São Paulo, segunda-feira, 05 de julho de 2010

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Filmes de ação seguem atraindo público


Críticos desdenham, mas espectadores querem adrenalina

A. O. SCOTT
ENSAIO

"Tubarão", de Steven Spielberg, completou, no último 18 de junho, 35 anos desde sua estreia. O filme quebrou recordes de bilheteria e inaugurou a era do moderno blockbuster de verão (nos EUA).
Se isso foi uma catástrofe ou uma dádiva, depende de a quem se faz a pergunta ou de seu estado de ânimo. Desde "Tubarão", porém, virou clichê dizer que o público do cinema quer ação, especialmente no verão.
Comédia de ação, aventura de ação, ação intensa, animação de ação, blockbuster de ação de deixar você sem fôlego, saltando da cadeira, ou seja como for que o descrevem aqueles críticos misteriosos citados nos anúncios. A palavra está em toda parte -é o que grita o diretor no início de cada cena-, mas seu significado nem sempre fica claro.
A essência do cinema -a coisa bacana dos filmes- é que a câmera não só é capaz de registrar acontecimentos em tempo real, mas também de "criar" coisas que são pura e simplesmente impossíveis. Um arsenal sempre crescente de técnicas visuais e temporais, que vão desde cortes simples até efeitos complexos, gerados por computador, permitem aos cineastas infringir as leis da física com impunidade.
Você quer ver um tanque despencando pelo céu e abatendo aviões? Um tubarão devorando um barco? Uma perseguição de carros em alta velocidade em uma via expressa na hora do rush, com balas voando em todas as direções e caminhões capotando e explodindo? Tom Cruise aterrissando em um milharal com Cameron Diaz a seu lado? Talvez você não queira, mas que pode, pode (em "Esquadrão Classe A", "Tubarão", praticamente qualquer filme de Brett Ratner e "Encontro Explosivo").
E, depois de ver tudo isso, o que você tem a dizer sobre tais espetáculos? A ação -como gênero e como fonte de sensações- tem reputação crítica mista, na melhor das hipóteses. Com frequência é minimizada, tachada de estúpida, vazia ou sem sentido, críticas que nem sempre estão equivocadas, mas que às vezes não vêm ao caso.
Os fãs da ação podem desejar a emoção do barulho, da velocidade e dos acontecimentos frenéticos, mas sua apreciação não necessariamente é indiscriminada. E, do ponto de vista de um diretor, a concepção e execução de uma boa sequência de ação é uma das partes mais trabalhosas e complicadas de seu ofício.
Coordenar veículos, corpos e armas em um episódio de caos controlado e coerente é um trabalho exigente.
Como fazer algo que nunca antes foi feito exatamente dessa maneira, e como fazer para que funcione e que o público fique instigado, surpreso e entretido? São questões até certo ponto técnicas, que têm a ver com a colocação das câmeras, o ritmo e o "timing" da edição. São também questões financeiras, já que nada pode bater ou explodir de graça.
E, mais que qualquer outra coisa, talvez, é a busca de mais, maiores e melhores efeitos de ação que tem movido a frenética e exaustiva história das inovações em Hollywood.
Os primeiros westerns, filmes sobre trens e comédias de pastelão do tempo do cinema mudo criaram os protótipos para o que viria a seguir, emocionando os espectadores com cavalos, trens e automóveis derrapando e colidindo diante de câmeras que, na maioria dos casos, ficavam paradas. Embora os sistemas de criação dos efeitos tenham crescido e se sofisticado, a emoção básica permaneceu: a injeção de adrenalina gerada por uma dose calculada de velocidade e perigo.
Os westerns dos anos 1940, com seus tropéis de cavalos e trabalho de dublês nas cenas equestres, definiram uma fórmula resistente. O mesmo aconteceu com os filmes de guerra que emergiram durante a Segunda Guerra Mundial, nos quais os diretores aprenderam a adaptar o cinema às novas formas de guerra mecanizada.
Um pouco mais tarde, nos anos 1950, o cinema reagiu à ameaça da TV, crescendo em escala, e a era do CinemaScope e do Technicolor inaugurou uma estética de grandiosidade que foi um augúrio mais fiel de nossos tempos do que foi "Tubarão".
A sequência de ação mais apurada dos anos 1950 com certeza é a corrida de bigas em "Ben-Hur", de William Wyler, filmado no estúdio Cinecittà com milhares de figurantes humanos e equestres, em um set que levou meses para ser construído. Em decorrência de todo esse tempo e trabalho, surge na tela uma sequência que parece ser ao mesmo tempo veloz e interminável e que constrói a tensão por meio de uma alternação cuidadosa de perspectivas.
Você olha do alto para as bigas avançando velozes pela pista, e então você está ali no meio -às vezes tão perto que consegue enxergar as narinas dos cavalos (e as de Charlton Heston) se dilatando, às vezes ao nível do chão, onde as rodas das bigas giram em meio ao pó.
Não se fazem mais filmes dessa forma. Não é necessário, agora que cavalos e multidões podem ser gerados por computador. Mesmo assim, fazer um bom filme de ação é mais difícil do que parece. Isso continua a ser verdade mesmo hoje, quando a tecnologia disponível o torna um pouco fácil demais.


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