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Para autor, sem Blair e Diana acaba era de euforia britânica
Há dez anos, morte da princesa e vitória do ex-premiê trabalhista uniram o país
Para Harris, fatos marcaram momento de mudança da Coroa e criaram em meio à população uma identidade comum, que já não existe
SYLVIA COLOMBO
DA REPORTAGEM LOCAL
O fim dos anos Tony Blair e o
aniversário de dez anos da morte da princesa Diana, hoje, encerram uma era de entusiasmo
coletivo no Reino Unido. Essa é
a opinião do jornalista britânico John Harris, autor de "The
Last Party: Britpop, Blair and
the Demise of English Rock" (A
última festa: britpop, Blair e a
morte do rock inglês), em que
mostrava como, no fim dos
anos 90, transformações culturais e sociais fizeram com que o
país tivesse a sensação de estar,
novamente, vivendo a euforia
dos "swinging sixties" (anos
60). Harris trabalha no prestigiado diário "The Guardian" e
escreve também para revistas
musicais. Leia trechos da entrevista que concedeu à Folha,
por telefone, de Londres.
FOLHA - Como a morte de Diana relaciona-se com o ambiente cultural
da "Cool Britannia"?
JOHN HARRIS - A "Cool Britannia" teve um ponto alto na cultura pop no momento em que
Tony Blair recebeu os músicos
do Oasis em sua residência oficial, em 1997. A idéia de que vivíamos, de novo, na "swinging
London" dos anos 60 estava
disseminada. Então outros
grandes eventos coletivos potencializaram essa sensação.
O fato de termos perdido a
Eurocopa no ano anterior foi
um trauma que uniu as pessoas. Comentava-se o resultado
do campeonato como se fosse a
coisa mais terrível que o país
poderia estar vivendo. E era
preciso compartilhar essa tristeza nos bares, no trabalho.
Então, em 1997, vieram a vitória dos trabalhistas e a morte
de Diana, dando impulso a essa
transformação coletiva.
FOLHA - Por quê?
HARRIS - A sensação que tínhamos era que, por um momento
muito breve, concordávamos
sobre algo, que era necessário
pertencer a uma multidão em
luto. Assim como nos sentíamos coagidos a chorar pela derrota da seleção, agora tínhamos
de enterrar juntos a princesa.
FOLHA - E como isso dialogou com
a vitória dos trabalhistas?
HARRIS - Politicamente tínhamos a sensação de que a vitória
dos trabalhistas era muito
maior e mais importante do
que realmente foi. É claro que
muitos haviam votado pelos
conservadores, mas, pelo ânimo coletivo, não parecia. A impressão era de que Tony Blair
ganhara com 100% dos votos.
FOLHA - Por quê?
HARRIS - Foi uma grande reação ao que tínhamos vivido no
período Thatcher (1979-1990),
que passou a ser visto, naquela
época, como um tempo sombrio, de divisão social e econômica. Hoje ainda somos divididos, mas, nos anos 80, estávamos muito mais preocupados
com o inimigo entre nós. Agora
é diferente, vivemos mais no
mundo e o inimigo vem de fora.
Olhando daqui, parece delirante a idéia de que uma simples negação coletiva ao Partido Conservador pudesse fazer
com que nos tornássemos uma
nova nação. Mas foi assim, a vitória trabalhista foi uma oportunidade para que muita gente
sentisse conforto ao compartilhar uma reação política.
FOLHA - Qual avaliação você faz do
uso que Tony Blair fez do episódio
da morte de Diana?
HARRIS - É muito difícil não ser
cínico numa situação como essa, especialmente se você é um
político. Mas não sei se, quando
[o porta-voz] Alastair Campbell veio com a expressão "princesa do povo", estava pensando
em um movimento político genial. Acabou tomando uma
proporção gigantesca porque
referendou uma sensação de
que Blair estava acima da política. A habilidade que teve em
transformar-se em alguém que
falava por toda a nação é um
mérito dele. Ele teve a capacidade de ler o que as pessoas estavam pensando, e como os
ventos estavam mudando.
FOLHA - E a monarquia mudou como, desde Diana?
HARRIS - Houve uma grande
transformação, relacionada ao
momento político da Inglaterra. O filme "The Queen" reflete
isso bem. Mostrou que aqueles
que votavam pelos trabalhistas
poderiam de algum modo concordar com a monarquia. E a
monarquia, que debatia como
sobreviver durante um governo
trabalhista, reagiu. Adotou
uma cara mais moderna.
FOLHA - E isso se manterá?
HARRIS - Não creio. Depois que
a rainha morrer, vai ser uma
outra história. Ela representa
uma ligação da Inglaterra de
hoje com a do país que saiu vitorioso da Segunda Guerra.
É um emblema de continuidade. Já Charles não sei que
emblema será. E disso depende
o destino dessa monarquia.
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