São Paulo, sexta-feira, 31 de março de 2006

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EUROPA

Conselho Constitucional aprova lei contestada por estudantes; assessores de Chirac falam em concessões a sindicatos

França avança para promulgar lei polêmica

DA REDAÇÃO

O Conselho Constitucional francês declarou ontem que é legal a lei do primeiro emprego. A decisão conduz a um novo patamar a atual crise política da França, que cresceu em três semanas de passeatas contra o texto destinado, em princípio, a diminuir o desemprego entre os trabalhadores com menos de 26 anos.
O ministro do Trabalho, Jean-Louis Borloo, discursando ontem no Senado, disse que a palavra "arquivamento" não estava na Constituição. Negou com isso que, mesmo com o sinal verde do Conselho Constitucional, o governo pretenda abrir mão da lei.
O presidente Jacques Chirac fará hoje à noite um pronunciamento em rede nacional de TV. Analistas acreditam que sua margem de manobra seja estreita.
Caso promulgue a lei votada pelo Parlamento, estará lançando lenha na fogueira dos protestos estudantis e sindicais. Estimulados pelas manifestações de rua da última terça (em que dizem ter reunido mais de 2 milhões de pessoas), as entidades organizam uma nova "jornada de ação" para o próximo dia 4, na qual prometem paralisar o setor público e obter a adesão de assalariados de algumas empresas privadas.
Caso recue e devolva a lei do primeiro emprego aos deputados, para um novo período de tramitação -a Constituição francesa permite que ele faça isso no período de nove dias-, Chirac estará desautorizando seu primeiro-ministro, Dominique de Villepin, que empenhou seu capital político para defender o texto oficial.
Nessa hipótese, diz a France Presse, Villepin e o presidente da Assembléia Nacional, Jean-Louis Debré, pediriam demissão.
A popularidade de Villepin nunca esteve tão baixa. Ele perdeu com a crise cinco pontos e é hoje um governante confiável para apenas 29% dos franceses.
A debilidade do primeiro-ministro põe em xeque os planos do próprio Chirac para sua sucessão em 2007, quando pretende apoiá-lo contra o atual ministro do Interior, Nicolas Sarkozy, que também pertence ao mesmo partido de centro-direita.

Sindicatos
Uma alternativa para Chirac foi levantada ontem por um de seus assessores, citado pelo "Le Monde". Trata-se de convocar os sindicatos para uma maratona de negociações, segundo o modelo adotado em Maio de 1968, para pôr fim à greve geral detonada pelos estudantes. O episódio entrou para a história política francesa como os "Acordos de Grenelle".
Enquanto isso, os estudantes, sem uma decisão formalizada em assembléias ou nascida em suas associações, passaram ontem a bloquear rodovias e ferrovias como novo meio de protesto.
O bloqueio de auto-estradas provocou durante a manhã 345 km de congestionamentos. Linhas ferroviárias foram bloqueadas em Rennes e em Marselha. Em Paris, um grupo de 1.000 secundaristas ocupou por duas horas a Gare de Lyon, interrompendo o tráfego ferroviário entre a capital e o sul da França.
A lei que eles contestam diminui os encargos de empresas que contratem jovens recém-formados. Mas há a paralela redução de direitos trabalhistas. O item mais controvertido permite a demissão sem justificativas nos primeiros 24 meses de contrato.
Esse dispositivo levou 60 deputados e 60 senadores do Partido Socialista a interpelarem o Conselho Constitucional. Eles argumentavam que a lei criava um regime de demissões paralelo, o que estaria em contradição com o princípio constitucional da igualdade dos direitos trabalhistas.
O fato de o presidente Chirac ser agora o único árbitro dos próximos passos levou um de seus assessores a desabafar no jornal "Le Figaro": "Ele tem apenas uma bala no tambor do revólver. Se falhar, não sei para onde iremos."
Segundo o assessor, que não foi identificado, "não há uma solução que seja boa; há apenas opções entre as menos ruins".
Os sindicatos alertaram Chirac contra as conseqüências da promulgação da lei. "Seria uma decisão carregada de conseqüências", disse o líder da pró-comunista CGT, Bernard Thibault.
Dois outros dirigentes de confederações, Jean-Claude Mailly, da FO, e Gérard Aschieri, da FSU, alertaram para a reação que ocorrerá se Chirac "partir para uma solução de força".
Caso tivesse atuado politicamente, o Conselho Constitucional teria ontem feito ressalvas à lei do primeiro emprego, o que deixaria o governo livre para recuar, sem que o recuo fosse atribuído à pressão dos manifestantes nas ruas.
Mas a instituição (que não é uma Corte Suprema) tem um histórico de isenção. Criada em 1958, é integrada por nove juristas e pelos ex-presidentes da República.
O conselho só pode ser acionado pelo próprio presidente, por seu primeiro-ministro, pelo presidente do Senado ou por um grupo de deputados e senadores.
Ele se pronuncia sobre a constitucionalidade de uma lei votada no Parlamento. Se acionado, tem o prazo de 30 dias para fazê-lo. O prazo cai para uma semana se houver emergência social.
Em sua última decisão, o conselho considerou ilegal a instituição de quotas para mulheres no mercado de trabalho. Argumentou que o sistema de cotas fere o princípio da igualdade dos cidadãos.


Com agências internacionais

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