São Paulo, segunda-feira, 15 de junho de 2009

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Será que um animal é capaz de se arrepender?

JOHN TIERNEY
ENSAIO

Se você tem um cachorro, especialmente um que estragou seu tapete preferido, você sabe que um animal é capaz de pedir desculpas. Ele pode gemer, se encolher, abaixar o rabo e parecer arrependido, como se dissesse: "Não sei o que deu em mim". Mas ele realmente se arrepende?
Um animal pode sentir crises de remorso? Os cientistas antes consideravam essa ideia um tolo antropomorfismo, e eu costumava concordar.
Mas, diante de estudos com coiotes deprimidos, macacos tristes, chimpanzés que duvidam de suas opções, mais eu me pergunto se os animais sentem arrependimento.
Os últimos dados vêm de imagens do cérebro de macacos que tentam ganhar um suco de prêmio, adivinhando onde ele estava escondido. Quando os macacos erravam e alguém lhes mostrava o local certo, seus neurônios registravam pensamentos de "seria, poderia ser e deveria ser", segundo neurobiólogos da Universidade Duke na Carolina do Norte, que relataram o experimento na revista "Science".
Outro autor, Michael Platt, notou que os macacos reagiam a suas perdas modificando as escolhas posteriores, como pessoas que reagem a uma oportunidade perdida mudando de estratégia. "Posso imaginar que o arrependimento seria altamente vantajoso do ponto de vista evolutivo", disse Platt.
Em experiências anteriores, tanto chimpanzés quanto macacos que trocaram fichas por pepinos reagiram negativamente quando viram que outros animais estavam recebendo um produto mais saboroso -uvas- pelo mesmo preço. Eles fizeram sons de irritação e atiraram longe os pepinos ou suas fichas, relatou Sarah Brosnan, psicóloga da Universidade Estadual da Geórgia, EUA.
"Acho que os animais experimentam arrependimento, definido como o reconhecimento de uma oportunidade perdida", disse Brosnan. "Na natureza, essas capacidades podem ajudá-los a reconhecer quando devem procurar em áreas diferentes ou encontrar um parceiro cooperativo que divida os despojos de maneira mais equitativa."
Ninguém sabe, é claro, exatamente como essa sensação de arrependimento afeta emocionalmente um animal. Quando vemos um cachorro se encolhendo e de cabeça baixa, supomos que ele esteja sofrendo como nós depois de um passo em falso, mas talvez ele esteja apenas enviando um sinal útil: fiz uma besteira.
"E possível que esse tipo de sinal social em animais tenha evoluído sem a experiência consciente do arrependimento", disse Sam Gosling, psicólogo da Universidade do Texas, em Austin. "Mas parece mais plausível que haja algum tipo de experiência consciente mesmo que não seja a mesma coisa que você e eu podemos sentir."
Em "The Parrot's Lament" (O lamento do papagaio), Eugene Linden conta sobre uma chimpanzé fêmea de um zoológico americano que aproveitou uma reforma para roubar os utensílios do pintor e pintar seus bebês de branco. Quando confrontada pelo tratador furioso, a mãe correu e limpou seus filhotes.
Marc Bekoff, ecologista da Universidade do Colorado, se diz convencido de que os animais sentem dor emocional por seus erros e oportunidades perdidas. No livro "Wild Justice" (Justiça selvagem), ele relata milhares de horas de observação de coiotes na natureza. Quando um coiote era mordido com força durante uma brincadeira, o coiote ofensor logo baixava a cabeça reconhecendo o erro, disse Bekoff.
"O arrependimento é essencial, especialmente na natureza. Seres humanos costumam perdoar com facilidade seus animais de estimação, mas, na natureza, se um coiote ganha a reputação de trapaceiro, ele é repelido e acaba deixando o grupo." Quando o coiote é isolado, Bekoff descobriu, o risco de ele morrer jovem quadruplica.


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