Índice geral New York Times
New York Times
Texto Anterior | Índice | Comunicar Erros

Poesia planetária reunida num filme

POR NICOLAS RAPOLD

Com imagens exóticas que fariam jus a uma capa da revista "National Geographic", "Samsara" percorre o planeta. Rodado em 25 países ao longo de cinco anos, o filme capta fantásticos templos em degraus na verdejante Mianmar, jovens japoneses com penteados moicanos, as maravilhas naturais das dunas de areia da Namíbia e as organizadas linhas de produção do agronegócio moderno na China e na Europa.

As locações não são identificadas e, em vez de comentários, ouve-se uma trilha sonora rica e variada. Rodado em 70 milímetros, "Samsara" traz uma sucessão ininterrupta de imagens marcantes, organizadas com fluidez segundo a noção hindu do ciclo de nascimento e destruição, que confere ao filme seu título em sânscrito. E é exatamente assim que quis seu diretor, Ron Fricke, responsável pela direção fotográfica aclamada de "Baraka" (1992) e do anterior "Koyaanisqatsi" (1982).

"Quando as imagens andam juntas, querem começar a contar uma história linear a você", explicou Fricke, que dirigiu e fotografou "Samsara". "Não é isso o que quisemos fazer. Se a coisa faz sentido demais, você se verá fazendo um documentário."

Embora manifeste uma certa consciência espiritual, "Samsara" não foi feito para transmitir uma mensagem. Nesse ponto, difere de outros filmes de não ficção em voga, como o trabalho de Michael Glawogger ("Workingman's Death", que mostra as mesmas minas de enxofre que "Samsara") e Nikolaus Geyrhalter ("Abendland"). Pode-se dizer que, ao contrário, a perspectiva de "Samsara" é cósmica, e as metas do filme são estéticas. Como artista visual, disse Fricke, ele foi influenciado pela tradição cinematográfica do espetáculo, às vezes sem palavras. "Cresci assistindo aos filmes de David Lean e Fellini", explicou. "E o final de '2001' mudou minha vida. Foi tudo não verbal."

Os antecedentes mais imediatos de "Samsara" podem ser identificados na trilogia que começou com "Koyaanisqatsi", seguido por "Powaqqatsi" e "Naqoyqatsi". Esses retratos dinâmicos da modernidade foram dirigidos por Godfrey Reggio, mas seu esplendor foi baseado nos padrões visuais definidos por Fricke no primeiro filme e nas trilhas sonoras instigantes de Philip Glass.

A hiperatividade humana, um traço comum em tais sinfonias globais, aparece em "Samsara" em imagens de multidões em metrôs japoneses e americanos fazendo ginástica. Mas essas imagens não procuram argumentar nenhum ponto polêmico, mesmo mostradas ao lado das consequências das enchentes em Nova Orleans e de um veterano uniformizado da guerra do Iraque, com o rosto marcado pelas cicatrizes de queimaduras. Fricke disse que a sequência com o veterano de guerra é "sobre o renascimento".

A questão da durabilidade de "Samsara" como registro visual foi algo que preocupou Fricke e Mark Magidson, produtor do filme. Antes do início das filmagens, em 2007, eles estudaram a possibilidade de usar câmeras digitais portáteis, mais leves, mas decidiram não usá-las devido à rapidez com que os padrões digitais mudam. Além disso, para eles o formato de 70 milímetros garante a melhor qualidade possível na captura de imagens.

"Foi importante trazer o material de volta em um formato que pudesse resistir ao tempo", disse Magidson, não obstante a dificuldade de carregar a câmera de 70 milímetros para vários pontos do planeta. "Eu não queria ir a 25 países e voltar com algo" que ficasse desatualizado em pouco tempo.

Embora o mundo que ele e Fricke retrataram esteja em processo de mutação, é apresentado como uma sequência contínua de imagens que visam carregar o espectador para outras esferas. "Quisemos manter as imagens fluindo para que o espectador não saísse do clima enquanto assistisse ao filme", explicou Fricke.

Texto Anterior | Índice | Comunicar Erros


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.