|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
LENTE
Cresce o abismo tecnológico entre gerações
Em algum momento de suas vidas, quase todos os pais ou mães já deram o controle
remoto da TV, o controle do Wii ou o "smartphone" a seu filho e pediram: "Faça isto
funcionar". E, depois de a criança ter resolvido a dúvida, pegaram o aparelhinho de
volta e resmungaram: "Eu também poderia ter feito, se tivesse tempo".
Mas a realidade é que o tempo, em termos de tecnologia, já os deixou para trás.
"No século 20, as pessoas se preocupavam com o abismo digital que separava ricos de
pobres", disse ao "New York Times" o professor de pediatria Dimitri Christakis,
respeitado pesquisador sobre crianças e mídia. "Esse abismo se estreitou, e o abismo
que está emergindo agora é o que divide os pais de seus filhos. Não sabemos quase nada
sobre o mundo digital em que vivem nossas crianças."
Os pais podem se consolar, contudo, com fato de que seus filhos tecnologicamente
capacitados devem ser superados em breve por outro grupo, hoje ainda nas fraldas.
Essas crianças pequenas vão vivenciar o mundo de maneira radicalmente distinta.
Entre as ferramentas que esses bebês vão enxergar como sendo objetos do cotidiano -
como os televisores a cores e os telefones em que se digitam os números foram vistos
por seus pais- estão tecnologias como o Kindle e aparelhos como o telefone Nexus
One, do Google, e o iPad, da Apple. As crianças que têm dois anos em 2010 "não
conhecem outra coisa senão um mundo povoado por livros digitais, videochats pelo
Skype com parentes que estão distantes e videogames jogados com o iPhone", escreveu
Brad Stone no "Times".
Acontece que essas são ferramentas com as quais crianças dez anos mais velhas não
cresceram, ele observou, e os membros da geração de sua filha de dois anos "serão
totalmente diferentes das crianças da geração anterior".
Segundo Stone, pesquisadores teorizam que o ritmo cada vez mais acelerado das
inovações pode estar produzindo "uma série de miniabismos geracionais, com cada
grupo de crianças sendo influenciada de maneira singular pelas ferramentas técnicas
disponíveis nas fases formadoras de seu desenvolvimento". Nesse ponto, o abismo de
gerações talvez não seja mais medido em décadas ou anos, mas em meses.
"Pessoas com dois, três ou quatro anos de diferença de idade estão tendo experiências
completamente distintas com a tecnologia", disse ao "Times" Lee Rainie, diretora do
Projeto Internet e a Vida Americana, do Centro Pew de Pesquisas. "Universitários ficam
perplexos com o que fazem seus irmãos em idade escolar. Isso acelera as diferenças
entre gerações."
Tudo isso suscita saudades da época em que os abismos generacionais, como aquele que
separa os baby boomers -nascidos entre o pós-Segunda Guerra Mundial e 1964- e os
integrantes da Geração X -nascidos entre 1965 e 1979-, eram medidos em décadas, e
não em anos ou meses.
A.O. Scott escreveu recentemente no "Times" sobre o lamento da Geração X e do grupo
muito maior dos baby boomers.
"Crescemos à sombra dos baby boomers, que, em sua velhice, ainda conseguem
comandar atenção desproporcional", reclamou Scott, que nasceu em 1966. "Cada vez
que eles atingem um marco em seu ciclo de vida, isso é tema de dez capas de revistas.
Quando eles se aposentarem, a Previdência Social vai afundar!"
É claro que esses comentários traem o fato de Scott ter passado sua infância na era
analógica. Talvez não seja possível contabilizar em quantas telas será exibido o abismo
de gerações das pessoas nascidas desde a chegada do novo milênio.
TOM BRADY
Envie comentários para nytweekly@nytimes.com
Texto Anterior: No meio do cérebro, o enigma da criatividade Próximo Texto: Tendências mundiais Grécia vive uma revolução sem "mocinhos" Índice
|