São Paulo, segunda-feira, 05 de setembro de 2011

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Observando trens, aprendendo a se conectar


A previsibilidade dos trens conforta os autistas


Por CHRISTINE HAUGHNEY

Ravi Greene é capaz de dizer como se chega de transporte público a qualquer lugar em Nova York -à praia, por exemplo, pegue o trem 6, ele diz.
"O 6 segue o elevado da av. Whitlock até o Parque Pelham Bay", explica. "E no Parque Pelham Bay você pode fazer baldeação para o Bx29 ou o Bx12."
E ele tem só 5 anos.
Como muitas crianças com transtornos autistas, Ravi é fascinado por trens e ônibus, pois se encanta com seu movimento e previsibilidade.
Há anos essas crianças lotam as exposições do Museu do Trânsito de Nova York, conversando sobre horários, peças dos motores e velhos mapas do metrô.
"Esse é realmente o elemento deles", disse Juliana Boehm, que quase semanalmente visita o museu com seus filhos Ravi e Oliver, 8, também autista.
"Se eu sugerisse outra atividade, poderia causar ansiedade."
Agora, o museu está indo além de apenas atrair crianças autistas entusiasmadas por trens e ônibus, tentando também ensiná-las a se conectar com outras pessoas -e com o mundo.
Marcia Ely, diretora-assistente do museu, ajudou a criar esse programa até então inédito.
Escolas para crianças autistas a enchem de pedidos para visitas; ela costuma ser parada na rua por pais de crianças autistas que notam sua sombrinha do museu; e ela vê crianças voltando todo fim de semana.
O museu criou um programa extracurricular para crianças autistas de 9 e 10 anos, chamado "Subway Sleuths" ["detetives do metrô"], com foco na história do metrô de Nova York, mas que também tenta deixar as crianças mais confortáveis socialmente.
A ligação entre trens e autismo é bem documentada. Pessoas com autismo têm dificuldades para processar e dar sentido ao mundo, por isso são atraídas por padrões previsíveis.
No Reino Unido, terra da locomotiva azul Thomas, o movimento para adequar a programação dos museus de transportes às crianças com autismo é antigo.
O Museu dos Transportes de Londres recentemente promoveu um evento que levou alunos do ensino médio ao departamento de planejamento de horários.
Claro que nem toda criança fascinada pelo trem Thomas é autista. O que distingue a condição é a intensidade.
Shirley Cohen, professora aposentada do Hunter College que ajudou a criar um programa das escolas de Nova York para crianças com autismo.
Ela descreveu em detalhes o episódio de uma criança aluna sua que se negava a realizar qualquer atividade em sala de aula a não ser que pudesse ficar numa mesa do trem Thomas.
Outro menino, cujo quarto estava todo decorado com o trem, nunca queria sair de lá.
"O que acontece é que ele se torna o foco central da vida deles", disse Cohen.
A capacidade de crianças com distúrbios do autismo em se lembrarem de detalhes pode ser surpreendente.
Lauren Hough, consultora do "Subway Sleuths", disse que, quando perguntava como chegar a qualquer lugar da cidade, alguns dos participantes sabiam dizer não só qual trem tomar, mas também o número exato de degraus em cada estação.
Alguns pesquisadores têm tentado aproveitar esta preocupação para ajudar no desenvolvimento de crianças com autismo.
Simon Baron Cohendirige o centro de pesquisas do autismo na Universidade de Cambridge.
Ele descobriu recentemente que, quando crianças pequenas com autismo passavam 15 minutos por dia assistindo desenhos animados de veículos com rostos humanos, sua capacidade de reconhecer emoções melhorava.
Dentro de um mês já era possível notar diferenças significativas no reconhecimento de sentimentos e emoções alheias. Um dos maiores desafios do autismo é justamente se conectar ao mundo externo.
"As crianças com autismo tratam os trens em movimento, especialmente aqueles que têm movimentos limitados, como se só seguir os trilhos fosse uma recompensa natural", afirmou ele.
"Isso chama a atenção deles. Uma vez que você consegue a atenção da criança, você pode ensinar muitos tipos de coisas."
Boehm disse que, quando leva os filhos no metrô, e certos modelos de trens entram na estação, "eles aplaudem como se estivessem em um torneio de golfe".


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