São Paulo, sábado, 30 de junho de 2007

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Desigualdade ameaça democracia na África do Sul, diz Desmond Tutu

Para arcebispo sul-africano, avanços econômicos atingiram só minoria dos negros

JAMES LAMONT E ALEC RUSSELL
DO "FINANCIAL TIMES", EM LONDRES

A disparidade entre ricos e pobres está aumentando na África do Sul, e isso ameaça os ganhos propiciados pela democracia de 1994 para cá, alertou Desmond Tutu, antigo arcebispo da Cidade do Cabo.
"A maior parte [das pessoas] continua vagando em terra árida", disse o arcebispo sobre o ritmo lento de redistribuição da riqueza desde o final do domínio branco no país, há 13 anos. Usando uma analogia bíblica, ele afirmou que os sul-africanos haviam cruzado o Mar Vermelho em sua luta contra o apartheid, mas poucos deles haviam chegado à Terra Prometida.
O arcebispo, um dos mais inspiradores entre os líderes do movimento de oposição ao apartheid, interferiu, e não pela primeira vez nos oito anos da presidência de Thabo Mbeki, em um debate de aguçada sensibilidade política. Seu alerta surgiu no momento em que o Congresso Nacional Africano (CNA), que governa o país, está conduzindo sua conferência política qüinqüenal, sob pesadas críticas da esquerda, segundo a qual as políticas pró-mercado adotadas pelo governo não ajudam os mais pobres.
No passado, quase todas as pessoas afluentes do país eram brancas; agora, elas contam com a companhia de uns poucos negros, disse Tutu. Mas a maioria das pessoas que viviam em barracos antes que o domínio branco acabasse continua vivendo em barracos.
"Estou realmente surpreso diante da notável paciência do povo", disse ele ao "Financial Times" durante o lançamento da Fundação Tutu em Londres, na quarta-feira. Era difícil "explicar por que eles não mandam Tutu, [Nelson] Mandela e todos os demais para o inferno e saem quebrando tudo".
O arcebispo Tutu, que ganhou o Prêmio Nobel da Paz em 1984, já havia criticado as políticas de promoção do progresso econômico dos negros adotadas pelo CNA no passado, dizendo que o processo enriquecera a uns poucos, em lugar de tirar o povo da pobreza.
Empresas sul-africanas foram encorajadas a atrair acionistas negros a fim de ampliar a classe de proprietários na economia, bem como a promover a contratação de mais funcionários e a seleção de mais conselheiros negros. Mas a esquerda vem mencionando pesquisas segundo as quais empresas com "influência negra significativa" respondem por apenas 5% do capital cotado na bolsa de valores de Joanesburgo.
O governo recebeu elogios por sua política fiscal prudente, com a economia registrando crescimento anual da ordem de 5% ao longo dos três últimos anos. Mas o desemprego, difícil de medir devido à presença de uma ampla economia informal, foi estimado em até 40%.
Existe nos bastidores profunda ansiedade nas bases do partido com relação às indicações de que, apesar de estar liderando um dos mais longos períodos de expansão econômica desde a Segunda Guerra Mundial, Mbeki estaria também liderando a criação de uma disparidade ainda maior entre ricos e pobres.


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