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Alemanha atrai europeus desempregados

Por SUZANNE DALEY e NICHOLAS KULISH

Schwäbisch Hall, Alemanha

Enquanto boa parte do sul da Europa enfrenta desemprego crescente, a Alemanha precisa desesperadamente de profissionais qualificados e os está buscando ao sul.

Nos últimos 18 meses, o país recrutou milhares dos melhores e mais inteligentes profissionais, atraindo-os para esta cidade bonita e muitas outras como ela, numa migração de jovens qualificados em busca de emprego que pode prejudicar ainda mais os países europeus que enfrentam mais dificuldades, e, ao mesmo tempo, conferir uma vantagem adicional à Alemanha.

Cristina Fernández-Aparicio Ruiz, 36, é engenheira que acaba de vir da Espanha, onde o desemprego acaba de chegar a 24,4%, um nível próprio de uma depressão econômica. Ela está trabalhando numa empresa industrial nas proximidades de Schwäbisch Hall.

Seu domínio do alemão é fraco. Mas a empresa que a contratou, a Ziehl-Abegg, designou um mentor para ela. E, se ela precisa de ajuda para encontrar um médico ou ir ao supermercado, a empresa está disposta a ajudar também com isso.

"O pessoal aqui é muito simpático", disse Fernández-Aparicio, que vivia em Madri. "E no momento não há emprego na Espanha."

A movimentação livre da mão de obra foi um dos princípios fundadores da União Europeia, uma parte central do esforço para criar um mercado único e unificado. Em tempos mais prósperos, porém, poucos trabalhadores fora da Europa do leste sentiam a necessidade de deixar seus países.

Essa situação está mudando, sob as pressões da crise do euro e de uma recessão árdua, e empregadores, governos e os próprios migrantes estão descobrindo que a imigração, mesmo quando é legal e nominalmente aceita, pode elevar as tensões. E há um consenso amplo de que a Europa está ingressando numa nova era cujas ramificações estão apenas começando a ser compreendidas.

Os europeus do sul sentem-se aliviados por encontrar refúgio nesta região em grande parte rural do Estado de Baden-Wurttemberg. Mas as dificuldades inerentes às diferenças linguísticas e culturais leva muitos a hesitar quando se trata de assumir compromissos por mais tempo, como licenciar veículos ou fazer contratos de telefonia celular de dois anos.

Nessa região há muitas empresas familiares de pequeno e médio porte, conhecidas como as Mittelstand, que são os motores da economia industrial de exportação alemã. Há 7.500 vagas de trabalho em Heilbronn-Franken, a região onde fica Schwäbisch Hall, mas a necessidade maior é de engenheiros.

Quando o prefeito Hermann-Josef Pelgrim convidou vários jornalistas do sul da Europa a escrever sobre oportunidades de trabalho em Schwäbisch Hall, neste ano, a resposta a um artigo elogioso de um repórter português foi avassaladora. Desde então, mais de 15 mil portugueses desempregados enviaram seus currículos. Cerca de 40 até viajaram para a cidade.

Em dezembro, cem engenheiros espanhóis lotaram um avião para a vizinha Stuttgart, para fazer entrevistas de emprego. Em um mês, cerca de um terço deles tinham sido contratados. E algumas empresas alemãs vêm escolhendo profissionais espanhóis, portugueses, gregos e italianos em sites como o LinkedIn.

Mas a migração, embora atenda a uma necessidade urgente de ambos os lados, suscita receios de que possa estar conferindo mais uma vantagem à economia mais poderosa da Europa. Os exportadores alemães vêm se beneficiando da perda do valor do euro decorrente das dificuldades dos países do sul. Na medida em que os investidores buscam lugares seguros para colocar seu dinheiro, os exportadores vêm podendo contrair empréstimos a juros baixíssimos. Agora, enquanto os países do sul vêem seus jovens mudando para o norte, alguns também se queixam de uma evasão de cérebros.

"Esta geração de jovens que está indo embora é formada pelos jovens mais qualificados que já tivemos", disse César Castel, diretor de operações do ramo espanhol da Adecco, uma firma de recrutamento suíça. "É uma enorme perda de investimento para a Espanha. A formação de cada engenheiro nos custou em média € 60 mil (cerca de US$ 80 mil) e agora eles estão indo embora."

Ele prevê que, se a economia espanhola se recuperar em dois anos, 90% dos profissionais espanhóis voltem para casa. Se a recessão se prolongar, esse número pode diminuir muito, na medida em que os profissionais se casam e têm filhos no exterior. Castel receia a criação de uma situação em que as economias do norte fiquem com as indústrias e as do sul, com a agricultura e o turismo.

A experiência da Alemanha com a integração de trabalhadores estrangeiros, especialmente a grande minoria turca, tem sido difícil, nas últimas décadas.

Os números demográficos são reveladores: no ano passado, a população alemã cresceu pela primeira vez desde 2002, graças à chegada de 240 mil imigrantes, quase o dobro dos 128 mil que chegaram em 2010. Polônia e Romênia enviaram o maior número, mas as estatísticas indicam a chegada de milhares de outros vindos de países no sul da Europa.

Para a Espanha, a migração alivia a pressão sobre um sistema previdenciário já sobrecarregado. O índice de desemprego em Baden-Wurttemberg é de apenas 4%. Os migrantes do sul da Europa geralmente acham a Alemanha mais atraente que a América do Sul ou a Austrália porque não é tão longe de casa.

Alguns dizem que querem construir suas vidas na Alemanha, mas muitos esperam voltar a seu país em pouco tempo.

Por enquanto, pelo menos, a migração está beneficiando os dois países. O conflito vai começar quando a economia espanhola se recuperar e o país quiser seus engenheiros de volta.

Muitos espanhóis dizem que é preciso certo esforço para trabalhar na Alemanha -que os alemães são muito mais francos e também mais quietos que os espanhóis. Ninguém faz ligações pessoais no horário de trabalho. Mas o dia de trabalho tem duração bem mais curta.

O engenheiro Carlos Baixeras, 30, está trabalhando nos arredores de Frankfurt e disse que a mania de ordem dos alemães, tema de muitas piadas, é real. "Há regras para tudo", contou. David Jiménez, 23, que trabalha perto de Stuttgart, contou que suas primeiras semanas na Alemanha foram um pesadelo. "Não posso pegar uma gripe", comentou. "Se eu me resfriar, não sei o que vou fazer."

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