território de Giuliani. Testado. Pronto. Agora". Segundo os
cálculos dos assessores de Giuliani, aposentados e veteranos
militares, ambos eleitores que
teriam afinidade com Giuliani,
costumam votar antes, o que é
permitido pela lei local.
A tese é parcialmente correta. Realmente, 17% dos eleitores daqui são aposentados, ante
12% da média nacional. Em
2006, 90 mil nova-iorquinos se
mudaram para a Flórida. Mas
pesquisa da semana passada do
instituto SurveyUSA deu a
John McCain 38% dos votos
desse universo.
11 de Setembro
O resultado pode levar Giuliani a desistir da candidatura já
na manhã de hoje, como chegou a sugerir na segunda-feira,
embora ontem tenha voltado
atrás. Nesse caso, entrará para
a história como o autor de uma
das piores estratégias políticas
da memória recente dos EUA.
Nos dias que se seguiram o
ataque de 11 de Setembro, em
2001, o então prefeito de Nova
York estava com a popularidade no teto. O então presidente
francês Jacques Chirac chamou-o de "prefeito do mundo".
Nos anos seguintes, depois
de deixar a contragosto o comando de Nova York (chegou a
articular uma mudança na lei
para ser eleito para o terceiro
mandato), Giuliani aposentou
a peruca que cobria parte do cocuruto e passou a ganhar dinheiro com palestras. Quando
lançou a pré-candidatura à Presidência, passou a liderar a corrida republicana quase imediatamente.
Ele decidiu concentrar seus
esforços e o dinheiro arrecadado em grandes Estados, a começar pela Flórida. Passou
aqui 40 dias e visitou 92 destinos, ante 17 dias e 34 destinos
de John McCain. Com isso, ignorou virtualmente o começo
da corrida eleitoral em Iowa,
New Hampshire, Michigan,
Nevada e Carolina do Sul.
"Foi um erro", disse Lance de
Haven-Smith, professor de política da Universidade Estadual
da Flórida, para quem o político poderia ser vítima do comportamento de manada de eleitores que preferem votar sempre no vencedor. "Somos um
Estado muito influenciado pela
mídia, e os eleitores só ouvem
ultimamente como Giuliani
perdeu em todos os lugares."
Para o brasileiro Wilson Roberto Alves, analista legal do
Brazilian Help Center, em
Pompano Beach, o problema de
Giuliani é outro. "Nessas eleições, os imigrantes e suas famílias não votarão em republicanos, independentemente de
quem sejam", disse à Folha.
"Com suas leis antiimigração,
eles são os responsáveis pelo
atual êxodo brasileiro."
De volta à sala da campanha,
Javier Manjares acaba de entregar seu celular para Giuliani,
depois de dizer à namorada, Lisa, do outro lado da linha: "Você não vai acreditar quem está
aqui comigo!" "Lisa, eu preciso
de seu voto", diz o ex-prefeito,
automaticamente.
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