São Paulo, segunda-feira, 16 de março de 2009

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TENDÊNCIAS MUNDIAIS

Dívidas podem dizimar a oligarquia da Rússia

Por ANDREW E. KRAMER

MOSCOU - Eles são figuras imponentes dentro e fora do país, homens que se viam como as dinastias Carnegie e Rockefeller da Rússia. São chamados de oligarcas e podem em breve ser jogados pela crise econômica na lata de lixo da história.
Ousados, jovens e ricos, íntimos dos negócios pós-soviéticos, eles escaparam da nacionalização -para não falar do exílio e da prisão- sob o governo de Vladimir Putin e fizeram fortunas ainda maiores com o boom das commodities nos últimos anos. Mas poucos empresários no mundo tiveram uma queda tão dura e rápida nos últimos meses quanto eles.
Muitos dos homens mais ricos da Rússia entraram altamente alavancados na crise econômica e não conseguiram renovar seus empréstimos junto a bancos ocidentais. O Kremlin os resgatou no ano passado com créditos de curto prazo, para evitar que o patrimônio caísse em mãos estrangeiras. Esses empréstimos públicos vencem no final do ano, juntando-se a empréstimos estrangeiros adicionais.
A montanha de dívidas é tamanha -o Banco Central calcula que corporações e bancos na Rússia têm de pagar US$ 128 bilhões só neste ano- que muitos oligarcas serão incapazes de arcar com elas, segundo banqueiros.
Só uma fração dessa dívida, ou cerca de US$ 7 bilhões, está em títulos corporativos. O resto são empréstimos bancários para empresas predominantemente de oligarcas ou do Estado.
"Os que restaram serão varridos na crise", disse a socióloga Olga Krichtanovskaia, da Academia de Ciências de Moscou, que estuda a elite local. "O Kremlin tem todas as alavancas. Se eles quiserem ajudar, vão ajudar. Se não, vão dizer: 'Estamos liberalizando agora; as relações de mercado vão determinar quais de vocês sobrevivem'."
Em janeiro, executivos do setor metalúrgico fizeram peregrinação ao Kremlin para pedir ajuda. Um deles era Oleg Deripaska, casado com uma neta de criação do presidente Boris Iéltsin (1931-2007).
Deripaska já não é considerado o homem mais rico da Rússia. A revista "Finans" noticiou em fevereiro que ele caiu para a oitava posição, devido à desvalorização em meio à atual crise de 90% do seu patrimônio, que ficou em US$ 4,9 bilhões.
Em reunião com o presidente Dmitri Medvedev, os executivos propuseram a fusão de seu patrimônio, que inclui algumas das maiores minas e indústrias da Rússia, sob um conglomerado estatal. Em troca, o governo refinanciaria bilhões em dívidas com bancos ocidentais.
Em outras palavras, eles propuseram voluntariamente reverter as polêmicas privatizações que deram origem aos oligarcas em meados da década de 1990.
"Todos eles têm corrido para ver quem pode ser o primeiro a fazer um acordo com o governo", disse Rob Edwards, analista da Renaissance Capital em Moscou. O acesso às reservas russas de divisas, disse ele, é uma espécie de alforria para os oligarcas.
Infelizmente para muitos desses oligarcas e para os bancos ocidentais que lhes emprestaram dinheiro, essa opção pode já não ser possível. Numa paradoxal guinada, o governo que havia apoiado a nacionalização do petróleo e de outros setores agora luta por recursos para preservar o rublo e amparar o Orçamento e parece receoso em investir em setores conturbados.
Os outrora invencíveis oligarcas atualmente parecem extremamente vulneráveis. Com ou sem ajuda estatal, o governo deve obter mais controle sobre suas operações. Se não receberem ajuda, muitos poderão falir, e provavelmente se seguirá a nacionalização de uma forma ou de outra. E qualquer novo resgate provavelmente significaria maiores participações acionárias do governo.
Os banqueiros dizem que a crise já afetou um estilo de vida que incluía iates, jatinhos e casas espaçosas no Reino Unido e na França. Com o colapso do mercado acionário russo, entre maio e outubro de 2008, a rede noticiosa Bloomberg calcula que as 25 pessoas no topo da lista dos russos mais ricos da revista "Forbes" tenham perdido coletivamente US$ 230 bilhões.
"A crise de hoje é inclemente para os produtores de matérias primas", disse Alicher Usmanov, magnata do ferro e do aço, um dos presentes na reunião do Kremlin. "Ela vai pegar de volta tudo o que acumulamos ontem."


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