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RELIGIÃO
Muçulmanos poderão recorrer a um corpo de imãs em questões como divórcio, desde que a sentença não viole a Constituição
Canadá vai permitir uso da lei islâmica
DAVID USBORNE
DO "INDEPENDENT"
O Canadá está lançando um experimento judicial incomum que
vai permitir que muçulmanos do
país se submetam às regras do Alcorão para resolver várias questões judiciais, desde divórcios até
disputas de negócios.
O novo modelo, que será estudado de perto por outros países
ocidentais com crescentes comunidades muçulmanas, será administrado por um corpo de imãs e
estudiosos islâmicos chamado o
Instituto Islâmico de Justiça, criado no final do ano passado.
A aplicação das decisões judiciais ficará a cargo dos tribunais
regulares do Canadá.
Muitos dos 600 mil muçulmanos canadenses aplaudem a oportunidade de resolverem suas diferenças dentro dos preceitos da lei
islâmica.
Conhecida como lei da sharia,
ela é tirada das páginas do Alcorão e dos ensinamentos do profeta Muhammad. A maioria dos
muçulmanos acredita que o Alcorão trace diretrizes divinas em
matéria de comportamento social, incluindo as questões relativas ao casamento e aos negócios.
Apedrejamento
Espera-se, além disso, que, se
um número significativo de muçulmanos concordar em resolver
suas disputas diante dos árbitros,
o resultado será uma diminuição
da pressão sobre um sistema judiciário já sobrecarregado. "Muitos
juízes preferem isso", disse Mohamed Elmasry, presidente do
Congresso Islâmico Canadense.
Mesmo assim, a iniciativa é cercada de polêmica, mesmo no interior da comunidade muçulmana.
As sugestões de que ela poderia
levar ao apedrejamento de mulheres por adultério foram rapidamente rejeitadas pelas autoridades canadenses, que observam
que os novos tribunais islâmicos
terão de respeitar a Constituição.
As novas cortes, que ainda não
julgaram nenhum caso, não poderão lidar com assuntos criminais. Além disso, o governo de
Ontário insiste que os casos só serão submetidos aos árbitros muçulmanos, selecionados e treinados pelo Instituto Islâmico, mediante o consentimento voluntário de todas as partes envolvidas.
"As pessoas poderão usar qualquer árbitro que quiserem e poderão fazê-lo num contexto religioso, se isso for aceitável para
ambas as partes", explicou Brendan Crawley, porta-voz do procurador-geral do Ontário.
Mesmo assim, resta o temor de
que a prática da sharia coloque as
mulheres muçulmanas em desvantagem. A lei familiar islâmica
tradicional, por exemplo, diz que
os homens recebem mais dinheiro do que as mulheres em heranças, que os homens têm o primeiro direito de iniciar divórcios e
que têm direito à guarda das filhas
antes da puberdade. Para ajudar a
contrabalançar tudo isso, o instituto espera assegurar que haja
mulheres entre os árbitros.
"Se sou uma mulher de fé, e a
comunidade de pessoas que se
vêem como líderes disser que eu
não sigo as diretrizes da corte da
sharia aqui, o Instituto Islâmico,
estarei praticamente cometendo
blasfêmia e apostasia", alertou
Alia Hogben, do Conselho Canadense de Mulheres Muçulmanas.
Tradução de Clara Allain
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