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MINHA HISTÓRIA KENZA DRIDER, 31
Uso véu e daí?
Foi uma escolha espiritual e não uma imposição
Quero ser livre para vestir o que quiser
Tornou-se um combate diário
RESUMO
Há 11 anos, a
francesa Kenza Drider,
31, decidiu cobrir o corpo com o niqab, véu islâmico que somente deixa
de fora os olhos.
Uma decisão que bate
de frente com o polêmico projeto apoiado pelo
governo francês, que
proíbe o uso em público
-inclusive nas ruas.
Também a burca (em
que o rosto é coberto por
uma tela) seria vedada.
O projeto passou no
Congresso e está sendo
analisado por juízes antes de ir à sanção do presidente Nicolas Sarkozy.
ANA CAROLINA DANI
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA,
DE AVIGNON (FRANÇA)
Sou francesa e muçulmana. Nasci em uma pequena
cidade na região da Bourgogne e me mudei para Avignon
quando era ainda adolescente. Sou filha de marroquinos.
Meus pais vieram para cá há
40 anos. Sinto-me inteiramente francesa e por nada
nesse mundo deixaria a
França. O que quero é ser livre para vestir o que quiser
no meu próprio país.
Decidi usar o niqab há 11
anos. No começo, era somente uma reivindicação religiosa. Agora, trata-se também
de um combate pela liberdade individual. Antes, não me
cobria, nem mesmo usava o
hijab (que cobre somente o
cabelo), até começar a ler
textos e livros sobre o islã.
Decidi vestir o niqab para
seguir o exemplo da mulher
do profeta (Maomé). Foi uma
escolha pessoal e espiritual e
não uma imposição. Um dia
saí de casa e comprei um niqab escondido do meu marido. Na manhã seguinte, a
gente ia sair, aí decidi colocar
o véu. Ele ficou surpreso,
mas como era uma escolha
minha, entendeu e aceitou.
PRECONCEITOS
Quando comecei a usar o
niqab, as pessoas me olhavam na rua com curiosidade,
às vezes surpresos, mas nunca fui agredida ou insultada.
Agora, depois da polêmica
sobre a lei contra a burca, ficou muito difícil usar o véu
integral aqui na França. As
pessoas me olham com raiva.
São olhares maldosos,
cheios de ódio. Há também
insultos, agressões. Tornou-se um combate diário.
Um dia, fui buscar meus filhos na escola. Quando voltava para casa, com meu marido, amigos e outras crianças, um homem mais velho
veio para cima de mim. Ele
me insultava, dizendo que eu
não tinha mais o direito de
usar o véu integral nesse
país. De repente, tirou uma
faca e tentou me atingir. Meu
marido agarrou a mão dele e
conseguiu desarmá-lo. Foi
um horror. As crianças começaram a chorar. Desde que
começou essa polêmica, já
fui três vezes dar queixa de
agressão ou insultos. Antes,
nunca havia entrado numa
delegacia.
FAMÍLIA
Casei-me aos 19 anos e não
foi um casamento arranjado.
Meu marido nasceu no Marrocos, também é muçulmano
e veio para a França quando
era pequeno. Temos quatro
filhos, de 9, 10, 11 e 12 anos.
Meus pais também eram muçulmanos, mas nunca foram
radicais. Em casa, a gente
praticava mais a tradição
marroquina do que a muçulmana. A prática da prece não
era constante. A única obrigação era o Ramadã.
Hoje, trabalho como voluntária em associações laicas de ajuda social e terminei, recentemente, uma formação como assistente jurídica. Tenho uma vida completamente normal. Trabalho, faço compras, levo e
busco meus filhos na escola,
ajudo nos deveres. Tenho
três meninas e não vou impor
a elas o uso do véu ou do niqab. Elas é que vão escolher.
LIBERDADE
Não acho que o islã ou o
véu integral signifiquem submissão da mulher. Na França, a maioria das mulheres
que usa o niqab são cidadãs
francesas. Nunca conheci
uma mulher que me dissesse
que usava o niqab porque o
marido a obrigava. Para
mim, é uma escolha pessoal
e uma prescrição divina.
A proibição da burca na
França é uma ditadura. É o
governo que vai acabar me
obrigando a ficar trancada
em casa, e não meu marido.
Vou continuar a usar o niqab, mesmo que a legislação
seja aprovada. O niqab é a
minha liberdade.
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