São Paulo, segunda-feira, 06 de setembro de 2010

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Na morte de Mozart, um coro de causas

Por DANIEL J. WAKIN
Evidências médicas diretas? Nenhuma. Autópsia? Não foi feita. Registros médicos? Não há. O cadáver? Desapareceu.
Mas, segundo um artigo recente, pesquisadores apresentaram pelo menos 118 causas para a morte do compositor Wolfgang Amadeus Mozart.
William J. Dawson, cirurgião aposentado que é o biógrafo da Associação Médica de Artes Cênicas e Musicais, examinou a maioria das 136 entradas no banco de dados da associação dedicadas à morte de Mozart, uma lista que não é nada abrangente.
"Revendo as publicações sobre esse tema, vemos que muitas delas são confusas, complexas, conjeturais e polêmicas", escreveu Dawson na revista da associação, "Medical Problems of Performing Artists". Sua conclusão: a controvérsia vai continuar forte.
Um grande estudioso do assunto, o médico francês L. R. Karhausen, encontrou em 1998 o número de 118 para as causas da morte citadas por Dawson.
Sem evidências diretas, os pesquisadores tentaram se basear em relatos da família de Mozart e em uma descrição, feita décadas depois, por um médico vienense que falou com os médicos de Mozart em seus últimos dias.
Especulações sobre uma anormalidade na forma de um dos ouvidos de Mozart levou alguns a sugerir falência dos rins, já que as deformidades no aparelho urinário às vezes se relacionam a anomalias no ouvido.
Mesmo a evidência indireta repousa em definições médicas mutáveis, às vezes frases mal traduzidas dos depoimentos originais e avanços no conhecimento médico.
A descrição da doença final de Mozart é clara. Ele foi para a cama em 20 de novembro de 1791, depois de um intenso período em que produziu "A Flauta Mágica", "La Clemenza di Tito", o "Concerto para Clarinete", uma cantata maçônica e partes de seu "Réquiem". Suas mãos e seus pés inchavam. Ele tornou-se irrequieto, vomitava e tinha febre.
Na noite de 4 de dezembro, seu estado se agravou, e seu médico, Thomas Closset, foi chamado do teatro. Ele receitou compressas frias na cabeça. À 1 da manhã de 5 de dezembro, Mozart estava morto, aos 35 anos.
Closset diagnosticou febre miliar aguda, sendo "miliar" um termo usado para descrever pústulas do tamanho de milhete -na verdade, uma erupção cutânea. Essa foi a causa oficial da morte nos registros em Viena. O corpo de Mozart foi enterrado sem identificação, em uma vala comum, segundo a prática da época entre a classe média vienense, o que fez com que não existam despojos disponíveis para testes.
A teoria do envenenamento de Mozart -ou por seu colega Antonio Salieri ou por ele mesmo para se tratar de sífilis (uma doença há muito tempo desconsiderada)- foi refutada. A febre reumática é um dos principais candidatos depois de um estudo feito em 1966 pelo médico suíço Carl Bär.
Outras causas possíveis incluem um derrame e falência cardíaca congestiva. A maioria das citações encontradas por Dawson referem-se a uremia, uma concentração de toxinas no sangue causada por doença renal.
Outra teoria importante, proposta na década de 1980 pelo pesquisador Peter J. Davies, culpa a síndrome de Schönlein-Henoch, uma rara doença dos vasos sanguíneos. A síndrome causou a falência dos rins; uma hemorragia cerebral e pneumonia foram os golpes de misericórdia.
Por que esse assunto desperta tamanho interesse? Parte do motivo talvez esteja na íntima superposição entre música e medicina. Uma alta percentagem de médicos parece tocar instrumentos; Dawson é um baixista consumado.
A própria ideia de que indivíduos notáveis, que deram à vida tanta beleza, possam ser derrubados por problemas físicos comuns é inerentemente fascinante.
"Eles são imortais e mortais ao mesmo tempo", disse Jeffrey R. Saffle, cirurgião e diretor da unidade de queimaduras no Centro Médico da Universidade de Utah. O dr. Saffle é coautor de uma pesquisa literária sobre as histórias médicas de importantes compositores.
"Eles são figuras sobre-humanas do ponto de vista do que criaram", disse, "mas são muito comuns em termos de suas vidas, nascimentos e mortes."


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