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GUERRA NO ORIENTE MÉDIO / TESTEMUNHO
"É uma situação de perder ou perder"
Para libanesa cristã, a única solução para o atual conflito é que os radicais dos dois lados se cansem e queiram a paz
KARMA EKMEKJI
ESPECIAL PARA A FOLHA
Eu me lembro claramente
-foi o 11º dia do bombardeio do
Líbano. Eu passara dias sem
conseguir raciocinar claramente. Talvez isso aconteça porque
praticamente não conseguimos
dormir. Você não consegue
dormir quando fica esperando
a chegada de mais uma explosão ou quando é despertada
com um telefonema às 2h da
manhã. Pego o telefone. Uma
voz gravada fala em árabe perfeito: "Pedimos ao povo libanês
que não apóie o Hizbollah, esses terroristas que ameaçam o
Líbano e a região. Queremos
ajudar o povo libanês". E encerra com "o Estado de Israel".
Nossos vizinhos agora encontraram uma maneira ambientalmente amigável de
transmitir suas mensagens. Para que desperdiçar milhares de
folhetos quando podem penetrar nossas linhas telefônicas e
começar a ligar para nossos números pessoais? Mas peço um
pouco de cortesia. Não é como
se vivêssemos em Hong Kong,
pelo amor de Deus, temos o
mesmo fuso horário. Por favor,
liguem num horário decente.
Me sentei sobre o telhado,
ouvindo o barulho ensurdecedor dos aviões F-16, e era tão
simples. Havia uma voz só em
minha cabeça: "Nos deixem em
paz, só isso". Uma semana
atrás, eu estava furiosa: "Como
o Hizbollah OUSA declarar
guerra em nome do povo libanês?". Não poderiam ter escolhido um momento melhor?
Eles estragaram o verão, a temporada turística, as férias de libaneses como eu, que trabalhamos ou estudamos fora do país
e contamos os dias que faltam
para podermos voltar. Quem
diabos eles pensam que são?
Estamos fartos dessa questão
das "armas do Hizbollah"! Desarmem-nos já, não importa a
que preço! Nunca concordei
com o fato de o Hizbollah ter
armas após a retirada israelense em 2000; sempre acreditei
que isso prejudicaria qualquer
perspectiva de paz na região.
Agora, porém, retrocedi um
passo e me dei conta de que, como cidadã libanesa, nunca me
senti ameaçada pela presença
do Hizbollah no Líbano. Tenho
de admitir que a sensação foi
estranha, mas, de repente, me
vi pensando positivamente sobre o Hizbollah, no contexto
desta guerra. Não concordo
com sua abordagem ou sua política, mas, quando em toda sua
vida você nunca viu uma nação
ou um líder árabes enfrentando
Israel, e agora você vê uma organização realizando algo com
que nenhum líder árabe ousou
sonhar no último quarto de século, você não pode deixar de
sentir respeito por essa gente.
Israel bombardeou os aeroportos, portos, quase todas as
pontes do Líbano, depósitos de
combustível, casas, igrejas,
mesquitas, escolas, antenas de
comunicações, torres de observação da ONU e matou mais de
500 civis. Será que eles pensam
que eu realmente poderia
aplaudi-los e me voltar contra o
Hizbollah, agora? Para mim, é
uma situação de perder ou perder, de qualquer maneira! Se
Israel "ganhar" esta guerra, e o
mundo inteiro aplaudir o desarmamento do Hizbollah, teremos talvez dez ou 15 anos de
paz, durante os quais novos
Nasrallahs vão nascer a cada
minuto e um novo exército de
resistência será treinado para
combater Israel outra vez. Se o
Hizbollah "ganhar" esta guerra,
então eles se tornarão a entidade mais poderosa do Líbano.
Em outras palavras, vão mandar no país. Vamos nos tornar
uma pseudo-república islâmica
e eu embarcarei no próximo
avião para fora daqui.
A única maneira de superar
esta situação é que ambos os lados se cansem e que os radicais
de ambos os lados queiram a
paz. Se os moderados de ambos
os lados acordarem uma paz, os
radicais de ambos os lados já
começarão a urdir a próxima
batalha. Ambos os lados já deram provas de força suficiente.
O Líbano já sofreu o suficiente
e Israel foi atacado como nunca
antes. Você não acha que já é
hora de trocar alguns reféns?
KARMA EKMEKJI , 22, é libanesa cristã e graduou-se em maio pela Universidade Columbia
(EUA) com um mestrado em administração pública.
Tradução de CLARA ALLAIN
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