São Paulo, segunda-feira, 08 de agosto de 2011

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DINHEIRO & NEGÓCIOS

Bilionários estão cada vez mais ativos no boom indiano

Magnatas constroem infraestrutura para evitar a burocracia

Por JIM YARDLEY
e VIKAS BAJAJ


MUNDRA, Índia - A Índia está cada vez mais se voltando para o setor privado a fim de gerar a eletricidade necessária para manter seu rápido crescimento econômico. O país tem crescido acima dos 8% ao ano, mas enfrenta fortes restrições na oferta energética, depois de o governo passar anos dominando esse setor sem conseguir dar conta da demanda.
O setor privado também tem ampliado sua participação em áreas outrora controladas pelo Estado, como telecomunicações, portos, aeroportos, bancos e infraestrutura.
É um enorme contraste em relação à China, onde grandes estatais dominam setores estratégicos e comandam a expansão do país em nível global.
No caso indiano, há também um paradoxo: os magnatas são essenciais para o sucesso do país, mas sua impressionante riqueza só é possível graças em parte à promiscuidade deles com políticos poderosos, que lhes ajudam a obter licenças ambientais e direitos fundiários, além de resolverem outras questões consideradas complicadas, o que leva a acusações de clientelismo.
Os bilionários da Índia controlam uma parcela muito maior da riqueza nacional do que os super-ricos em economias maiores, como na Alemanha, no Reino Unido e no Japão. E a Índia tem 55 bilionários cuja riqueza somada alcança US$ 250 bilhões ou quase um sexto do PIB local.
"Existe uma oligarquia em desenvolvimento que tem uma enorme influência", disse Arvind Subramanian, assessor econômico do governo. "Isso é motivo de grande preocupação. Mas, na Índia, esses são também os caras que estão fazendo as coisas."
Gautam Adani é a sexta pessoa mais rica da Índia, com uma fortuna avaliada em US$ 10 bilhões. Em 2009, seu plano de abrir uma usina elétrica e uma mina de carvão no Estado de Maharashtra enfrentou a oposição de ambientalistas, pois a mina ficaria numa floresta próxima a uma reserva de tigres em extinção. O ministério indiano de Meio Ambiente e Florestas bloqueou o projeto.
A disputa mostrou com que frequência prioridades nacionais importantes -meio ambiente versus expansão energética- se chocam. A Índia tem a quinta maior reserva de carvão do mundo, e sua matriz energética se baseia em usinas termoelétricas a carvão; mas grande parte do carvão indiano se concentra nas florestas em áreas habitadas por grupos tribais. Raros projetos não se encontram cercados por protestos, polêmica e violência.
Adani passou uma década transformando terrenos em Mundra, no seu Estado natal de Gujarat, em uma zona econômica especial e construiu o maior porto privado da Índia. O terminal se tornou o seu portal para a expansão global.
Ele adquiriu direitos de exploração mineral na Indonésia. Comprou dois navios cargueiros (e tem outros encomendados), além de uma mina e de um porto na Austrália. Logo, Adani virou um barão de carvão no exterior.
Mas transportar carvão na Índia era outro problema.
A estatal Indian Railways é uma enorme burocracia pública, com um dos fretes mais caros do mundo. Adani achou que seria mais barato, mais eficiente e às vezes mais rápido fazer o carvão viajar 6.440 km por mar do que 1.610 km de trem.
O Grupo Adani tem sete usinas elétricas em fase de construção ou que estão em projeto. Quando o porto precisou de uma ligação ferroviária de 64 km para se conectar à rede da Indian Railways, Adani simplesmente construiu o seu próprio ramal ferroviário privado, o primeiro do gênero na Índia. Ele agora está construindo uma segunda linha.
Analistas atribuem a Adani uma habilidade excepcional para executar projetos. Mas também é fato que poucos indianos ficam ricos sem que façam política.
Neste ano, Narendra Modi, ministro-chefe de Gujarat, convidou os mais poderosos magnatas da Índia para a Cúpula Global Gujarat Vibrante. Modi é deplorado por seus críticos como um extremista hindu de direita responsável por sangrentos distúrbios anti-islâmicos em 2002 no Estado.
Mas, para a Índia corporativa, ele é um herói conhecido por políticas benéficas às empresas, que ajudaram Gujarat a ter a economia mais aquecida entre todos os Estados indianos, com um crescimento médio de 11,2% ao ano.
Os bilionários irmãos Mukesh e Anil Ambani estavam lá, assim como Ratan Tata, presidente do Grupo Tata, e Adani, que anunciou um investimento adicional de US$ 17,8 bilhões em Gujarat. Ele também elogiou Modi.
Esse nexo entre magnatas e políticos poderosos está no cerne de um debate sobre se a ascensão dos bilionários na Índia é um sinal de dinamismo ou de clientelismo.
"Tanto na sua podridão quanto no seu dinamismo inebriante, a Índia começa a se assemelhar à Era Dourada dos EUA", argumentaram Jayanth Sinha, diretor de uma organização filantrópica e de investimentos, e Ashutosh Varshney, professor de ciência política da Universidade Brown, de Rhode Island, em artigo no "Financial Times". Eles se referiam ao período, no final do século 19, em que a economia americana era dominada por industriais ricos.
Adani, 49, defendeu o capitalismo à moda indiana, observando que a economia cresceu com rapidez bem maior na última década do que nas cinco décadas anteriores.
Esse empresário já se beneficiou de vários avais governamentais e também adquiriu terrenos litorâneos do governo a preços baixíssimos. Depois de concluir a infraestrutura, vendeu as terras com um belo lucro a empresas que se instalaram dentro do polo econômico.
"Quem o deixou tão rico?", questionou Babu Meghji Shah, um parlamentar estadual de oposição. "O governo de Gujarat o deixou rico."
Adani rejeitou qualquer insinuação de irregularidade, mas admitiu que "é preciso trabalhar com o governo, seja quem for o ministro-chefe, seja do partido que ele for".
O porto de Mundra está se tornando rapidamente uma potência econômica, dando empregos a milhares de pessoas.
Mas pescadores o culpam pela menor presença de camarões e plânctons e pela desaparição de enormes áreas de manguezais, uma ameaça para o estuário. Eles recorreram à Justiça, mas dizem não ser páreo para a influência política de Adani.
"Eles [do Grupo Adani] só falam", disse o pescador Hashim Haji, 55, que mantém uma família de 18 pessoas. "Prometeram escolas, hospitais, formação profissional. Mas não fizeram nada."
Adani garantiu que sua empresa está empenhada em satisfazer todos os pedidos dos pescadores, mas insistiu que a expansão vai continuar.
Na verdade, Adani está tentando replicar o modelo de Mundra, pois busca outros portos indianos que possam virar polos para a importação de carvão e a construção de usinas termoelétricas.
Dentro de Mundra, há conjuntos habitacionais para os funcionários. Escolas privadas foram abertas para as crianças, e uma rede particular de hospitais abriu uma unidade lá. Uma pista de pouso privada recebe jatos.
"Tudo foi feito por nós", afirmou Javed Sindi, gerente de relações públicas da empresa. "Se fosse para fazer do jeito do governo, levaria anos."


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