São Paulo, segunda-feira, 02 de maio de 2011

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Escultora sobrevive à rejeição e inspira artistas

Por CELIA McGEE

No outono americano de 1932, quando acabava de concluir o ensino secundário, Elizabeth Catlett compareceu à Escola de Belas-Artes e Artes Aplicadas do Instituto Carnegie de Tecnologia, em Pittsburgh, onde recebera uma prestigiosa bolsa de estudos plena. Mas foi recusada quando se descobriu que ela era "de cor" e retornou para sua cidade, Washington, para cursar a Universidade Howard.
Setenta e seis anos mais tarde, a instituição que a rejeitara, hoje a Universidade Carnegie Mellon, deu a ela um doutorado honorário em reconhecimento por sua obra como escultora e gravurista. Depois de viver e fazer arte por décadas no México, ela se tornara um nome legendário para muitos no mundo das artes, incluindo artistas mais jovens, principalmente afro-americanos, representados na exposição "Stargazers: Elizabeth Catlett in Conversation With 21 Contemporary Artists" (Elizabeth Catlett em diálogo com 21 artistas contemporâneos), no Museu de arte do Bronx, em Nova York, até 29 de maio.
"Muitas pessoas como ela tornaram-se algo como mitos", disse Hank Willis Thomas, cuja homenagem aos abolicionistas do século 19 e aos rappers, com "Ode to CMB: Am I Not a Man and a Brother", faz parte da mostra. A peça, feita de malha de ouro e zircônio cúbico, compartilha com boa parte da obra de Catlett uma preocupação com a história da escravidão e "do corpo negro como uma commodity", disse Thomas. "Boa parte da obra dela, especialmente dos anos 1960 e 1970, poderia passar por trabalhos de arte de hoje", ele acrescentou.
Catlett, que está com 96 anos, é conhecida pelo profundo engajamento de seu trabalho com questões sociais e a política de gênero, raça e pobreza. Ela participou do Projeto Federal de Arte durante a Grande Depressão nos EUA e do movimento ativista de Artes negras nos anos 1960 e mais além. Isso não quer dizer que ela tenha focado a mensagem às expensas da forma: ela se preparou para seu mestrado em belas-artes sob a orientação de Grant Wood na Universidade do Iowa e estudou em Nova York com o escultor modernista Ossip Zadkine e na Liga de Estudantes de Arte, desenvolvendo sua forma própria de modernismo figurativo em bronze, pedra, madeira, desenhos e gravuras.
Embora esse estilo tenha com frequência sido comparado ao de Henry Moore, sua obra sempre foi fundamentada em sua perspectiva de mulher e artista negra que reflete sobre a luta, o orgulho, a resistência, a resiliência e a história da comunidade negra, especialmente por meio de seus retratos da forma feminina.
A curadora da mostra no Museu do Bronx, Isolde Brielmaier, justapôs 31 trabalhos de Catlett com trabalhos de outros 21 artistas para explorar as ressonâncias entre a artista mais velha e os mais jovens. A ideia, ela explicou, foi que a exposição "revelasse sobre o que os artistas estão pensando, abrangendo o passado e o futuro".
Catlett hesita quando se fala sobre sua influência sobre gerações posteriores (mas não deixa dúvidas quanto ao conselho mais importante que pode dar a outro artista: "Nunca rejeite uma exposição, não importa onde seja"). Afinal, ela viveu boa parte de sua vida às margens de uma história da arte que, por muito tempo, ela e outros artistas de cor não foram convidados a ajudar a escrever.
Em 1947, quando estudava com uma bolsa no México, Catlett se casou com o artista Francisco Mora, que conhecera através do coletivo de gravuristas Taller de Gráfica Popular. Devido aos vínculos políticos de esquerda do casal, quando Catlett adotou a cidadania mexicana, em 1962, o Departamento de Estado dos EUA a declarou estrangeira indesejável. Esse fato, somado a sua raça, contribuiu para que ela fosse relativamente pouco conhecida no mundo mainstream da arte americana.
O título da exposição se deve a "Stargazer" (2007), obra de Catlett em mármore negro. É uma figura feminina reclinada que transmite uma impressão tão poderosamente assertiva quanto sua escultura em pé de cedro vermelho "Homage to My Young Black Sisters", de 1968, com sua saudação ao poder negro.
A inversão da tradicional passividade da figura da odalisca é "algo que eu cito definitivamente", disse a artista de origem marroquina Lalla Essayadi. Mickalene Thomas disse que suas pinturas e fotografias estampadas intricadamente decoradas não remetem à obra de Catlett de maneira evidente, mas que a artista mais velha "tem sido grande inspiração".
As obras de Catlett, disse Thomas, "universalizam a experiência afro-americana".


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