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DIPLOMACIA
Para comissão, secretário-geral não favoreceu empresa em que filho trabalhava com recursos de programa da ONU
Relatório isenta Annan de corrupção
PEDRO DIAS LEITE
DE NOVA YORK
O mais novo relatório preliminar da comissão independente
que investiga desvio de recursos
do Programa Petróleo por Comida no Iraque livrou Kofi Annan
de acusações de ter favorecido a
contratação da empresa suíça que
empregava seu filho, Kojo.
O relatório, porém, criticou a
atuação do secretário-geral da
ONU no caso. Segundo o texto,
divulgado ontem, Annan errou ao
não determinar que as Nações
Unidas investigassem o contrato
com a empresa Cotecna depois
que surgiram as primeiras denúncias contra a companhia e de envolvimento do filho no escândalo.
Para a comissão, chefiada pelo
ex-presidente do Fed (banco central dos EUA) Paul Volcker, o
contrato não teria sido renovado
por várias vezes se tivesse havido
continuidade nas investigações.
Ontem, Kofi Annan afirmou
que o relatório que o isenta de irregularidades trouxe um "grande
alívio", depois "de tantas acusações falsas". Ele lamentou, no entanto, que Kojo não tenha colaborado e disse que está "profundamente chateado" com o filho.
Em entrevista ontem à TV
CNN, Kojo disse: "Lamento qualquer problema que possa ter causado a meu pai. Sou um homem
de negócios independente".
A história que abalou a credibilidade de Kofi Annan e da própria
ONU começou no final de 1998,
quando as Nações Unidas contrataram a empresa suíça Cotecna
para fiscalizar o programa Petróleo por Comida. Iniciado em 1996,
o programa permitia ao Iraque
vender petróleo se o dinheiro fosse usado para a compra de alimentos, medicamentos e outras
necessidades básicas.
A Cotecna já tentara duas vezes
participar do programa. Em 1992,
venceu a concorrência, mas o
projeto foi interrompido. Em
1996, perdeu. No segundo semestre de 1998, houve nova disputa
pelo contrato, desta feita vencida
pela empresa.
O programa durou até novembro de 2003 e movimentou em
torno de US$ 64 bilhões. Um relatório do Congresso dos EUA estimou que US$ 21 bilhões tenham
sido desviados.
Havia duas sombras sobre o
contrato com a Cotecna.
Em primeiro lugar, a empresa
tinha como empregado, desde
1995, Kojo Annan, contratado então aos 22 anos. O filho de Annan
foi empregado da empresa até
1997, mas em 1998, ano da concorrência vencida pela Cotecna,
era seu consultor. Além disso, esteve em Nova York por 15 dias na
época mais intensa das negociações, o que ajudou a levantar as
suspeitas contra seu pai.
Kojo recebeu dinheiro da empresa no mínimo até março do
ano passado. Há quase US$ 200
mil confirmados, mas o valor deve chegar a US$ 500 mil. Apesar
de negativas de Kojo, o pagamento foi feito por outras empresas do
mesmo dono da Cotecna, numa
tentativa de driblar investigações.
O argumento de Annan -acatado pela comissão independente- foi o de que seu filho mentiu
para ele sobre suas relações com a
empresa. O relatório diz que não
há provas de que o secretário-geral soubesse da concorrência vencida pela Cotecna nem de que tenha interferido no processo.
O outro fato negativo que pesa
sobre a Cotecna -ponto em que
a comissão critica diretamente
Annan- diz respeito a uma acusação anterior, sem relação com
as Nações Unidas.
Investigações apontaram que a
Cotecna pagou milhões de dólares à ex-premiê paquistanesa Benazir Butho para que fosse mantido um contrato milionário com o
país. Butho acabou condenada
pela Justiça, mas a ONU sempre
renovou o contrato com Cotecna,
que vigorou até o fim de 2003,
quando o programa acabou.
Após a divulgação do relatório,
questionado se pretendia renunciar ao cargo, como alguns congressistas americanos sugerem,
Annan respondeu: "Nem pensar!".
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