São Paulo, segunda-feira, 03 de maio de 2010

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DIÁRIO DE CALI

Colombiana salva animais vítimas do narcotráfico

Por SIMON ROMERO

CALI, Colômbia - De todos os animais que vão morrer sob as árvores samán de Ana Julia Torres, as jaguatiricas estão entre os mais numerosos.
Há oito delas ali, apreendidas do espólio de um traficante de cocaína assassinado, o qual aparentemente acreditava que qualquer barão das drogas de respeito devia ter oito jaguatiricas em seu domínio.
Torres é dona de um santuário que abriga centenas de animais salvos principalmente de traficantes de drogas e de chefes paramilitares, assim como de circos e de quadrilhas de traficantes de animais, oferecendo uma estranha visão dos excessos e das brutalidades das intermináveis guerras das drogas nesse país.
Torres, 50, cuida de Dany, um tigre-de-bengala cujos tratadores, empregados por um comandante paramilitar, disseram que o animal costumava comer carne das vítimas do esquadrão da morte.
Cuida ainda de um leão africano letárgico que se alimentava de narcóticos dados por seu proprietário, e das jaguatiricas, que pertenciam a um barão das drogas.
"Algumas das crueldades que vi me deixam envergonhada do ser humano", disse Torres, uma diretora de escola que abriu o santuário há 16 anos.
As criaturas do local, cerca de 800 ao todo, variam do pequeno quincaju, um mamífero noturno encontrado nas florestas tropicais da Colômbia, a babuínos nascidos do outro lado do Atlântico, na África. Muitos antigos animais de circo, incluindo um velho chimpanzé chamado Yoko, ainda encontram repouso na Villa Lorena, como se chama o santuário.
Outros animais, como um urubu-rei e um sagui pigmeu, foram resgatados em batidas contra traficantes de animais silvestres que buscam obter lucros na biodiversidade da Colômbia.
Mas alguns dos animais mais marcantes em Villa Lorena, situada em uma estrada de terra na favela de Floralia, são os grandes felinos que pertenceram aos zoológicos particulares de traficantes de drogas, que ainda parecem encontrar inspiração no exemplo do falecido "barão" da cocaína Pablo Escobar.
De fato, descendentes dos hipopótamos que foram propriedade de Escobar ainda vagam pelas terras da Hacienda Nápoles, que foi seu luxuoso refúgio. O santuário de Torres supera a criação de Escobar em diversidade. Cerca de 500 iguanas percorrem suas árvores e seus caminhos perto de currais de pecaris, flamingos, cabras montesas e pavões.
"Os animais daqui não são para exibição", ela disse, antes de se esgueirar pelas barras da jaula para abraçar e beijar os lábios de um leão ronronante chamado Júpiter, que foi recuperado de um circo onde sofria de desnutrição. "Eles precisam ser protegidos e têm o direito de viver em paz."
Em quase todas as esquinas de Villa Lorena os animais exibem as indignidades que sofreram nas mãos do homem. Um jacaré com um membro cortado se estende sob o sol tropical. Luís, uma onça que pertenceu a um traficante, manca em sua jaula porque teve uma pata dianteira cortada.
Para outros defensores dos direitos dos animais, o santuário de Torres levanta dúvidas. "Os animais não são como os seres humanos, que podem se adaptar a ficar em uma cadeira de rodas", disse Jorge Gardeazábal, veterinário cirurgião do zoológico de Cali. Gardeazábal disse que, em certos casos, prefere a eutanásia. Mas disse que apoia o santuário de Torres.
Em uma tarde recente, Dany, o tigre-de-bengala devorador de homens, rugia com um vigor surpreendente; as barras de aço o separavam do trabalhador que lhe atirava carne crua. "Dany é um dos poucos animais daqui que não posso abraçar", disse Torres. "Pelo menos ainda não."


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