São Paulo, segunda-feira, 09 de maio de 2011

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Sírios ressentidos com primo rico do ditador

Primo de Assad é exemplo de avareza e lealdade ao clã

Por ANTHONY SHADID

BEIRUTE, Líbano - Quando, em março, explodiram protestos públicos na cidade síria de Daraa, manifestantes queimaram retratos do presidente e, depois, atearam fogo a um alvo improvável: o escritório local da maior empresa de telefonia móvel do país, a Syriatel, cujo proprietário ocupa a encruzilhada do poder e do ressentimento em um país conturbado.
A Syriatel pertence a Rami Makhlouf, primo em primeiro grau e amigo de infância do presidente Bashar al Assad e um dos empresários mais poderosos do país. Nos últimos dez anos, Makhlouf emergiu como um trunfo e também uma desvantagem para um governo que vê seus redutos de apoio encolhendo. Além disso, ele é uma figura a ser observada, no momento em que os assessores mais próximos de Assad procuram combater os protestos que abalam as quatro décadas de sua família no poder.
Os defensores de Makhlouf o elogiam pelos investimentos que fez na Síria, mas são superados de longe por seus detratores, que, nos protestos, o vêm tachando de ladrão ou algo ainda pior.
"Vamos falar com clareza", gritou a multidão em Daraa. "Rami Makhlouf está roubando de nós."
O Egito teve Ahmed Ezz, o magnata siderúrgico que agora enfrenta a perspectiva de ir a julgamento. Na Tunísia, foi Leila Traboulsi, cabeleireira que tornou-se a esposa do presidente e símbolo das extravagâncias do partido governista. Makhlouf, 41, é a versão síria desse personagem: um homem que ocupa a intersecção entre privilégios de família, lealdade de clã e avareza crescente.
Makhlouf virou símbolo da forma pela qual as reformas econômicas converteram o socialismo clientelista em capitalismo clientelista, levando pobres a mais pobreza e ricos dotados de conexões à riqueza ainda maior. "Pelo lado econômico, ele simboliza o que as pessoas odeiam no regime", disse um analista sírio.
As origens da riqueza de Makhlouf refletem a consolidação do domínio da família Assad na Síria. O pai de Assad, Hafez -antigo comandante da Força Aérea que chegou ao poder em 1970 e, em pouco tempo, formou uma aliança entre oficiais como ele próprio, da minoria alauíta, e empresários sunitas na capital, Damasco -ofereceu privilégios à família de sua esposa, os Makhlouf. Rami Makhlouf herdou o manto familiar, enquanto seu irmão, Hafez, foi trabalhar no outro negócio familiar -a segurança nacional-, assumindo o cargo de chefe de inteligência de Damasco.
"Juntos, eles formam uma dupla e tanto", comentou um funcionário da administração Obama.
Embora já fosse muito conhecido antes da ascensão de Bashar al Assad em 2000, Mahklouf enriqueceu mais ainda quando ele e dois sócios egípcios conseguiram um dos dois contratos de telefonia celular na Síria (os sócios acabaram sendo obrigados a vender suas partes no negócio). De acordo com economistas sírios, a Syriatel detém cerca de 55% do mercado. Quando as reformas econômicas afastaram o país da economia estatal, Makhlouf penetrou nos setores mais lucrativos da economia -imobiliário, transportes, bancos, seguradoras, construção e turismo-, e seus interesses abrangem desde um hotel em Damasco até lojas "duty-free" em aeroportos e na fronteira.
Alguns sírios o elogiam. Um gerente da Syriatel declarou: "Ele passa seu tempo pensando em como erguer uma nova Síria. Para os jovens sírios, ele é o ideal de empresário bem sucedido." Mas muitos afirmam que seu sucesso se deu graças a contratos sem licitação e ao uso de influências por trás das quais estava o Estado.
"Todos sabem que não é possível fazer nada sem ele", disse Amr Al Azm, professor da Universidade Estadual Shawnee, no Ohio.
Mesmo alguns comentaristas que veem Assad com bons olhos especulam sobre a possibilidade de Makhlouf ser sacrificado em uma tentativa de preservar o governo. "Neste momento, eles fariam qualquer coisa para se conservarem no poder", disse o funcionário da administração Obama.


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