São Paulo, segunda-feira, 05 de janeiro de 2009

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ARTE & ESTILO

Os museus devem vender seu acervo?

Por JORI FINKEL

O diretor do Museu da Academia Nacional em Nova York, rico em arte mas pobre em caixa, já esperava uma reação quando seu conselho diretor decidiu vender dois quadros da chamada Escola do Rio Hudson por cerca de US$ 15 milhões.
A diretora, Carmine Branagan, já havia consultado líderes de dois grupos a que a academia pertence sobre essa idéia. Ela sabia que a Associação Americana de Museus e a Associação de Diretores de Museus de Arte (AAM e AAMD, nas siglas em inglês) tinham políticas firmes contra a venda pelas instituições de obras de arte para sanar dificuldades financeiras e não abririam exceções.
Mesmo assim, ela disse que não estava preparada para a reação “imediata e punitiva” dos diretores. Em um e-mail de 5 de dezembro para seus 190 membros, a entidade denunciou a academia, fundada em 1825, por “infringir um dos princípios mais básicos e importantes da AAMD”, e pediu que seus membros “suspendessem qualquer empréstimo de obras de arte e qualquer colaboração em exposições com a Academia Nacional”.
Branagan, que na época já havia cancelado sua afiliação aos dois grupos, disse que ficou “chocada com o tom da carta, como se tivéssemos cometido um crime egrégio”. Ela disse que a suspensão de empréstimos é um “toque de dobrado” para o museu e acrescentou: “O que a AAMD fez foi basicamente nos dar um tiro de misericórdia”.
Além de moldar o destino de qualquer museu, esse comunicado provocou questões maiores sobre um princípio que há muito tempo parecia sagrado.
Muitos especialistas se perguntam por que é tão errado um museu vender obras de seu acervo para levantar fundos muito necessários.
Mas os defensores da proibição afirmam que essas vendas podem prejudicar uma instituição de maneira irreparável. “Vender um objeto é um reflexo automático e mina os princípios básicos de um museu”, disse Michael Conforti, presidente da associação de diretores e diretor do Instituto de Arte Clark em Williamstown, Massachusetts. “Sempre há outras opções.”
A venda de obras de arte do acervo de um museu não é ilegal nos EUA, desde que se respeitem os termos que acompanham a doação original da obra. Na Europa, por outro lado, muitos museus são financiados pelo Estado e impedidos por lei de vender suas obras.
Mas, sob o código de ética da Associação Americana de Museus, o procedimento “só deve ser usado para a aquisição, preservação, proteção ou cuidado do acervo”. O código da AAMD é ainda mais rígido, especificando que as verbas não devem ser usadas para “objetivos outros que não a aquisição de obras de arte para o acervo”.
Graham Beal, outro membro do grupo de diretores e diretor do Instituto de Artes de Detroit, disse: “Se de repente pudéssemos vender obras de arte e usar o dinheiro para qualquer coisa que não fossem aquisições, haveria uma canibalização geral de muitos museus”.
No ano passado, o presidente do Randolph College na Virgínia autorizou a remoção de quatro quadros, entre os quais “Estivadores” de George Bellow, de 1912, do museu do campus e seu envio para a casa de leilões Christie’s. A diretora do museu, Karol Lawson, que comparou a experiência a um assalto, logo se demitiu e hoje pesquisa para um livro sobre o tema.
Lawson sugere que a polêmica reflete duas visões antagônicas da arte: mercadoria contra ferramenta educacional. Na Randolph, disse, “as pessoas que queriam vender as peças diziam que são a mesma coisa que um caminhão, um computador ou uma cadeira”. Um belo caminhão —a pintura “Trovador”, de Rufino Tamayo, de 1945, que pertencia ao Randolph College, foi vendida na Christie’s em abril por US$ 7,2 milhões. O quadro de Bellow está em um armazém da mesma firma, aguardando a recuperação do mercado de arte.

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