São Paulo, quinta-feira, 31 de outubro de 2002

Próximo Texto | Índice

ORIENTE MÉDIO

Premiê pode convocar novas eleições ou obter apoio de partidos extremistas, levando governo mais à direita

Trabalhistas deixam governo de Sharon

Sven Nackstrand/France Presse
O líder trabalhista Ben Eliezer (à esquerda) e o premiê Ariel Sharon no Parlamento, em Jerusalém


DA REDAÇÃO

Os ministros trabalhistas do governo de Israel renunciaram ontem, provocando o fim da coalizão de união nacional chefiada pelo premiê Ariel Sharon, do Likud (centro-direita).
Os ministros Binyamin Ben Eliezer (Defesa) e Shimon Peres (Relações Exteriores) anunciaram sua renúncia após horas de negociações que não evitaram o colapso da coalizão.
O país -que há mais de dois anos enfrenta um levante armado palestino (Intifada) e atentados suicidas- pode ter eleições gerais parlamentares antecipadas entre março e maio de 2003.
"Não há dúvidas de que a renúncia [de Ben Eliezer] põe um fim ao governo de união nacional", afirmou Yaakov Neeman, mediador da conversa entre Sharon e os dois ministros.
Outros trabalhistas que integram o governo também apresentaram sua renúncia, que passa a vigorar após período de 48 horas.
O fim da aliança entre os tradicionais rivais da política israelense -o Partido Trabalhista (centro-esquerda) e o Likud- foi provocado pela oposição trabalhista à proposta de Orçamento submetida a votação em primeira leitura ontem.
Ben Eliezer, líder dos trabalhistas, considerou inaceitável a alocação de cerca de US$ 145 milhões para as colônias judaicas nos territórios palestinos ocupados da faixa de Gaza e da Cisjordânia. A ampliação dessas colônias -atividade considerada ilegal pela comunidade internacional- é um dos principais motivos de irritação dos palestinos com Israel e um dos maiores obstáculos à paz.
Para os trabalhistas, esses recursos deveriam ser destinados a setores da sociedade mais abalados pela crise econômica, como moradores de cidades mais pobres, estudantes e aposentados.
"Fizemos isso [a renúncia] em nome da preservação da nação", afirmou Ben Eliezer. "Precisamos combater o terror, mas temos de apresentar um horizonte diplomático", disparou Ben Eliezer, criticando a política de Sharon, que se nega a dialogar com os palestinos enquanto houver violência. "O primeiro-ministro é incapaz de apresentar um horizonte diplomático", afirmou.
Em discurso ontem no Parlamento, Sharon disse ter vergonha do comportamento do líder trabalhista, que deixou de apoiá-lo num momento delicado -além da Intifada, Israel teme um possível envolvimento numa guerra liderada pelos EUA contra o Iraque.

Motivações pessoais
O governo acusa Ben Eliezer de ter agido de acordo com motivações políticas pessoais, não em razão do Orçamento. O ministro da Defesa disputa as eleições internas de seu partido no próximo dia 19 contra dois rivais que gozam de maior popularidade por defenderem a saída dos trabalhistas do governo.
Sem poder contar com os 25 votos trabalhistas (de um total de 120), Sharon passa a ter formalmente apenas 55 cadeiras no Parlamento. Ele terá agora duas opções: ampliar a sua base para obter maioria, atraindo ao governo partidos pequenos da direita extremista ou convocar novas eleições, que seriam realizadas dentro de 90 dias após a convocação.
A julgar pelo resultado da votação do Orçamento de ontem (o projeto foi aprovado por 67 votos a 45), o premiê tem condições de se manter no poder com novos aliados. Sharon disse estar disposto a continuar liderando o país "de uma forma responsável e clara". Seria, contudo, uma coalizão muito instável.
O racha de ontem encerra uma parceria entre os dois grandes partidos israelenses. A aliança durou 20 meses e foi forjada para garantir a estabilidade num momento de turbulências decorrentes do conflito com os palestinos e da subsequente crise econômica.

Palestinos
As incertezas políticas no cenário doméstico devem prejudicar as já quase inexistentes iniciativas de paz com os palestinos. Um governo Sharon reforçado por agremiações mais à direita seria contrário a fazer concessões em negociações diplomáticas. E, em caso de eleições antecipadas, qualquer possibilidade de diálogo ficaria adiada para depois da formação de um novo governo, o que não aconteceria em menos de quatro ou cinco meses.
"A arena política israelense está se distanciando cada vez mais rápido de uma atmosfera de paz", disse ontem Saeb Erekat, ministro do gabinete palestino.
"Se o Likud formar outra coalizão de governo de direita, isso também acontecerá em detrimento do processo de paz e do povo palestino, porque significaria novamente mais construção de colônias", acrescentou Erekat.
Os movimentos diplomáticos para discutir um cessar-fogo no conflito -que, desde setembro de 2000, já matou ao menos 1.636 palestinos e 623 israelenses- caminham lentamente.
Na semana passada, o subsecretário de Estado dos EUA William Burns viajou à região em busca de apoio a um plano em três etapas para promover a paz e a criação de um Estado palestino em três anos.
Os líderes de Israel e da Autoridade Nacional Palestina receberam com ceticismo a proposta, que é apoiada pela Rússia, pela União Européia e pela ONU.

Com agências internacionais


Próximo Texto: Análise: Eleição deve ser antecipada
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.