São Paulo, domingo, 22 de agosto de 2004


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SELVA TECNOLÓGICA

Possíveis parcerias firmadas entre cientistas e empreendedores potencializam negócios da Amazônia

Inovação impulsiona produtos "verdes"

TATIANA DINIZ
ENVIADA ESPECIAL A CUIABÁ

No coração da selva ecoam batidas diferentes. A pulsação é marcada por uma nova forma de encarar a biodiversidade brasileira, reforçando seu potencial econômico e de geração de novos negócios. Tecnologia é a alavanca do processo. Neo-extrativismo, a palavra que resume a tendência.
O tema esteve em pauta no Amazontech, realizado em Cuiabá, que faz parte da Amazônia Legal. O evento foi organizado na semana passada pelo Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio à Micro e Pequena Empresa).
Durante cinco dias, empresários, cientistas, indígenas e representantes do governo, entre outros, conduziram uma discussão que descortinou ao país a possibilidade de abandonar seu posto de fornecedor de matéria-prima para passar a fazer melhor uso desses recursos.
O caminho é agregar valor por meio da inovação e desenvolver, dessa forma, uma geração turbinada de produtos oriundos da natureza. Da fabricação de fitoterápicos com plantas da Amazônia, passando pelo manejo sustentável de peixes de alto valor comercial até a produção de fármacos derivados do veneno do sapo, as possibilidades são infinitas.
"O princípio é trabalhar com a natureza, não contra ela", resumiu Ernest Zucker, representante do Escritório de Tecnologia da Madeira de Biel (Universidade de Berna, Suíça), em palestra que abordou os produtos nobres de madeira amazônica.
"Temos uma herança histórica de modelo predatório. Por isso não dá para insistir no "não pode tocar". A preservação da biodiversidade brasileira tem mesmo de ser atrelada ao seu potencial econômico", diz Bruno Filizola, assessor técnico da Secretaria de Desenvolvimento Sustentável do Ministério do Meio Ambiente.
Entre outras ações, a secretaria conduz o Projeto Kambô, que pesquisa as propriedades medicinais de um veneno de sapo que os índios cacutinas, do Acre, injetam na corrente sangüínea como panacéia para males do corpo e do espírito. "É o que chamamos de "etnofármaco". Além de estudar o princípio ativo, é preciso compreender os conhecimentos tradicionais que envolvem seu uso."
Já o Iepa (Instituto de Pesquisas Científicas e Tecnológicas do Estado do Amapá), ligado ao governo estadual, é um dos braços que conduzem o casamento de tecnologia com as informações tiradas dos povos locais sobre o uso de materiais extraídos da floresta.
Fitocosméticos e fitoterápicos são os carros-chefes da região, cuja pesquisa científica foca na otimização dos princípios ativos de espécies vegetais como andiroba, copaíba e castanha do Pará.
Uma prova de que preservação e inovação não são excludentes é o projeto Mamirauá, conduzido em reserva homônima nas proximidades de Manaus e a primeira área de manejo sustentável estabelecida no país, há 14 anos.
Os pesquisadores são financiados pelo Ministério da Ciência e Tecnologia e, além de auxiliarem a população na introdução de novos métodos para o cultivo de peixes, desenvolveram inventos como uma moedora de mandioca de pedal, que reduziu os acidentes do processo tradicional.

Madeira certificada
Entre as discussões que derivam do neo-extrativismo, o manejo sustentável da madeira pode ser apontado como um dos temas que já estão bastante aquecidos.
No dia 17, durante o Amazontech, o Sebrae lançou um edital que vai selecionar um centro tecnológico para prestar serviços às micro e pequenas empresas de pólos de madeira situados nos Estados da Amazônia Legal.
De acordo com dados da instituição, os pólos moveleiros estão concentrados no Acre, no Amazonas, no Maranhão, em Mato Grosso, no Pará e em Rondônia. A estimativa é que existem nessa área cerca de 640 empreendimentos formais e 1.100 informais.
Uma das preocupações é chegar, com auxílio da tecnologia, à fabricação de produtos nobres certificados. Não é impossível. A madeira brasileira começa a seduzir a clientela classe A européia.
"A certificação é fundamental para vender lá fora", reforça Ernest Zucker, da Universidade de Berna. "O FSC [selo do Conselho de Manejo Florestal] continua configurando um caminho."


A jornalista TATIANA DINIZ viajou a convite do Sebrae Nacional


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