São Paulo, sábado, 30 de junho de 2007

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Hong Kong ainda espera da China democracia plena

Dez anos após voltar a controle chinês, economia da região permanece dinâmica, mas direitos políticos estão restritos

População da região, que ficou um século e meio sob domínio britânico, tem pedido a Pequim respeito ao direito de voto acordado

Vincent Yu/Associated Press
Manifestante queima foto de Hu e pede democracia em Hong Kong


BRUNO PHILIP
DO "MONDE"

Dez anos depois de sua anexação pela China, os cidadãos de Hong Kong apelam sempre pela completa democratização prometida e se mobilizam regularmente para preservar a especificidade de sua cultura. No plano econômico, porém, o território vem aproveitando bem o crescimento chinês.
Em 30 de junho de 1997, quando o governador Chris Patten deixou a sede do poder britânico em Hong Kong, mais de um cidadão da ilha encarou com certa dose de apreensão a página final do século e meio de presença britânica. Nove anos antes, o "pequeno timoneiro" chinês Deng Xiaoping e a "dama de ferro" inglesa, Margaret Thatcher, haviam assinado o fim do tratado colonial que, em janeiro de 1841, havia forçado o imperador da China a ceder aos britânicos a ilha de Hong Kong.
O acordo de 1984 previa que a nova Região Administrativa Especial (ERA) teria "grau elevado de autonomia" e que, a partir de 1º de julho de 1997, e por 50 anos, ela poderia continuar se beneficiando das vantagens oferecidas por suas peculiaridades políticas e culturas. Hong Kong conseguiu uma garantia de que sua diferença com a China seria preservada.
O conceito de "um país, dois sistemas" dispunha de que maneira a situação transcorreria. Agora, passados dez anos da retomada do controle chinês, qual seria a avaliação? O regime de Pequim manteve ou não suas promessas? As interferências repetidas das autoridades chinesas na política macularam em definitivo a autonomia de Hong Kong? É difícil encontrar uma resposta inequívoca.
De maneira geral, os cidadãos de Hong Kong continuam a viver uma existência semelhante à que tinham antes da devolução. Porque o território continua a ter moeda própria (o dólar de Hong Kong) e porque a maioria dos estrangeiros pode entrar sem visto, enquanto os chineses continentais precisam de passaporte especial para a visitar, Hong Kong foi capaz de preservar sua especificidade. E também começa a desfrutar de uma prosperidade renovada, mesmo que a disparidade de renda entre os ricos e os novos pobres não pare de crescer, como na China.

Objetivo final
Se o conceito de "um país, dois sistemas" cumpriu suas promessas econômicas, o mesmo não se aplica ao aspecto político. A Lei Fundamental, que serve como constituição do território, previa como "objetivo final" que os membros do Conselho Legislativo, o Parlamento local, fossem selecionados por voto universal direto e que o mesmo se aplicaria ao dirigente máximo de Hong Kong, conhecido como chefe do Executivo.
Até o momento, no entanto, apenas 30 dos 60 membros do conselho são eleitos por voto direto, em eleições quadrienais, e os demais são selecionados por grupos de interesse profissional -advogados, banqueiros, professores etc.- vinculados fortemente a Pequim. É esse o fator que não permite aos candidatos dos partidos do campo dito democrático conquistar a maioria no conselho, ainda que eles regularmente obtenham 60% dos votos para os assentos abertos a disputa. O chefe do Executivo continua a ser escolhido, para um mandato de cinco anos, por um comitê de nomeação dependente de Pequim. "O que temos é um país, um sistema", diz Martin Lee, antigo presidente do Partido Democrata e líder da "resistência" de Hong Kong.
Quando foram concluídos os acordos de 1984 entre Londres e Pequim, a China ainda era comunista. "Isso mudou. Por isso, é difícil continuar falando em dois sistemas". Quanto ao "grau elevado de autonomia", na verdade "o que existe é um grau elevado de controle da parte de Pequim", diz Lee.
As garantias inscritas na Lei Fundamental previam que eleições livres e democráticas para todos os postos do governo de Hong Kong entrassem em debate em 2007. Mas, em lugar disso, em 2004, o Parlamento de Pequim decidiu adiar sine die as perspectivas de completa democratização do território.
As pesquisas de opinião pública indicam que um número cada vez maior dos 7 milhões de habitantes de Hong Kong aprovam viver sob a tutela de Pequim. Mas, quando acham que Pequim está exercendo seu poder de maneira pesada demais, os cidadãos de Hong Kong indicam sua insatisfação. Em 1º de julho de 2003, depois que o então chefe do Executivo, Tung Chee-hwa, pró-Pequim, tentou aprovar uma lei de combate à subversão vista por muitos partidários da democracia como liberticida, 500 mil pessoas foram às ruas.
Os cidadãos do território têm uma reputação de pragmatismo, e seu interesse primordial são os negócios, mas se manifestam quando a preservação de sua identidade está em jogo.

Tradução de PAULO MIGLIACCI


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