São Paulo, segunda-feira, 09 de março de 2009

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EUA abastecem cartéis do México com armas

Por JAMES C. McKINLEY Jr.

PHOENIX, Arizona - Os agentes mexicanos que, em maio passado, invadiram uma casa usada como esconderijo por traficantes de drogas, não estavam preparados para o poder de fogo com que foram enfrentados. O tiroteio terminou com oito policiais mortos. Entre as armas recuperadas pela polícia estava um fuzil cuja origem foi rastreada até o outro lado da fronteira americana, numa loja de armas em Phoenix chamada X-Caliber Guns.
O proprietário da loja, George Iknadosian, está sendo acusado de ter vendido centenas de armas a contrabandistas, cientes de que eles as enviariam a um cartel de drogas no Estado mexicano de Sinaloa. As armas ajudaram a alimentar a guerra de quadrilhas que matou mais de 6.000 mexicanos no ano passado.
As autoridades mexicanas se queixam há muito tempo de que vendedores de armas americanos estão armando os cartéis. O processo contra Iknadosian é o caso mais destacado envolvendo um vendedor americano de armas desde que, dois anos atrás, os EUA prometeram ao México que reprimiriam o contrabando de armas pela fronteira. O processo também oferece um vislumbre raro de como armas entregues a vendedores americanos estão sendo levadas ao México e empregadas em crimes.
"Havia uma via de fornecimento direto de Iknadosian ao cartel de Sinaloa", disse Thomas Mangan, porta-voz do Birô federal de Álcool, Tabaco, Armas de Fogo e Explosivos.
As quadrilhas de traficantes procuram armas nos EUA porque as leis de controle de armas são muito mais rígidas no México. Para poder comprar armas, civis mexicanos necessitam aprovação das Forças Armadas. Eles não são autorizados a portar fuzis de alto calibre ou pistolas potentes, vistos como armas militares.
As leis dos EUA autorizam a venda de vários fuzis de estilo militar a cidadãos americanos sem a necessidade de informar o governo das vendas, e o México revista relativamente poucos carros e caminhões que atravessam a fronteira.
Ademais, o grande número de vendedores licenciados de armas -há mais de 6.600 apenas ao longo da fronteira, muitos operando desde suas casas- dificulta o policiamento desses estabelecimentos. Há hoje cerca de 200 agentes trabalhando nessa tarefa.
Segundo a polícia mexicana, os contrabandistas recrutam americanos sem ficha na polícia para comprar dois ou três fuzis de cada vez e então transportá-los para o México em carros e caminhões.
"Podemos tomar medidas contra os grandes contrabandistas, mas o tráfico de armas se caracteriza por ser um desfile de formigas: não é um grande traficante em ação, mas muitos menores", disse o secretário de Justiça do Arizona, Terry Goddard.
O governo mexicano começou a reprimir os cartéis de drogas em 2006, desencadeando uma guerra que diariamente deixa dezenas de mortos nas ruas do México. O presidente Felipe Calderón descreve o fluxo de armas contrabandeadas como uma das maiores ameaças à segurança de seu país.
As autoridades mexicanas dizem que, em 2008, apreenderam 20 mil armas das quadrilhas do narcotráfico, a maioria comprada nos EUA. A agência de armas de fogo estima que 90% das armas recuperadas no México vêm de vendedores ao norte da fronteira.
A operação de Iknadosian era tão descarada que os contrabandistas lhe pagavam antecipadamente pelas armas, e os compradores por procuração apenas preenchiam a papelada necessária e levavam o armamento, segundo investigadores. A agência disse que Iknadosian vendeu várias armas a agentes disfarçados que lhe tinham dito explicitamente que pretendiam revendê-las no México.
Iknadosian, 47, está sendo julgado por fraude, conspiração e por ajudar uma organização criminosa, entre outras acusações. Seu advogado, Thomas Baker, se negou a comentar as acusações, mas disse que Iknadosian afirma sua inocência.
Nascido no Egito e tendo passado boa parte de sua vida na Califórnia, Iknadosian transferiu seu comércio para o Arizona em 2004 porque as leis relativas às armas são menos rígidas nesse Estado.
Ao longo de dois anos antes de sua prisão, em maio, ele vendeu mais de 700 armas do tipo procurado pelos traficantes de drogas no México, segundo a agência de armas de fogo. Baseados em registros de sua loja e declarações de réus, os investigadores estimam que pelo menos 600 dessas armas foram contrabandeadas para o México.
As autoridades mexicanas apreenderam sete rifles de modelo Kalashnikov de pistoleiros do cartel Beltrán Leyva, que enfrentaram a polícia em tiroteios. Consta que foi também da loja de Iknadosian que saiu a pistola Colt calibre 38 encontrada em posse do suposto chefe do tráfico Alfredo Beltrán Leyva quando ele foi preso, um ano atrás.
Em uma transação, Iknadosian deu conselhos sobre como contrabandear armas a uma pessoa que revelou ser um informante e que gravou a conversa. Ele disse ao informante que deveria dividir as armas em lotes pequenos e nunca levar mais de duas em um carro.
"Se a polícia parar você, duas armas não serão um problema", ele diz, segundo transcrição da gravação. "Quatro armas suscitam perguntas. Quinze farão a polícia perguntar 'o que você está fazendo?'."


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